Acostumada a passar carraspanas em assessores e ministros, a presidente Dilma Rousseff enfrentou a semana mais tensa de seu governo ouvindo verdades. Confrontada com a crise, partiu para a articulação política como nunca em quatro anos e meio no poder.

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– Não adianta a gente ficar discursando, política é gesto. A gente tem de fazer gesto!

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O alerta foi do líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral (PT-MS), em um dos vários encontros no Palácio do Planalto sobre como tirar o governo do atoleiro. Mais serena do que de costume, Dilma tem prestado atenção ao que dizem seus interlocutores. Não à toa, saiu da inércia.

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Em sete dias, foram 10 reuniões políticas, viagem para o interior de São Paulo, entrevista a rádio, entrega de prêmio, jantar com governadores e análise do perfil de senadores em busca de apoios. Assessores reconhecem o clima de tensão, mas repetem um mantra: “Ela não se entrega”. Aliás, a própria Dilma tem dito isso.

– Não vou renunciar, não vou me suicidar e não tenho Fiat Elba – afiançou a um governador em jantar no Alvorada.

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Ela se referia ao golpe fatal do impeachment de Fernando Collor: um carro comprado com dinheiro de contas fantasma do tesoureiro de campanha. A sentença tranquilizou o governador aflito com o clima que encontrou em Brasília.

Enquanto um impopular plano de cortes no orçamento de 2016 era lançado, aliados conspiravam no Congresso de braços com a oposição. O passo a passo para a abertura do processo foi desenhado. Neste cenário, Dilma reformulou a articulação política.

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Com o vice Michel Temer na Rússia, ela chamou o ministro Ricardo Berzoini, das Comunicações, para assumir as negociações. Mas colocou ao lado dele o gaúcho Giles Azevedo, um fiel escudeiro. Na quinta-feira, determinou que Aloizio Mercadante, chefe da Casa Civil, telefonasse a Temer para avisar que Giles será o novo secretário-executivo da Secretaria de Relações Institucionais.

– Giles é como se fosse o olho da Dilma, acompanhando cada conversa – resume um aliado.

A presidente também tenta resgatar a confiança de sua equipe. Almoçou com ministros petistas no Alvorada na quinta-feira. No cardápio, bacalhau, carne bovina, farofa com ovo, vinho gaúcho e uma longa explanação sobre o orçamento e a volta da CPMF.

Dilma ouvia as explicações de Nelson Barbosa, titular do Planejamento, enquanto beliscava um pedaço de peixe, acompanhado por um copo de água. No final da reunião, deixou a conversa descambar para o futebol. Animada, citou até uma frase do antigo técnico Neném Prancha:

– Quem pede tem preferência, quem se desloca recebe.

Todos riram. Mas os petistas saíram preocupados. O consenso é de que Dilma se deslocou tarde demais e que, se os atuais lances políticos fracassarem, poderá não haver volta. No mesmo dia, o expresidente Lula foi ao Alvorada para uma conversa com a afilhada.

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Descontente com o desempenho de Mercadante, José Eduardo Cardozo (Justiça) e Miguel Rossetto (Secretaria-Geral), Lula aconselhou a presidente a promover mudanças na Esplanada.

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Mercadante é chamado com frequência ao gabinete. Ele e Giles fazem as ligações mais importantes, mandam recados e integram o grupo de confiança presidencial. Cardozo também está na lista.

– Ela está mais à vontade do que no primeiro mandato. Mas ainda é Dilma, confia em poucos – comenta um ministro.

Quem trabalha com a petista também atribui o bom humor ao novo estilo de vida da chefe. A pedalada matinal se tornou rotineira e, na quarta-feira, Dilma chamou atenção ao parar o exercício para acompanhar o socorro a um ciclista que perdeu o equilíbrio e caiu ao desviar de um cachorro. Na sexta, durante mais um passeio, um triatleta agradeceu o apoio que a petista deu ao acidentado.

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Quinze quilos mais magra, disciplinada na prática do esporte e na alimentação, Dilma não perde a chance de comentar o quanto se sente bem com o novo visual. Momentos antes da cerimônia de recondução de Rodrigo Janot ao comando da Procuradoria-Geral da República, comentou sobre as vantagens da dieta Ravenna. Logo depois, discursou mais uma vez contra os defensores do “golpe”.

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Apesar da agenda intensa, a presidente não deixou de assistir aos seriados de que gosta. Quando fala da família, cita as peripécias do neto Gabriel – um momento de leveza que dura pouco.

Neste final de semana, ela permanece em Brasília para fechar a reforma administrativa. De assessores a ministros, todos cancelaram agendas, atentos à possibilidade de um chamado. O clima de especulações de sexta-feira, envolvendo boatos de troca de ministros a eventual novo rebaixamento do Brasil por agência de classificação de risco, ajudou a deixar o ar mais pesado na capital federal.

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Não há espaço para erro. Na nova linha da sinceridade com humor, um líder petista sentencia:

– Este é o governo Elvis Presley: it?s now or never!