A enfermeira intensivista Kátia Santina Silveira Caetano, 43 anos, trabalha na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e na Unidade de Transplante de Medula Óssea (TMO) do Hospital Governador Celso Ramos, em Florianópolis. São 22 anos de profissão, 20 deles em UTIs. Desde o começo da carreira, recorda Kátia, ela sabia que estava diante de numa profissão que exige sacrifícios e convívio com perdas. Porém, coube a Covid-19 desvendar o cenário de uma forma muito severa. 

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– Por mais que a gente conte, faça vídeo e fotos, não tem como explicar o que estamos enfrentando – diz ela.

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Manezinha do Sul da Ilha, Kátia mora no bairro Morro das Pedras com o marido e os filhos, um de sete e outro de 13 anos. Como trabalha em UTI Covid-19, teve que redobrar os cuidados com a saúde. No começo da pandemia, em 2020, precisou se isolar. A mãe se encontrava em pós-operatório e a vontade se receber os cuidados da filha não pode se concretizar.

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O jeito foi a mãe ficar com o genro e netos, enquanto Kátia estava na casa dela. A estratégia deu certo, mas o distanciamento encheu o coração dos meninos de saudade. O filho caçula gravou um vídeo fala da dimensão do tempo: 

– O coronavírus tirou minha mãe um ano de mim.

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Na verdade, o menino referia-se ao período de apenas um mês. Hoje a logística é outra, explica Kátia, que segue o ritual de só se aproximar do marido e filhos depois de tirar a roupa usada na rua, do descarte na máquina de lavar e da troca das vestes. 

– Primeiro tira o Covid, né mamãe? – costuma dizer o caçula.  

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Os meninos já aprenderam uma rotina básica: 

– Eles só encostam em mim depois de todo o ritual do banho e troca de roupas – comenta ela.

Em vídeo, Kátia conta como faz para conciliar o trabalho na UTI e a família

Conselheira no Conselho Estadual de Enfermagem (Coren-SC), Kátia se preocupa com as condições de trabalho da categoria. Até o fechamento desta edição, pelo menos 14 profissionais haviam morrido vítimas de Covid-19 em SC. No dia 26 de fevereiro, morreu a técnica de enfermagem Zeni Bueno Pereira, 53 anos, de Itapema, e que aguardava por um leito de UTI. Ela trabalhava na linha de frente de combate ao coronavírus. 

– É muito triste ver um colega numa condição assim. A gente já passou por esta experiência dolorosa – conta Kátia.

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Kátia na UTI (Foto: Arquivo Pessoal)

Ofício passado de mãe para filha

A mãe de Kátia, agora aposentada, trabalhou anos na enfermagem do Hospital Infantil Joana de Gusmão. Kátia conta que aprendeu com a mãe uma regra: 

– Nada do que acontece no hospital trago para dentro de casa. Quando muito um comentário educativo para os filhos, como quando sei que um jovem está na UTI devido a um acidente decorrente do uso do álcool e direção – comenta a profissional da saúde. 

Trabalhar em dois lugares com alta demanda e ter dois filhos pequenos não chega a ser um problema para Kátia. Ela conta que o marido, aposentado devido a uma doença nas articulações, sempre lhe deu suporte para trabalhar: 

– Sou a mulher que sustenta a casa, e ele cuida do lar. Isso está posto para nossas vidas e as crianças aprenderam assim. Sabe aquele pai que sabe que o pé do menino cresceu e precisa de um tênis novo? Em nossa casa é assim – brinca ela. 

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Mesmo assim, Kátia pensa na responsabilidade de criar dois meninos. Certa vez, o mais velho brigou com uma colega. Segundo ele, a menina o teria provocado. Ao saber da confusão, Kátia teve uma conversa e usou as características físicas dela própria – pouco altura, magra, com pouca força física – para mostrar as diferenças entre um homem e uma mulher. No dia seguinte, o filho pediu desculpas para a colega. 

– Sei que muitos homens buscam se impor pela força, pelo machismo. Sou daquelas mulheres que acredito ser preciso manter o respeito entre as pessoas – pondera.

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Se fez a escolha profissional certa? 

– Digo com muita tranquilidade: foi a profissão quem me escolheu.

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