O navio de cruzeiro Preziosa, que atracará nas proximidades da praia de Canasvieiras, em Florianópolis, neste sábado, volta a evidenciar o mercado náutico e mostra que o município pode explorar sua vocação turística para abarcar cada vez mais segmentos a fim de movimentar a economia. Mas se há quase uma década a Capital catarinense recebia cruzeiros, por que parou? E mais: o que faz o poder público e os profissionais do ramo acreditarem que, desta vez, a cidade vai permanecer na rota dos cruzeiros?A última vez em que um transatlântico aportou em Florianópolis foi na temporada 2009/2010. Distintos fatores explicam o motivo para que essa história tenha parado ali, mas o principal tem relação com os custos operacionais e reflete uma realidade nacional.

Continua depois da publicidade

Na década passada, 18 navios faziam cruzeiros ao longo da costa brasileira. Hoje, são apenas quatro, sendo que o número de cidades onde o embarque de passageiros é feito também reduziu: se antes eram cinco municípios – Santos (SP), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), Recife (PE) e Itajaí (SC) – hoje apenas os dois primeiros continuam com o serviço.

– O Brasil é muito difícil, porque temos um problema sério com relação às taxas portuárias, que estão entre as mais caras do mundo. Ainda tem a taxa alfandegária, porque o navio é território internacional, e, além disso, somos obrigados a contratar práticos para atracar nos portos ao custo de cerca de R$ 10 mil, mesmo que o navio seja todo automatizado – comenta Ana de Paula, diretora da Central de Cruzeiros, agência especializada em viagens marítimas.

Esse é um dos fatores que causa o elevado custo dos cruzeiros – entre R$ 4 mil e R$ 5 mil por uma viagem de três noites –, outro motivo para a baixa procura e menor circulação na costa brasileira. Por questões como essa, boa parte da procura dos clientes é por cruzeiros internacionais.

– O mercado sempre foi para alta renda, mas o nível aqui é baixo. Aqui, por exemplo, nunca vai ter lagosta em um jantar. As empresas de cruzeiros baixam o nível das coisas dentro do navio e, por isso, os cruzeiristas de carteirinha preferem fazer fora do Brasil – afirma Ana de Paula.

Continua depois da publicidade

Se a diminuição do número de navios na costa brasileira explica em parte porquê Florianópolis deixou de ser rota de cruzeiros, há outras questões a se levar em conta. No entendimento do superintendente municipal de Turismo, Vinícius de Lucca Filho, a disposição do poder público para atrair os cruzeiros também é fator preponderante.

– As operadoras pedem o apoio dos governos, principalmente com relação às forças de segurança, as necessidades espaciais (para locomoção e atracação), a logística para os passageiros que desembarcarem. Então, o que aconteceu foi que, ao longo dos últimos anos, Florianópolis aparentemente deixou de querer cruzeiros. Deixamos escapar.

Cidade busca um novo segmento turístico

Se há quase uma década a Capital catarinense se voltou para outros segmentos e “perdeu o interesse” pelos cruzeiros, hoje o vento virou. A necessidade de ampliar os meios de arrecadação fez o poder público mirar a diversificação dos atrativos turísticos: além do “sol e mar”, o município hoje busca atrair o turismo de eventos, histórico e, agora, o turismo náutico.

– Temos que continuar diversificando. Florianópolis, sendo uma ilha e já tendo experiência com cruzeiros, naturalmente pode se voltar a esse mercado. Ano após ano o movimento de turistas na temporada de verão tem se mantido quase o mesmo, por isso um novo segmento é importante – ressalta Vinícius de Lucca Filho.

Continua depois da publicidade

No Brasil, a temporada de cruzeiros começa no dia 1º de novembro e vai até o final de março. A expectativa é de que o município “passe no teste” deste final de semana e se coloque como um dos destinos preferenciais das agências de cruzeiros, até mesmo pelas necessidades deste segmento. Os navios estão cada vez maiores, e, por isso, é importante para as agências que os passageiros desembarquem nos pontos de parada.

– Os ventos estão favoráveis, inclusive do ponto de vista do mercado. Para as operadoras, é muito bom quando os passageiros desembarcam, porque diminui o custo com a alimentação dentro do navio (geralmente, inclusa nos pacotes de viagens). Além disso, faturam também com os passeios nas cidades. E é aí que Florianópolis se destaca de outros destinos, porque nossa cidade tem essa capacidade de atrair os passageiros – acredita o superintendente de Turismo.

– Santa Catarina é um destino top no Brasil. Quando se fala em Florianópolis, todo mundo quer conhecer. Isso pode agregar mais valor e gerar ainda mais vendas de cruzeiros – completa Ana de Paula.

Outro fator preponderante para a reinserção definitiva de Florianópolis na rota dos cruzeiros é a vontade política. Esta é a visão do secretário estadual de Turismo, Leonel Pavan.

