Este calor sufocante poderia ser registrado como bem (ou mal?) de Blumenau. Mas Indaial poderia fazer o mesmo. Já conheci manauara que quase sucumbiu às temperaturas entre novembro e março registradas nestas cercanias. A Amazônia é menos abafada, concluiu. Passar um verão por aqui é uma oportunidade de conhecer-se melhor sem a necessidade de ajuda profissional.
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Descobri que quando a temperatura – ou a sensação térmica, nossa velha conhecida de telejornais – atinge 30 ºC perco metade da capacidade intelectual. Sentar à frente do computador e tentar desenvolver qualquer pensamento é hercúlea tarefa quando o suor escorre nas têmporas. Não há concentração que resista ao pescoço encharcando.
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Quando o clima atinge esse nível de bafo, tarefas cotidianas tornam-se quase impossíveis. Pegar ônibus talvez seja uma das mais prejudicadas. Diria que embarcar no troncal 10 no fim da tarde – antes da trovoada – é um ato de coragem para poucos caso o ônibus não estivesse quase sempre lotadíssimo. Com o sistema de transporte coletivo colecionando atrasos – e reclamações -, os ônibus ficam ainda mais cheios. Há quem não aguente. Relatos de desmaios têm pipocado. Com o avançar galopante da temperatura é possível conhecer versões mais obscuras de si.
Aos 40 ºC minha segunda personalidade descortina-se. Torno-me incapaz de estabelecer qualquer tipo de conversa amistosa. Só as mais necessárias e rápidas. Cozinhar é uma atividade invariavelmente prazerosa – a mim, ao menos -, mas no verão escaldante poderia ser classificada como atividade análoga à tortura. Por isso, também, nutro profundo respeito por quem vive à escalda em prol de bem alheio. Cozinheiros, guardas, coletores de lixo, trabalhadores da construção civil, pessoal da Odebrecht. A lista é longa.
Como se pode perceber, minha segunda personalidade é ranzinza. Ainda assim, reconhece a necessidade do calor. É durante o período mais quente que brotam melancias vigorosas, mangas açucaradas e ananases. As cebolinhas crescem felizes e cheirosas. No verão a vida verde se reproduz com mais velocidade que as roçadeiras da prefeitura. Essa é uma partida que os laranjinhas, apesar do esforço, nunca ganham. Esta época serve ainda para lembrarmos do valor da água, que volta e meia some das torneiras.
Ainda há alguma democracia no calor que me agrade. Todos o sentem com toda a sua intensidade. A diferença é que uns podem buscar refresco no ar-condicionado e na piscina, enquanto outros tentam o alívio no banho de mangueira – muito mais divertido, convenhamos – e ventilador. Enquanto a próxima estação não dobra a esquina do calendário e minha segunda Daniela não tem descanso, sigo sobrevivendo à base de sorvete do Schmitt.
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