Santa Catarina é um dos cinco estados brasileiros que mantêm índices considerados inaceitáveis de desmatamento, de acordo com a Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A última edição do Atlas da Mata Atlântica, levantamento que monitora o bioma desde 1985, mostra que 905 hectares de mata localizados em território catarinense desapareceram entre o biênio 2017/2018.
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Os dados, divulgados no dia 23 deste mês, indicam um aumento de 52% no desflorestamento, comparado ao biênio anterior — 2016/2017, quando ocorreu redução de 595 hectares.
A perda de cobertura florestal deixa o Estado em alerta, conforme a diretora-executiva da Fundação S.O.S Mata Atlântica, Márcia Hirota.
— Pode-se parecer pouco comparado com Minas Gerais, que perdeu três mil hectares no mesmo período, mas o aumento significativo em relação ao ano anterior é o que nos chamou a atenção. Serve de alerta para as autoridades e sociedade civil catarinense para que a gente preserve a Mata Atlântica e garanta para as futuras gerações — afirma.
O cenário de SC é ainda mais preocupante quando se compara os números do desflorestamento no país. Dos 17 estados em que o bioma está presente, nove estão no nível do desmatamento zero, com perdas abaixo de 100 hectares, ou 1 Km².
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São eles: Ceará (7 ha), Alagoas (8 ha), Rio Grande do Norte (13 ha), Rio de Janeiro (18 ha), Espírito Santo (19 ha), Paraíba (33 ha), Pernambuco (90 ha), São Paulo (96 ha) e Sergipe (98 ha). Outros três estados estão a caminho desse índice: Mato Grosso do Sul (140 ha), Rio Grande do Sul (171 ha) e Goiás (289 ha).
Impactos do desmatamento
A redução da Mata Atlântica no Estado impacta diretamente na vida dos catarinenses, de acordo com o professor e doutor em Biologia Vegetal e curador do Herbário Roberto Miguel Klein da Universidade Regional de Blumenau (FURB), André Luís de Gasper. Ele explica que o efeito da remoção da cobertura florestal é sentido também no ciclo na água.
— Tem regiões do Estado, no Oeste por exemplo, que sofre com período de estiagem. É uma das áreas mais desmatadas, então já se percebe o efeito da remoção da floresta — explica.
O Inventário Florístico Florestal de Santa Catarina (IFFSC) identificou espécies ameaçadas de extinção após serem muito exploradas no passado, como é o caso da Canela-Preta, que já foi abundante no Vale do Itajaí. O especialista conta que, mesmo sendo protegidas por lei, essa árvore não consegue recuperar sua população antiga.
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— A gente nunca mais vai encontrar a mesma quantidade de espécies que havia antigamente. Porque a gente não deixa a floresta se recuperar nesse sentido — diz.
A redução da floresta também cria mosaicos na vegetação, deixando as áreas de mata fragmentadas. Gasper explica se eles não estão conectados entre si, ou seja, se não há uma continuidade na vegetação, a população de animais também é impactada.
— Tem espécies de aves que não atravessam áreas abertas, por exemplo, não migram se tem abertura, então vão se isolando as populações e assim elas vão sendo extintas. E se não há espécie de aves ou insetos que atravessam áreas fragmentadas, também não há a polinização — conta.
As espécies acabam se reproduzindo somente com outras que estão próximas. O efeito é de longo prazo, mas em algum momento só restarão as espécies mais generalistas, que conseguiram se adaptar, segundo explica o professor.
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Já em relação à fauna, a onça-pintada é um exemplo de como o desmatamento afeta a vida dos animais. O doutor em Biociências e professor do departamento de Departamento de Ecologia e Zoologia da UFSC Maurício Eduardo Graipel conta que não há registro da espécie em SC desde o início da década de 1970.
Para migrar do Rio Grande do Sul ao Paraná, esses animais precisam passar pela Argentina porque Santa Catarina não tem mais floresta suficiente para que ela possa fazer esse trajeto.
— A gente tem registro dela na reserva do Turvo (RS), na região de Missiones e no Parque Nacional de Foz do Iguaçu. Elas fazem um contorno, porque a vegetação do Extremo-Oeste de Santa Catarina foi praticamente toda suprimida — explica.
Soluções para o futuro
Apesar dos resultados negativos de Santa Catarina, é possível observar, segundo a diretora-executiva da Fundação S.O.S Mata Atlântica, Márcia Hirota, que a lei está sendo implementada porque mais estados brasileiros têm conseguido alcançar o nível do desmatamento zero.
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O Nordeste do Brasil mostra é exemplo. Ceará, Alagoas e Rio Grande do Norte foram os três estados que apresentaram o menor índice de área desmatada, com sete, oito e 13 hectares respectivamente.
Em termos de compromisso com as ações de controle que resultam na redução das áreas desmatadas, Bahia é considerado um exemplo para a S.O.S Mata Atlântica. Apesar de ainda ser um dos estados que mais desmatam, os números apontam queda gradativa, demonstrando avanço nas ações de combate à exploração.
Fiscalização em Santa Catarina
No Estado, a fiscalização é realizada por fiscais do Instituto do Meio Ambiente (IMA) e da Polícia Militar Ambiental. Inicialmente, é feita uma amostragem para verificar se a retirada da vegetação ocorre na área permitida e se as condições ambientais estão sendo cumpridas. Se alguma situação irregular for identificada, o responsável pela área é autuado e sujeito a punições previstas na Lei da Mata Atlântica, em vigor desde 2006.
O IMA não soube informar quantos fiscais existem atualmente em Santa Catarina. Entretanto, o órgão afirma que a quantidade não é suficiente para cumprir toda a demanda do Estado. O órgão também não informou a listagem divulgada das empresas autuadas por desmatamento hoje no Estado.
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Em setembro de 2018, uma operação realizada no Planalto Norte do Estado identificou 384 hectares do bioma degradados somente na região. A ação, intitulada “Mata Atlântica em Pé”, foi realizada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) e pela Polícia Militar Ambiental. Um total de 63 áreas do bioma distribuídas em 24 propriedades foram fiscalizadas.
Além de fiscais do MP-SC e da Polícia Militar Ambiental, a ação contou com sobrevoo de drones que registraram a situação da área. Na ocasião, a Promotora de Justiça do Meio Ambiente de Canoinhas, Ana Paula Destri Pavan afirmou que ação foi pioneira no uso da tecnologia.
— Assegurou uma atuação eficiente e precisa, com otimização dos recursos humanos, e que a partir de agora poderá ser utilizada nas demais fiscalizações para defesa do meio ambiente — disse.
A operação de combate ao desmatamento resultou na aplicação de multas que somaram R$ 1,9 milhão.