Continua depois da publicidade

– Para realizar as coisas tem que ter atitude, que é o que está havendo agora. Não podemos mais ficar parados. Além de ser um dos lugares mais lindos e propícios, Florianópolis oferece estrutura e condições para receber os cruzeiros. Isso é uma conquista, e o que perdemos no passado está sendo resgatado agora. Vamos viver um novo momento.

Escala-teste cheia de desafios

Para ancorar de vez na rota dos cruzeiros, Florianópolis precisa superar alguns obstáculos. O primeiro deles diz respeito à logística do desembarque, o que será testado neste sábado. O navio irá atracar a metros da praia de Canasvieiras, e os passageiros serão levados de lá até o trapiche em lanchas com capacidade para cerca de 100 pessoas. Assim que colocarem os pés em terra firme, haverá a venda de passeios, artesanato, roupas e artigos de praia.

– Teremos aproximadamente 200 táxis, 300 vans e 50 carros executivos para levar os passageiros. O primeiro passo é fazer bem feito no sábado. Depois disso, vamos pleitear escalas para a próxima temporada. Temos a meta de receber pelo menos 10 cruzeiros, sendo que o ideal é que aconteçam em novembro, dezembro e março, porque nos meses de janeiro e fevereiro a mobilidade é complicada – afirma Vinícius de Lucca Filho.

Para que a meta seja cumprida, será preciso esforço. Pensando nisso, a Secretaria de Turismo do Estado planeja criar um grupo de captação de cruzeiros.

Continua depois da publicidade

– Não podemos nos acomodar. Temos que captar os navios, buscar sempre mais, porque se parar diminui o movimento – comenta Leonel Pavan.

Além da captação, outro ponto de atenção diz respeito às documentações necessárias para a atracação dos navios e o consequente desembarque de passageiros. De acordo com o superintendente municipal de turismo, para o teste deste sábado a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) concedeu uma licença emergencial.

– A curto prazo temos essa questão da documentação. Se não conseguirmos a definitiva até setembro, vamos pedir outra emergencial para a próxima temporada enquanto nosso pedido tramita na Antaq. Sabemos das dificuldades, mas não podemos ficar fora desse mercado. É emprego, renda, dinheiro vivo chegando na cidade.

Presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Florianópolis (SHRBS), Estanislau Emílio Bresolin elogia a iniciativa, mas faz ressalvas quanto às condições de infraestrutura:

Continua depois da publicidade

– Canasvieiras está virada no trapo. Tem a questão de balneabilidade. Primeiro tem que corrigir isso tudo para chegar a essa possibilidade de terminal de navio. É necessário pensar nisso como um todo, fazer de Canasvieiras um balneário de respeito.

Com Florianópolis, SC tem quatro pontos de parada

A Capital catarinense busca se firmar na rota dos cruzeiros de olho no gasto dos passageiros. Se o turista “comum” da temporada de verão gasta, em média, entre R$ 100 e R$ 150 por dia, a expectativa é de que cada passageiro que desembarcar do Preziosa gaste cerca de R$ 500.

– O desenvolvimento econômico é muito grande. Balneário Camboriú, por exemplo, ganhou entre R$ 40 milhões e R$ 50 milhões com o turismo náutico em 2017. Isso mostra que é um grande momento para Florianópolis dar esse novo passo e retomar aquilo que não devia ter parado – afirma o secretário estadual de Turismo, Leonel Pavan.

Com Florianópolis, Santa Catarina chega a quatro pontos de parada de cruzeiros: além da Capital, Porto Belo, Balneário Camboriú e Itajaí. Há, ainda, a possibilidade de São Francisco do Sul voltar a fazer parte da rota. Isso anima o superintendente de Turismo de Florianópolis, que sonha transformar o município em ponto de partida dos navios.

Continua depois da publicidade

– O que precisamos em terra para essa operação é acertar os detalhes com a Polícia Federal e a Receita Federal. Se confirmar, nossa intenção é ter mini-cruzeiros pela costa catarinense. A pessoa vem para Floripa e daqui vai a Porto Belo, Balneário e São Francisco do Sul. Seria R$ 2 mil de gasto médio no Estado.

O presidente do SHRBS reconhece que isto seria bom para a rede hotelaria e para os restaurantes de Florianópolis, mas pondera com relação à viabilidade da empreitada. Para Bresolin, será preciso esforço para viabilizar um terminal de cruzeiros.

– Se fala nisso há 20 anos. Precisaria de uma estrutura gigantesca, seria um investimento alto, sendo que temos outras prioridades para alavancar o turismo. Pode ser um caminho, mas temos pouco recursos para isso.

Pavan afirma que a tendência é que esse esforço vá adiante.

– Santa Catarina está indo a favor da maré, aproveitando oportunidades. Para isso, é preciso que tudo dê certo sábado.

Continua depois da publicidade