Deputados estaduais de Santa Catarina pressionam para retirar os termos relações de gênero, identidade de gênero e diversidade sexual do Currículo Base da Educação Infantil e Fundamental do Território Catarinense, coordenado pela Secretaria de Estado da Educação. O documento busca nortear os projetos político-pedagógicos de unidades de ensino de todo o Estado e está na fase final de elaboração, aguardando apenas homologação do governador Carlos Moisés da Silva (PSL).
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Na sessão desta quarta-feira da Assembleia Legislativa (Alesc), o deputado estadual Ismael dos Santos (PSD) foi à tribuna para questionar a inclusão dos termos ligados a diversidade e identidade de gênero no documento da educação.
Ismael criticou o que chamou de "ideologia de gênero" e definiu o conceito como "desconstrução do conceito de família e erotização precoce".
À reportagem, Ismael lembrou que discussão semelhante já ocorreu em 2015, na aprovação do Plano Estadual de Educação, quando os termos acabaram sendo retirados, e relacionou os termos ao que chama de uma “proposta ideológica”.
– Cabe à escola ensinar. Cabe à família educar, nas questões específicas de construção de valores, princípios, sexualidade, e não à escola – afirmou.
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O deputado Maurício Eskudlark (PL), que é o líder do governo na Alesc, endossou as críticas de Ismael e chegou a afirmar que "todas essas pautas serão cortadas". Os deputados do PSL como Ricardo Alba e Ana Caroline Campagnolo também criticaram os termos incluídos no Currículo Base.
Alba saiu em defesa do governador Carlos Moisés e chegou a afirmar que recebeu ligação do secretário de Educação de SC, Natalino Uggioni, informando que as expressões seriam cortadas do documento. Informações sobre o posicionamento dos deputados foram divulgadas pela Alesc na tarde desta quarta-feira.
À reportagem, Eskudlark afirmou que soube por Alba, após conversa do deputado com o secretário Uggioni, que a inclusão daqueles termos teria sido "um equívoco", que o plano ainda estaria em conclusão e que o documento seria alterado.

Procurada, a Secretaria de Educação, por meio da assessoria, não confirmou que o secretário tenha prometido retirar os termos do documento, mas informou que "a situação será analisada".
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Em nota, a pasta ressalta que "menciona uma única vez o termo ‘identidade de gênero’ e o faz na Unidade Temática Vida e Evolução do componente curricular Ciências da Natureza no 8º ano".
A resposta da Secretaria de Educação afirma ainda que a expressão está inserida no contexto de conhecimentos necessários aos estudantes, como permitir que "ao terminarem o Ensino Fundamental, os alunos estejam aptos a compreender a organização e o funcionamento do corpo humano, assim como a interpretar as modificações físicas e emocionais que acompanham a adolescência e a reconhecer o impacto que elas podem ter na autoestima e na segurança de seu próprio corpo".
Por fim, a nota afirma que o Currículo Base do Território Catarinense foi desenvolvido com participação de quatro entidades de dirigentes educacionais e mais de 550 profissionais da área, entre gestores e professores (confira a íntegra da nota ao final da reportagem).
Deputados estaduais apresentaram requerimentos formalizando o pedido ao governo de retirada dos termos do Currículo Base.
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O que diz o documento
O Currículo Base da Educação Infantil e Fundamental vem sendo elaborado nos últimos meses e é uma espécie de base comum curricular para ser aplicada às unidades estaduais de ensino.
O documento é considerado importante por estabelecer diretrizes e padronizar o conteúdo do estudante nas redes de ensino, tornando o aprendizado mais igualitário e com menos diferenças e dificuldades na aprendizagem nas mudanças entre unidades e regiões do Estado.
As menções a termos como diversidade e identidade de gênero criticadas pelos deputados estaduais de SC aparecem em dois pontos do documento. Confira abaixo:
Página 35
Ao final do primeiro capítulo, que fala sobre diversidade na educação de SC, um dos tópicos aborda as relações étnico-raciais e traz perguntas sobre a compreensão de cada tema da diversidade de SC. A menção a relações de gênero e diversidade sexual aparece apenas uma vez, ao lado de tópicos como direitos humanos, de comunidades urbanas e rurais:
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Quem são os sujeitos da diversidade?
Os sujeitos da diversidade “somos todos nós”, mas há de destacarem-se os grupos que vivenciaram processos de preconceito e discriminação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996) obriga o ensino de conteúdos históricos nas escolas: os afro-brasileiros e indígenas (BRASIL, 1996). É fundamental, desse modo, a inclusão, nos componentes curriculares, dos movimentos de direitos humanos, das comunidades tradicionais urbanas e rurais, das relações de gênero e da diversidade sexual.
Página 379

A segunda menção ocorre em um quadro sobre conhecimentos e habilidades a serem desenvolvidas por alunos do 8º ano do ensino fundamental. No tópico vida e evolução, uma das habilidades definida é:
Selecionar argumentos que evidenciem as múltiplas dimensões da sexualidade humana (biológica, sociocultural, afetiva e ética).
Na mesma página, ao listar os conteúdos a serem trabalhados para desenvolver as habilidades mencionadas, aparece a seguinte relação, todos com temas ligados a temas como corpo humano e biologia:
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Conteúdos:
Comparações de ciclos de vida e os tipos de reprodução.
• Sistemas Reprodutores: Masculino e Feminino.
• Adolescência, puberdade e sexualidade.
• Maturação sexual do adolescente.
• Ciclo menstrual.
• Fecundação, métodos contraceptivos, etapas da
gravidez, tipos de parto.
• Reprodução e sexualidade – aspectos psicológicos,
emoções, sentimentos (amor, amizade, confiança, autoestima,
desejo, prazer e respeito).
• Importância do pré-natal.
• A importância de exames preventivos.
• Gravidez indesejada.
• ISTs e políticas de saúde pública.
• Identidade de gênero.
Nota sobre identidade de gênero da Secretaria de Estado da Educação
O Currículo Base do Território Catarinense, em estreita relação com a Base Nacional Comum Curricular, menciona uma única vez o termo "identidade de gênero" e o faz na Unidade Temática Vida e Evolução do componente curricular Ciências da Natureza no 8º ano.
De acordo com a BNCC, diretriz nacional produzida no âmbito federal, pretende-se que, ao terminarem o Ensino Fundamental, os alunos estejam aptos a compreender a organização e o funcionamento do corpo humano, assim como a interpretar as modificações físicas e emocionais que acompanham a adolescência e a reconhecer o impacto que elas podem ter na autoestima e na segurança de seu próprio corpo.
É no conjunto destas compreensões que a questão é tratada pelo Currículo do Estado de Santa Catarina, ou seja, no estrito respeito ao conhecimento necessário para o cuidado de si e do outro, conhecimentos necessários aos estudantes catarinenses.
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Na mesma esteira, o Currículo do Território Catarinense é fruto do trabalho coletivo, conduzido pela Secretaria Estadual de Educação, em regime de colaboração com a Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), a Uncme (União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação) o CEE (Conselho Estadual de Educação) e também com a participação da FECAM (Federação Catarinense de Municípios).
Reuniu forças de mais de 550 profissionais da educação, entre gestores e professores que debruçaram seu capital intelectual na construção e finalização do Currículo. Convém destacar que o ato de aprovação por unanimidade do CEE demonstra o reconhecimento e importância desta diretriz para a educação em Santa Catarina.