Esquiva Falcão havia acabado de surrar o inglês Anthony Ogogo, havia acabado de entrar na história do boxe brasileiro ao conquistar pelo menos a medalha de prata na Olimpíada de Londres, ontem pela manhã, quando o seu adversário de hoje pela medalha de ouro da categoria até 75kg, o japonês Ryota Murata, parou ao seu lado, a quatro metros de distância. Esquiva não olhou para Ryota, nem sequer virou a cabeça em sua direção. Mas era dele que falava. “Prometeu-o”, como se diz no âmbito da briga de rua:
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– Estava torcendo para lutar contra ele. Ele me ganhou no mundial, me bateu muito, mas isso foi em 2011. Hoje eu sou outro. Hoje estou muito melhor. E eu só penso nele. Estudo as lutas dele todas as noites. Quero muito lutar com ele.
Atual vice-campeão mundial, Ryota não deve ter entendido o que disse o brasileiro, que dito foi em bom português do Espírito Santo. Mas sabe o que o espera. Minutos antes, Esquiva só não transformou a cara de Anthony Ogogo em xisburguer porque o boxe olímpico é lutado com capacete de proteção. No primeiro round, Esquiva já demonstrou o que pretendia fazer com o outro. Agressivo, incisivo, veloz, castigava Ogogo, que, para não apanhar, viu-se obrigado a apelar para os clinchs, o “abraço” entre os boxeadores. Assim conseguiu equilibrar o confronto, e os juízes deram um resultado parcial de 3 a 3. Mas, no segundo round, Esquiva acertou alguns jabs e diretos e, no terceiro, aí sim, aí aconteceu aquilo que poderia ser definido como uma sova, uma tunda, um laço.
Os punhos de paralelepípedo de Esquiva vazavam a guarda do britânico a todo momento e explodiam-lhe na ponta do queixo, entre os olhos, no lado do nariz. O inglês caiu, levantou-se, voltou para a luta meio tonto. Esquiva, rápido, dançou na frente dele e mandou outra bomba. Ogogo foi à lona outra vez e outra vez se levantou, desnorteado. Esquiva novamente balançou o corpo e acertou-lhe mais um golpe. Ogogo não caiu por ter se apoiado no chão.
A essa altura, os torcedores que lotavam o ginásio do Centro ExCel já estavam em silêncio. No começo, eles batiam com os pés no chão do ginásio e gritavam “Anthony, Anthony”, em apoio ao seu conterrâneo, mas agora estavam conformados. Quando os juízes deram a vitória para o brasileiro por 16 a 9, os ingleses, cavalheiros, aplaudiram o brasileiro.
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Esquiva abriu os braços. Depois, com as mãos enluvadas fez o T para lembrar o pai, Touro Moreno, o homem que o transformou em lutador, que colocou o boxe até no seu nome e que, longe, na periferia de Vitória do Espírito Santo, devia estar ansioso para receber, neste fim de semana, o melhor presente do Dia dos Pais da sua vida: uma medalha de ouro.
Deu no The Guardian
O jornal britânico The Guardian elogiou bastante Esquiva Falcão, descrito como “canhoto classudo, que bate forte, com habilidades de qualidade” e “que talvez tenha o que é preciso para ser um astro entre os profissionais”.
Pai de todos
Esquiva e Yamaguchi Falcão são dois dos 18 filhos de Touro Moreno, capixaba de 75 anos que é uma lenda do boxe, do MMA e do telecatch brasileiros. É em homenagem ao pai que Esquiva, ao final das lutas, faz um “T” com seus braços.