Embora não trate de políticos catarinenses, a delação do ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht Claudio Melo Filho traz em suas 82 páginas um capítulo que interessou diretamente ao Estado. Segundo o delator, a Odebrecht pagou R$ 4,5 milhões em propina pela aprovação de uma proposta Senado que prejudicava diretamente os interesses de Santa Catarina.

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Upiara Boschi: Política de SC sobrevive à primeira delação da Odebrecht

O projeto de resolução 72 unificou em 4% as alíquotas de importação cobradas pelos Estados em seus portos, atingindo em cheio a política do governo catarinense de conceder incentivos fiscais para tornar mais competitivos os portos locais. Na época,o governo calculava que as perdas para a arrecadação estadual poderiam chegar a R$ 1 bilhão por ano.

Como a Odebrecht se beneficiou da rede de corrupção na política

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Confira na íntegra a delação premiada de ex-executivo da Odebrecht

Este cenário mobilizou o governador Raimundo Colombo (PSD) e a bancada de senadores catarinenses, especialmente Luiz Henrique da Silveira (PMDB), na resistência às mudanças – que acabariam aprovadas no plenário do Senado em 24 de abril de 2012 por 56 votos a 12. Luiz Henrique chegou a apresentar uma emenda para que a unificação do ICMS fosse gradual em um período de três anos, mas que acabou rejeitada. Reconhecendo os prejuízos a Santa Catarina, o governo federal na época liderado pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) viabilizou um financiamento de R$ 3 bilhões para obras de infraestrutura que acabou se transformando no Pacto por Santa Catarina.

O que a delação de Claudio Melo Filho acrescenta a essa história é a forte atuação da Odebrecht para que a proposta fosse fosse aprovado texto original da proposta e que para isso teria pago R$ 4 milhões ao senador Romero Jucá (PMDB-RR), a serem divididos com Renan Calheiros (PMDB-AL), e outros R$ 500 mil a Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) – cassado em maio deste ano acusado de quebrar o decoro parlamentar em tentativa de obstruir as investigações da Operação Lava Jato.

Em quatro páginas, a delação traz valores, datas de depósitos e transcrições de emails do ex-executivo com Marcelo Odebrecht, então presidente da companhia. De acordo com o relato, a chamada ¿Guerra dos Portos¿ feria os interesses da indústria brasileira ao tornar mais baratos produtos importados através dos locais que praticavam os benefícios fiscais. Aponta que ¿Marcelo Odebrecht, com o objetivo de enfrentar esse problema, manteve reunião com Guido Mantega¿ (PT, então ministro da Fazenda), que teria dito que o governo federal queria resolver a questão e que pediria ao senador Romero Jucá para tratar diretamente do assunto¿.

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O delator diz que as tratativas no Congresso envolveram diversos senadores e que ¿na

oportunidade, Romero Jucá, aproveitando-se da simbologia do seu cargo de senador, solicitou apoio financeiro¿. Na época, Jucá era líder do governo Dilma no Senado. O pagamento teria aprovado e realizado após a aprovação da proposta.

— Acredito que o valor total desses pagamentos seja da ordem de R$ 4 milhões, embora não me recorde com precisão. Esses pagamentos, segundo me foi dito por Romero Jucá, não seriam apenas para ele, mas também, como já havia ocorrido em outras oportunidades, para Renan Calheiros — diz Claudio Melo Filho em sua delação.

Em entrevista ao jornal O Globo, Romero Jucá negou todas as citações feitas a ele pelo delator – que denunciou um total de R$ 22 milhõe sem propinas ao senador roraimense.

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— Eu me sinto vítima de armação. Minha função como líder tem sido discutir medidas, fazendo uma ponte entre governo, Congresso e setor econômico. Sempre fiz articulação, é a função do líder. Dizer que entro nas discussões com o objetivo de receber alguma coisa é uma afirmação criminosa — afirmou.

O delator relata ainda que Delcídio do Amaral ¿teria reclamado por não ter recebido muita `atenção¿ da nossa parte¿ e que isso resultou no pagamento de R$ 500 mil ao ex-petista.

Na época, coube a Luiz Henrique ser responsável pelos pressão catarinense contra a proposta no Legislativo. O peemedebista morreu em maio de 2015. Pelo Poder Executivo, as conversas foram feitas pelo então secretário da Fazenda, Nelson Serpa (PSD), através do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e, posteriormente, pelo governador Raimundo Colombo com o ministro Guido Mantega. Serpa diz que nada de estranho na condução da operação foi percebido pelos catarinenses.

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_ As conversas foram normais, embora duras e difíceis, por envolverem encaminhamento de recursos. Nós defendíamos que a medida fosse gradual, mas chegamos a um acordo para que os Estados mais prejudicados, que éramos nós, Goiás e Espírito Santo, tivessem acesso a uma linha de crédito que pudesse compensar as perdas que teríamos para fazer investimentos _ relembra Serpa.