O desemprego atingiu duas vezes mais a população negra do que as pessoas brancas em Santa Catarina em 2021, segundo o estudo de Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado na sexta-feira (11). Apesar do Estado ter o menor índice de desempregados do país, com 5,1%, a análise por cor da pele demonstra a desigualdade racial entre os trabalhadores que buscavam uma oportunidade de emprego no território catarinense.

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A pesquisa registrou que 9,2% das pessoas pretas estiveram desempregadas no ano passado. Entre a população parda, a porcentagem foi de 7,3%. Já para as pessoas brancas foi de 4,5%.

O IBGE caracteriza que o desemprego se refere às pessoas com idade para trabalhar, maiores de 14 anos, que estão fora do mercado de trabalho, mas que têm disponibilidade para atuar e tentam encontrar um serviço. As estatísticas demonstram que a maior parte dos desempregados no Estado, em 2021, era pessoas não-brancas. Porém, negros e pardos somam apenas 18% da população catarinense.

— Tem muito a ver com o processo de discriminação, de exclusão social da nossa herança escravagista — explica Marilane Teixeira, doutora em Desenvolvimento Econômico pelo Instituto de Economia da Unicamp.

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A economista explica que o desemprego pode ser o resultado do cenário de baixo nível de atividade econômica ou de crise. Nesses contextos, as primeiras pessoas que perdem o emprego são as que estão em condições mais vulneráveis, em setores de menor produtividade. E geralmente são trabalhadores negros.

— Isso não tem a ver só com a escolaridade. Nós melhoramos muito os níveis de escolaridade em geral e principalmente da população negra nas últimas décadas. Ela ainda não está equivalente a das pessoas brancas, mas a população negra passou a ter mais acesso à universidade e ao ensino superior completo. Muitas vezes, mesmo tendo escolaridade mais elevada, a população negra está empregada majoritariamente na informalidade e nos setores mais precários. Então, se vê claramente uma segregação e uma discriminação que se potencializam para assegurar que as pessoas negras estejam nos piores postos — argumenta a especialista.

Desigualdade da subutilização da força de trabalho

Além dos desempregados, as pessoas que gostariam de trabalhar, mas que por alguma razão não procuraram serviço, chamadas de desalentadas pelo IBGE, fazem parte do grupo de subutilização da força de trabalho. Ele também inclui os trabalhadores que atuam menos horas do que gostariam, intitulados subocupados, e os demais que estão fora da força de trabalho.

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Em Santa Catarina, a subutilização atingiu 16,1% das pessoas pretas e 14,3% das pardas. Os números são superiores em relação à população branca, que foi de 9,4%.

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Para a economista, a precarização das vagas ocupadas pelas pessoas negras é um dos motivos para a diferença do índice considerando a cor da pele. Nos trabalhos informais, por conta própria, às vezes o trabalhador gostaria de exercer a função por mais horas e dias da semana do que é possível.

Além disso, a ausência de políticas públicas para garantir um ambiente estável aos trabalhadores e suas famílias dificulta o ingresso de muitas pessoas no mercado de trabalho. Teixeira afirma que a condição está mais presente entre as mulheres, que acabam sendo obrigadas a se responsabilizar por uma criança, uma pessoa doente ou idosa, por falta de creche ou cuidados do Estado.

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— Isso está ligado ao fato da população negra ser a população pobre, que é a que mais precisa de políticas públicas e é a que tem menos acesso às políticas públicas.

Formalização do trabalho garante o futuro do trabalhador

Dentro do mercado, ter a carteira de trabalho assinada pelo empregador garante os direitos trabalhistas ao empregado. Essa formalização dos empregos colabora para a estabilidade do trabalhador e a capacidade dele para pensar no futuro, como compra da casa própria e até viagens, e não apenas nas necessidades e contas do dia a dia.

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— Quando você vive com salários muito baixos, que é a característica do setor informal, o risco de perder o trabalho a qualquer momento impede, por exemplo, de tomar iniciativas a pensar o futuro. Claro que a informalidade é um elemento de instabilidade permanente que também está associada ao trabalho precário, que basicamente assegura apenas a sobrevivência, sem nenhuma possibilidade de melhorar em condições de vida.  

Segundo o IBGE, a taxa de formalização dos serviços por cor ou raça se mostrou mais uniforme em comparação às demais estatísticas. No entanto, as pessoas brancas ainda levam vantagem, com 78,6%, contra 76,3% das pretas ou pardas.

Em Florianópolis, a informalidade foi ainda menor, apesar de manter a diferença entre os grupos avaliados. A população branca registrou 81,9% de formalização e negros e pardos chegaram a 78%.

— É importante destacar que a informalidade atinge a classe menos favorecida, porque muitas vezes a informalidade é confundida com empreendedorismo, pessoas que não querem ter vínculos para realizar seu trabalho de forma mais autônoma. Isso é um percentual muito pequeno. Majoritariamente, as pessoas que estão no trabalho por conta própria recebem entre um salário, um salário mínimo e meio. Então, tem uma marca do ponto de vista de classe social muito acentuada — explica a economista.

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