Vanda foi espancada pelo namorado porque não tolerou os xingamentos dele, após vários episódios de violência verbal, em Blumenau. Neuza morreu seminua ao ter a garganta cortada no sofá de casa na mesma cidade. O relacionamento havia começado há pouco mais de uma semana. Casos de agressão que muitas vezes se tornam fatais acontecem diariamente no Vale do Itajaí. Segundo números da Secretaria de Segurança Pública de Santa Catarina (SSP-SC), em média, 17 mulheres foram agredidas por dia neste ano até setembro. Delas quase 10 estão dentro do contexto de violência doméstica.

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No Estado, o número é ainda maior: 35 catarinenses sofreram agressão física diariamente dentro de casa. No ano passado 52 feminicídios foram registrados em SC e até setembro deste ano o índice chega a 30. Em Blumenau, este número já ultrapassa o de 2016. Até o mês passado, quatro casos foram registrados. O mais recente foi o de uma mãe de 44 anos, incendiada com o filho em casa no bairro Itoupava Central. Ela morreu dia 23 de outubro, 24 horas após ser internada no hospital com cerca de 80% do corpo queimado. A morte ainda não aparece nas estatísticas da SSP, atualizada até setembro. Com o total de casos, a Polícia Militar implantou em Blumenau um programa de combate e prevenção à violência doméstica e, além disso, um seminário discutirá o tema nesta sexta, no auditório da Furb.

O primeiro crime com características de feminicídio registrado na cidade este ano aconteceu em janeiro. A servidora pública Neuza Grassmann, 47 anos, foi encontrada morta dentro de casa. Segundo a investigação, o suspeito de ter cometido o crime foi identificado como Adilson Tognolli, 40 anos, companheiro dela na época. Ele foi preso em setembro por outro crime.

– Eles estavam uma semana e meia juntos, mas a gente não sabia. Depois que ela se separou do meu pai, conheceu outro cara, ficou uns cinco anos com ele, e quando estava sozinha conheceu outro cara. Ele estava querendo agredi-la, então, ela o deixou. Depois conheceu esse último e aconteceu o pior – lamenta Gleissi Alex Fernandes, filha mais velha de Neuza.

Vanda Denize Luiz, 38 anos, foi agredida pelo ex-namorado em novembro de 2016. Ele espancou o rosto, o peito e as costas da vítima antes de a segurar pelas pernas e bater a cabeça dela no chão. O agressor chegou a ser preso, mas conseguiu o direto de responder em liberdade. O julgamento foi marcado para o dia 24 de abril de 2019, dois anos e cinco meses após a agressão.

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– Quando a mulher toma coragem, enfrenta os riscos e denuncia é isso que acontece? Só quero justiça e vou até o fim. Quero ser a voz dessas mulheres, mas não quero que elas esperem tanto quanto eu – relata Vanda ao ressaltar que já tem medida protetiva contra o ex-namorado em mãos.

Fiscalização e prevenção

Para tentar reduzir ocorrências de violência doméstica e evitar novas mortes, o programa institucional da Polícia Militar de Santa Catarina, o Rede Catarina – implantado nesta semana em Blumenau – pretende combater, fiscalizar e, principalmente, prevenir este tipo de violência. A coordenadora do programa no município, tenente da PM Karla Medeiros, explica que ele já existe em Florianópolis, Balneário Camboriú, Criciúma, Chapecó, entre outras cidades do Estado com mais de 100 mil habitantes.

Em todo o ano de 2016, o 10º Batalhão da PM registrou em Blumenau 150 casos e até outubro deste ano já foram 270, um crescimento de 80%.

– O número não diz muita coisa porque as mulheres estão denunciando mais, estão tendo mais coragem de ligar e denunciar a situação que elas vivem, mas não quer dizer que já não sofriam esse tipo de violência, a chamada cifra negra – afirma a tenente.

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A presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher de Santa Catarina, Sheila Sabag, ressalta o fator primordial que ainda tem tirado a voz de mulheres.

Medo. Medo do agressor, medo da família, medo de não ter para onde ir, medo de perder a guarda dos filhos. Desmotivador maior é a mulher ir denunciar sem perspectiva de que terá sucesso. Enquanto não tivermos uma política pública estadual de real enfrentamento à violência contra as mulheres, não avançaremos – lamenta.

A tenente Karla explica que o principal intuito é levar informação para mulheres vítimas de violência. Durante as visitas preventivas, o intuito é fazer um acompanhamento qualificado assessorando e orientando mulheres, tirando dúvidas e esclarecendo sobre as medidas de proteção.

– Muitas mulheres não sabem a quem recorrer. Vamos oferecer as orientações relacionadas aos diretos. Depois, vamos fiscalizar as medidas protetivas de urgência, conferidas pelo Judiciário. Quando estiverem sendo descumpridas, vamos fazer a comunicação imediata ao Judiciário – reforça.

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Seminário debate avanços

Para discutir os avanços e retrocessos nas políticas para as mulheres, a legislação e o enfrentamento à violência, Blumenau sedia nesta sexta-feira o Seminário Regional Pelo Fim da Violência Doméstica Contra a Mulher. Mesa redonda com coletivos de mulheres e feministas, palestras e grupos de trabalho vão discutir os avanços e retrocessos nas políticas para as mulheres, a legislação e o enfrentamento à violência. A discussão conta com nomes como o da ex-ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres do governo Dilma Rousseff, professora doutora Eleonora Menicucci.

A presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher de Santa Catarina, Sheila Sabag, insiste na necessidade de políticas públicas para reduzir a violência doméstica e reforça que mesmo em uma fase de empoderamento e luta feminina, ainda há muito a ser conquistado.

Serviço

O quê? O seminário é voltado para coletivos femininos, agentes públicos, universidades, sindicatos, mulheres e homens do campo. Vai discutir, durante todo o dia, os avanços e retrocessos nas políticas para as mulheres. O evento é organizado pela Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira e pela Bancada Feminina da Assembleia Legislativa de Santa Catarina.

Quando? Sexta-feira (16), das 8h às 18h

Onde? Bloco J da Furb, que fica na Rua Antônio da Veiga, Victor Konder.

Quanto? Gratuito

Rede Catarina de Proteção à Mulher, da Polícia Militar

O quê? O programa da Polícia Militar está estruturado em três eixos: ações de proteção, policiamento direcionado ao problema e solução tecnológica. A Patrulha Maria da Penha é composta por, no mínimo, dois policiais militares, sendo que um deles é mulher.

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Como pedir ajuda? Dúvidas, denúncias ou esclarecimentos podem ser enviados para o e-mail 10bpmredecatarina@pm.sc.gov.br.