O ano passado foi o período em que mais ecologistas foram mortos neste século de acordo com as estatísticas da Organização Não Governamental Global Witness. A ONG, com sede em Washington e Londres, investiga as relações entre a exploração de recursos naturais, conflitos, pobreza, corrupção e abusos de direitos humanos em todo o mundo. O levantamento apontou que em 2015 foram assassinados 185 ecologistas.

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A América Latina lidera o ranking de regiões com mais vítimas, com 66% do total mundial. O Brasil é o país de todo o globo mais arriscado para os ativistas. No ano passado foram registradas 50 mortes em território brasileiro, o que representa 27% do total global. O ranking é seguido pelas Filipinas, Colômbia, Peru e Nicarágua, conforme a Global Witness.

Justo na semana passada, quando esta pesquisa circulou, aconteceu uma coincidência indigesta. O corpo da pescadora e ativista do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) Nilce de Souza Magalhães foi encontrado após cinco meses. Ela foi achada com as mãos e braços amarrados em pedras pesadas no lago da barragem da Usina Hidrelétrica de Jirau, em Porto Velho (RO), perto do acampamento onde morava. Nilce fazia parte de uma comunidade que teve a região onde morava atingida pela construção da usina e não tinha conseguido ser reassentada. Membros do MAB acreditam que o crime, ainda investigado, tenha ligação com as atividades que Nilce liderava, que defendem pessoas na mesma situação que a dela e contra a violação de direitos humanos. Nilce tornou-se estatística.

Aqueles 185 eram “ecochatos”. A primeira vez que ouvi o termo pejorativo foi quase uma piada de mau gosto. No início de 2009 fui trabalhar como assessora de imprensa na prefeitura de Ilhota. Sabia que não seria tarefa das mais simples. Uma prefeitura pequena, com recursos escassos e uma tragédia sem precedentes na região para lidar. Entre as minhas tarefas, além da assessoria de comunicação em si, era ajudar com fotos e outros registros para compor o relatório de avaliação de danos, que é um dos principais documentos que permitiriam a liberação de recursos. Logo nos primeiros dias já fui enviada às localidades mais atingidas do município, ao redor do Morro do Baú. Mesmo passados quase quatro meses da tragédia de novembro de 2008, ainda procuravam o último corpo das dezenas de vítimas. Algumas localidades ainda estavam praticamente isoladas, outras com acesso só com jipe e disposição para sair com lama dos pés à cabeça.

Nesse cenário, diversas vezes ouvi diferentes pessoas (entre locais, empreiteiros, servidores etc) falarem de um tal ecochato. Sempre lembrado com a alcunha nada carinhosa, fiquei algum tempo sem saber quem de fato era. Tratava-se de alguém com interesse em preservação ambiental, pensando no melhor para a própria comunidade local (já que áreas sensíveis não seriam mais habitadas) e a natureza.

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Num país que tem conseguido superar a cada ano seu próprio recorde de tragédias ambientais, os ecos são necessários. São chatos para quem?