Um trabalha numa banca de revistas na Esquina Democrática, centro de Porto Alegre. Enquanto seus clientes escolhem o que comprar e, depois, na hora de contar o troco, ouve as mais íntimas revelações de seus clientes. O outro vende bandeiras há oito anos nas esquinas.
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Ambos não se conhecem, mas têm a mesma percepção destes dois dias em que Porto Alegre terá 100 mil pessoas no Beira-Rio e no Olímpico: aí está uma cidade nervosa.
Sim, porque o sentimento é este. É Gre-Nal. O duro, para os colorados, não é deixar de ser campeão da Copa do Brasil sobre o Corinthians, hoje à noite, no Beira-Rio. Duro é aturar os gremistas no dia seguinte, a um passo da final da Libertadores. O pânico, para os gremistas, não é dar tudo errado contra o Cruzeiro, no Olímpico, amanhã. O que provoca calafrios é o Inter ser campeão e entrar na Libertadores e o Grêmio sair dela amanhã. Por isso Porto Alegre está à beira de um ataque de nervos. Ou, como diz José Javel Silveira, 70 anos, o homem da banca de revistas:
– Os dois estão com medo. A vida de um está ligada à do outro.
Perto da banca de Ravel, acontece um encontro de rivais no centro de Porto Alegre. Até na hora de vestir a roupa para sair de casa, Protásio Santos, 43 anos, e Leandro Souza, 33 anos, pensam nas decisões de hoje e amanhã. O encontro acontece graças às crianças. O que é ótimo sinal. Tanto no Beira-Rio quanto no Olímpico, é preciso paz.
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O certo é que Pedro, afilhado do colorado Protásio, e Andreyw, filho do gremista Renato, foram hipnotizados pelo palhaço da perna de pau Anderson Silva. Enquanto a gurizada se divertia, os dois admitiam: o problema é mesmo o vizinho no dia seguinte.
– Virou Gre-Nal. Está todo mundo nervoso – afirma Renato com Andreyw, um ano e oito meses, no colo.
– No fundo no fundo, a gente pensa no Grêmio. E vice-versa. A flauta vai pegar – sorri Protásio.
Os testemunhos de Protásio e Renato só corroboram, portanto, a percepção de Ravel. E também do vendedor de bandeiras, espécie de intérprete do cotidiano por conta do ofício exercido há oito anos. Com medo dos fiscais da Secretaria Municipal da Indústria e Comércio (Smic), ele implora pelo anonimato.
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– Nunca vi nada igual em termos de tensão. A gente até fica sabendo, aqui pelas redondezas, de viaturas da Brigada Militar agindo contra os mais exaltados – afirma o vendedor, a barba por fazer, entre uma e outra tragada no cigarro quase no fim.
Se há nervosismo longe dos estádios, imagine perto deles.
– Parece que tudo ficou mais explosivo: a carta, o telefonema, o pedido de autógrafo na camiseta – revela Alessandro Santos, funcionário do vestiário do Inter há oito anos.
Nas imediações da Azenha não é diferente. Maurício La Porta da Rocha, 23 anos, estudante de administração da PUC, chega a roer as unhas. Seus vizinhos no bairro Santo Antônio são colorados.
– Se eles ganham e a gente perde… Deus me livre! – suspira Maurício, um habitante, como tantos outros torcedores, de uma cidade nervosa por conta das decisões.
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