A Defensoria Pública da União (DPU) solicitou nesta sexta-feira (17) à Justiça a suspensão temporária de possíveis atos para a retirada de famílias de uma ocupação em terreno da União no município de Araquari, Norte de Santa Catarina, até que seja realizada uma audiência pública para buscar uma solução para alocar os moradores.

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O caso transitou em julgado na Justiça Federal no final de 2019 e está em fase de execução. No entanto, dados novos sugerem que todas as famílias que vivem no local e as pessoas que aguardam em lista de espera de programas habitacionais no município poderiam ser contempladas com moradias na área, já destinada para esse fim.

Ao julgar o pedido de regularização fundiária das moradias feito pela DPU em ação civil pública, a Justiça Federal considerou a existência de 816 cadastros de interessados em participar de programas habitacionais no município, em 2017. Esse número “foi utilizado como arcabouço para confirmar que haveria violação direta do direito ao acesso a políticas habitacionais para moradia destas pessoas caso mantidos os ocupantes no imóvel da União”, conforme a manifestação judicial da DPU nesta sexta.

A Prefeitura Municipal de Araquari, porém, divulgou nota oficial nesta semana informando que “há dados de 120 famílias – algumas delas, inclusive, moradores da referida área de ocupação” – no cadastro da Secretaria Municipal da Habitação. Para a defensora pública federal Eliza Adir Coppi Leonetti, “as informações que ora são veiculadas sinalizam de forma concreta para a plena viabilidade do assentamento regularizado no local não só dos que lá estão atualmente, como dos demais membros da população que constam da lista da Prefeitura e que aguardam implantação de futuro projeto habitacional”.

A defensora ressalta também que o relator do processo no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, desembargador Rogério Favreto, incluiu em seu voto “a necessidade de cuidado na condução do procedimento de execução e, inclusive, sinalizou, enfaticamente, para, ‘se possível’, fossem mantidas as famílias, de modo legal, e tutelados seus direitos, no local que já está direcionado e afetado para habitação popular”.

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Para Favreto, no caso da retirada das famílias, que não deve ser “desnecessária ou precipitada”, “caberá ao Município providenciar área ou alojamento de transição aos que necessitem, a fim de permitir a mínima proteção humana diante do desabrigo atual”. A defensora considera, desse modo, que “não há respaldo para a promoção de atos de remoção forçada de inopino, sem oferta de alternativa viável aos que ali se encontram e não puderem permanecer”.

Entenda o processo

Procurada por moradores em 2014, a DPU ajuizou naquele ano, na Justiça Federal em Joinville, uma ação civil pública solicitando a regularização fundiária e a garantia do direito à moradia para as famílias que vivem em área da União em Araquari. Havia, à época, a informação de que poderia ser realizada operação de desocupação da área. Em outubro de 2014, a Justiça concedeu uma medida liminar para a desocupação voluntária das famílias no prazo de 60 dias.

Em março de 2017, chegou à DPU a notícia de que moradores foram novamente notificados sobre a necessidade de desocupação do imóvel, em força-tarefa capitaneada pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), com as Polícias Federal e Militar e o município de Araquari. A DPU entrou com um agravo de instrumento na Justiça pedindo a suspensão de quaisquer medidas administrativas para a desocupação da área ou a demolição de imóveis até a manifestação definitiva sobre a ação civil pública, por parte da Turma responsável no TRF4. A solicitação da DPU foi aceita.

A Justiça Federal proferiu sentença na ação civil pública cinco meses depois. O juiz Paulo Cristovão de Araújo Silva Filho, da 2ª Vara Federal, acolheu parcialmente o pedido da DPU, ordenando a regularização fundiária para oito famílias que já haviam sido identificadas em procedimento administrativo da SPU em 2009. A Justiça considerou a antiguidade da ocupação por parte dessas famílias, levando em conta o período de cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação, conforme Art. 47 da Lei nº 11.977/2009.

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Ao mesmo tempo em que entrou com um recurso para reforma da sentença, a DPU conseguiu na Justiça a manutenção da suspensão de medidas que pudessem levar à desocupação da área ou à demolição de imóveis, ao menos até a manifestação definitiva do Tribunal em relação à questão.

O TRF4 julgou o recurso sobre a ação civil pública em setembro de 2019 e manteve a sentença integralmente, conferindo o prazo de 30 dias para a desocupação voluntária das moradias construídas na área ocupada, com exceção das oito famílias que poderão permanecer no local, obtendo a regularização fundiária de suas residências. Após esse prazo, o poder público estaria autorizado a adotar medidas para a desocupação. Foi mantida a possibilidade de os demais moradores do local serem inscritos em lista de espera de programas habitacionais do município.

A ação civil pública transitou em julgado em 13 de novembro, não cabendo mais recursos. A DPU foi intimada da decisão em dezembro de 2019, quando se iniciou a contagem do prazo para a desocupação voluntária por parte dos moradores. No mesmo mês, em audiência na DPU, representantes das famílias foram comunicados da decisão e do prazo para desocupação. Na semana passada, três defensoras públicas federais voltaram a conversar com moradores e movimentos sociais, na unidade da instituição em Joinville, esclarecendo o trabalho realizado e a situação do processo.

De forma paralela a esse processo, tramita uma ação de reintegração de posse proposta pela União em 2017, que ficou suspensa até o julgamento definitivo da ação civil pública. Neste momento, com o trânsito em julgado da ação da DPU, a Justiça abriu prazo para a manifestação das partes.

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