Em Blumenau, as mudanças após o ataque a creche que matou quatro crianças e feriu outras cinco em 5 de abril de 2023 foram quase imediatas. Enquanto a cidade vivia um luto que parecia ser de cada morador, a prefeitura mudou todo o planejamento da Educação. Se antes a proposta era desemparedar o ensino e deixar os estudantes mais livres, do dia para noite o objetivo foi erguer ainda mais os muros, “emparedar” as crianças, lembra o secretário municipal de Educação, Alexandre Matias.
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Em alguns casos, a própria comunidade se uniu para reforçar os muros dos Centros de Educação Infantil. As 131 unidades de ensino municipal receberam em tempo recorde vigilantes armados, que continuam fazendo parte da rotina escolar blumenauense. São quase R$ 20 milhões por ano para trazer essa sensação extra de segurança.
— Começamos com a segurança armada para dar um alento às famílias, trazer sentimento de segurança de volta e continuar o caminho na educação. Foi um momento bem frágil, bem complexo — relembra o secretário.
As equipes multidisciplinares aumentaram em sete vezes o tamanho com a contratação de 14 psicólogos e assistentes sociais. Esses profissionais identificam quando algum estudante precisa de atendimento especializado da Saúde por estar com algum comportamento mais agressivo ou que fuja à regra. Desde o ano passado, 340 jovens foram encaminhados a especialistas.
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Como ataque a creche em Blumenau marcou virada de chave na segurança das escolas em SC
Professores passaram por capacitação da Polícia Militar para saber como agir em situações extremas, mas Matias reforça que o objetivo é investir na prevenção, mesmo dentro do ambiente escolar. Ações que aproximem as instituições das famílias também têm sido pensadas:
— A gente clama que os pais acompanhem a vida escolar dos filhos. A responsabilidade da segurança é de todos nós. É preciso estar atento se o filho não tem um amigo, se é vítima de bullying, motivo de chacota… Encontrar potenciais situações — pede o gestor.
Por que comigo?
O ataque a creche em Blumenau parece ter sido um divisor de águas no combate a esse tipo de crime no país. Letícia Cesarino, doutora em Antropologia e assessora especial no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, avalia que o caso chamou a atenção não só por ter sido em uma cidade considerada segura, como lembra o secretário de Educação, mas principalmente porque, diferente de quase todos os episódios semelhantes, o autor não tinha qualquer envolvimento com a instituição de ensino.
— Foi aleatório, o que gerou ainda mais a sensação de “poderia ter sido com meu filho” — comenta Matias.
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Entre 2002 e outubro de 2023 foram 36 ataques a escolas no Brasil, que deixaram 49 mortos e 115 feridos, mostra um levantamento do Ministério da Educação. O de Blumenau, então, ocorreu durante o que alguns estudiosos chamam de “epidemia de violência”, já que desde 2017 o país tem vivenciado um aumento desses casos.
E Santa Catarina entende que não é mais possível tratar os episódios como algo isolado, interpreta o presidente da Alesc, Mauro de Nadal. Em 2021, o Estado registrou o ataque a creche em Saudades, no Oeste, em que cinco pessoas foram mortas.
Por trás de todos os números que embasam os novos projetos para prevenir outros crimes estão as pessoas. Histórias interrompidas de forma cruel. Famílias que precisam conviver com uma saudade que nunca dá trégua, descrevem Jennifer Pabst e Paulo Edson, pais do pequeno Bernardo, uma das vítimas do ataque em Blumenau. Foi tanta dor que em vários momentos eles duvidaram da própria fé. “Por que com o meu filho?”, “por que comigo?”.
A resposta é um silêncio prolongado. Há apenas duas certezas: a vida do casal deixou de ser colorida, os dias são em preto e branco, e o assassinato de Bernardo, de 4 anos, Larissa Maia Toldo, de 7 anos, Bernardo Cunha Machado, 5 anos, e Enzo Marchesin Barbosa, de 4 anos, não foi em vão.
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Não pode ser.
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