Circulando pelos corredores do Judiciário há mais de 20 anos, ações que tentam reaver as perdas nas cadernetas de poupança com os planos econômicos nos anos 1980 e 1990 começam a ser discutidas nesta quarta-feira pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Mais de 1 milhão de pessoas esperam a decisão da Corte em uma disputa bilionária. O veredicto dos ministros vai definir o futuro de 290 mil processos similares que envolvem diferenças na correção monetária em todo o país. O que é discutido é se é válida ou não a aplicação retroativa das novas regras criadas por cada um dos planos.
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Zauro Kowalski aguarda ansioso pelo resultado. Duas décadas atrás, o fotógrafo guardava suas economias na poupança para comprar uma casa em Quintão. Agora morando em Cachoeirinha, tenta reaver o que considera ter perdido. Com uma resposta favorável, Kowalski espera receber em torno de R$ 15 mil:
– Sei que não é muito, mas é meu. Espero que os juízes entendam isso.
A resposta definitiva que Kowalski tanto aguarda, no entanto, corre o risco de sair só no ano que vem. Nesta quarta-feira, o dia deve ser dedicado para as sustentações orais dos advogados. Somente na quinta-feira os ministros começariam a proferir seus votos, e a sentença deve ficar para 2014.
O tema provoca tensão no Planalto. Como a Caixa Econômica Federal detém a maior parte das cadernetas de poupança, caberia ao governo grande parte do desembolso em caso de vitória dos poupadores. O impacto total para as instituições financeiras é estimado pelo Banco Central (BC) em R$ 149,9 bilhões. Além disso, como os bancos emprestam mais do que têm em caixa, o BC projeta retração de crédito de R$ 1 trilhão.
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O tamanho do rombo, no entanto, é questionado pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Para a entidade, o governo estaria superestimado os valores (ver quadro ao lado). A estimativa do Idec é de um custo de R$ 8,4 bilhões.
– Há uma guerra de números. O governo e os bancos chamam atenção para os possíveis reflexos na economia, mas esquecem de discutir o mérito da questão. É justo ou não é? – diz o advogado Gustavo Bernardi, que representa mais de mil ações no Estado.
Para João Rafael López Alves, do escritório Almeida e Almeida Advogados, que representa instituições financeiras no Estado, os bancos não se apropriaram de recursos dos clientes, apenas seguiram regras estipuladas pelo governo em relação aos planos.
Tire suas dúvidas
Qual a diferença entre aquele que entrou com uma ação individual e quem optou por uma ação coletiva?
Na prática há pouca diferença. Qualquer resultado obtido em ação coletiva não é estendido a ações individuais.
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Quem ainda não entrou com uma ação, pode procurar seus direitos agora?
Os prazos para entrar com as ações individuais já se expirou, para todos os planos econômicos. Contudo, para os poupadores que não tomaram a medida a tempo, ainda existe a possibilidade de executar as sentenças proferidas em ações civis públicas, como, por exemplo, as ajuizadas pelo Idec. Para fazer isto, é preciso verificar se existe alguma dessas ações que beneficie os poupadores do seu banco.
Caso o STF dê ganho de causa aos poupadores, o pagamento será imediato?
Não. As ações que estão sendo julgadas no STF são de reconhecimento, ou seja, os ministros estão apenas avaliando se o poupador tem ou não direito ao reembolso. Em caso de vitória, os processos retornam para a primeira instância e o poupador deverá entrar com uma segunda ação, chamada de execução. Só então será calculado a quantia a ser recebida.
Quanto tempo pode demorar uma ação de execução?
O ritmo de andamento do processo varia em cada região, mas, em média, demora seis meses.
Caso o autor de uma ação tenha falecido nesse meio tempo, os herdeiros têm direito ao reembolso?
Sim, eles têm direito a dividir os valores devidos ao falecido. Não é necessário ingressar com uma outra ação, basta requer a substituição processual, comprovando o falecimento e a qualidade de herdeiros.
Como foram as decisões do Judiciário até o momento?
Os poupadores ganharam todas as ações referentes aos planos Bresser, Verão e Collor 2. A mais importante delas ocorreu em agosto de 2010, quando o Superior Tribunal de Justiça decidiu pela correção dos valores. Os ministros do STF, no entanto, podem tomar uma decisão diferente.
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Caso o STF dê ganho de causa aos bancos, o poupador perde alguma coisa?
Quem entrou em uma ação coletiva não perde nada, pois o processo não tem custas já que é encaminhado pelo Ministério Público. Os poupadores que ingressaram com uma ação individual perdem o dinheiro que gastaram com as custas do processo.
Caso o STF dê ganho de causa aos bancos, caberá algum recurso aos poupadores?
Não. O Supremo é a instância final de julgamento no país. As ações são de repercussão geral reconhecida, que tem como finalidade dar a mesma solução a ações similares em todo o país.
Algum ministro do STF já se posicionou sobre o tema?
Ricardo Lewandowski, relator de um dos processos no STF, já sinalizou que irá votar a favor dos poupadores. O ministro Dias Toffoli foi contra o pagamento da correção quando era advogado-geral da União. A corte está bem dividida sobre a questão e a chance de empate é grande, avaliam especialistas.
Fonte: Daniela Barcellos, professor de Direito do Consumidor do Ibmec, e Louise Neiva Tajra, advogada da área cível do escritório Innocenti Advogados Associados
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