Houve dois momentos de brilho especial na trajetória da judoca Mayra Aguiar rumo à conquista da medalha de bronze na categoria até 78 quilos, em Londres. Dois momentos em que ela, mais do que talento, mais do que força, mais do que garra, demonstrou raro poder de concentração.

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O primeiro ocorreu nas quartas de final. Mayra já havia derrotado a tunisiana Hana Mareghni, e agora enfrentava a polonesa Daria Pogorzelec. No tatame ao lado, porém, lutavam a holandesa Marhinde Verkerk e a britânica Gemma Gibbons. A dona da casa estava se apresentando. Ou seja: praticamente todo o público do ginásio do imenso Centro ExCel torcia por Gemma. E torcia ruidosamente, como se ali estivesse a charanga do Flamengo. Os ingleses gritavam, batiam nas cadeiras, faziam a maior algazarra. Mayra, ao lado, sabia que nada daquilo era para ela. Nem contra ela. Era apesar dela. Ainda assim, ela se manteve fria, atacou a polonesa com a fúria de um Tyson e a venceu. Saiu do tatame como havia saído na primeira luta: séria, em silêncio, sem comemorar. Tinha consciência de que o mais difícil viria a seguir.

Veio.

A norte-americana Kayla Harrison era uma adversária dura. A técnica de Mayra, Rosicléia Campos, previu que aquela seria a “final antecipada”.

Foi.

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Mayra lutou com a costumeira agressividade, e partiu para cima da americana no início. As duas caíram sete vezes, sem que nenhuma das quedas se convertesse em ponto. No fim, a americana venceu. Mayra saiu do tatame abalada, o coque e o rosto desfeitos. Não sem motivo: foi a sua primeira derrota na temporada.

Então, deu-se o segundo momento luminoso de Mayra na Olimpíada. Ela tinha de se superar. Tinha de esquecer a frustração da derrota para buscar o consolo da medalha de bronze. Nos bastidores, encontrou o ex-judoca Aurélio Miguel.

– Ele me deu força. Disse que agora seria outra luta – contou Mayra. – Então, engoli o choro e prometi que ia buscar a medalha.

Buscou.

Quando voltou ao tatame, Mayra demonstrava outra vez a sua postura agressiva, as pernas abertas, os braços tesos ao longo do corpo, o rosto grave. Sentia dores num dos braços (“Estralou na outra luta”), mas não deixou que isso a abalasse. Nas arquibancadas lotadas, para aumentar a tensão, dois torcedores ilustres: o primeiro-ministro da Inglaterra, David Cameron, e o presidente da Rússia, Vladimir Putin. Sob o olhar deles, Mayra atacou a holandesa Marhinde Verkerk quase que com fúria. Depois de um minuto e meio de luta, venceu com um ippon. Ao descer do pódio, revelou que ainda não havia assimilado bem o que aconteceu, mas mostrou que estava no caminho ao comentar:

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– Uma medalha olímpica não tem preço, independentemente da cor.

Não tem. Isso Mayra vai constatar a partir de amanhã, dia do seu aniversário de 21 anos, o primeiro que irá comemorar com uma medalha olímpica pendurada no pescoço.