– Minha base é minha crença nas coisas boas da vida. Com esse verso, ora cantado, ora rimado ou simplesmente sentido, a rapper Íris Bragi, 23 anos, de Forquilhinhas, São José, escreve sua trajetória. Íris é Juliana Souza, nascida em Urubici, na Serra catarinense, mas criada em Rio Rufino, cidade rural com 2,5 mil habitantes. Seu pseudônimo não foi escolhido ao acaso: Íris é a deusa grega que transmitia os ordenamentos divinos para os homens, considerada uma guia e conselheira. E Bragi é o deus da sabedoria e poesia. Carregando o nome de dois deuses do Olimpo, a jovem busca seu espaço no rap, mostrando com suas letras e atitude que entende bem o que está representando.

Continua depois da publicidade

Leia todas as reportagens da série Talentos da Comunidade

Com 14 anos e um quadro de depressão devido ao complicado contexto familiar – trabalhava na roça e até passou fome em alguns momentos – Íris fez do rap o remédio para sua alma. Ganhou de um primo que morava em Florianópolis um CD do grupo Realidade Cruel, que ouviu até estragar, e na televisão ouvia Ja Rule e DMX na novela teen Malhação. No limitado acesso que tinha à internet, pouco conseguia buscar referências.

Conheça Íris Bragi, rapper do bairro Forquilhinhas, São José

Continua depois da publicidade

Na escola, Juliana gostava de ler poesias e na escrita também encontrou um refúgio para a difícil realidade que vivia. As condições emocionais, financeiras e de moradia que tinha no interior fizeram com que aos 17 anos fugisse de casa para morar em Forquilhinhas. No bairro, se apoiou em algumas pessoas e teve pela primeira vez contato com o espaço urbano, onde fez amizades:

– Como eu estava sozinha, sem família, não tinha uma estrutura, então criei uma identidade com a rua e tive acesso ao rap com mais frequência – conta.

As letras que inicialmente falavam mais de sua própria história, uma espécie de desabafo diário, logo evoluíram para uma forte crítica social, a visão de Íris da situação do país:

Continua depois da publicidade

– No começo eu tentava formar poemas, mas não tinha muita noção. Há pouco tempo que comecei a fazer rimas mesmo e escrever com mais entendimento. Hoje o rap está muito mais forte na minha vida, significa uma visão do futuro sobre o que quero para mim, em questão de independência, realização profissional, espiritual.

Primeiro single

No mês de setembro, Íris Bragi lançou seu primeiro single, “Todos querem”, em parceria com o produtor musical Marrom. Ela conta que foi no intervalo do trabalho de auxiliar administrativa, quando estava se sentindo um pouco pra baixo, com saudades da família, que escreveu a letra. Enviou para Marrom, que gostou, e a dupla gravou no estúdio dele.

Até o momento, ela tem recebido bastante elogios e críticas construtivas, e junto com o coletivo Algo Bom, prepara outras músicas:

Continua depois da publicidade

– Meu sonho é cantar para muita gente, que minha música consiga atingir todos os públicos, chegar em vários corações. Que as crianças escutem, que idosos escutem, que minha mãe assista um show meu um dia, que ela possa estar na primeira fila.

Ao olhar para o passado, a garota conta que vem muitas coisas na mente:

– Tenho orgulho de com tudo que passei não ter deixado a peteca cair. Ficar longe da família não é fácil, ter conseguido lidar com a solidão muitas vezes, pois quando cheguei aqui, uma cidade grande, muito diferente da minha, me deparei com muita gente ruim, pessoas que quando sabem que moras sozinha já te olham intencionalmente, já te julgam. O tempo todo tu tem que tá mostrando para todo mundo que trabalha, tá conquistando tuas coisas, tem que se virar, é bem difícil.

Foto: Charles Guerra / Agência RBS

RAIO X

Nome: Juliana Souza (Íris Bragi)

Idade: 23 anos

Comunidade: Forquilhinhas – São José

Talento: cantora e compositora de rap

Nas redes

Facebook: Íris Bragi

Instagram: @iris_bragi

Youtube: Íris Bragi

Contato: (48)9808-4094

Todos querem

Noite gelada, regada a bebida, todos querem ser rei ao menos uma vez na vida.

Um trago, dois tragos para tirar o amargo, vazio da solidão, saudade do afago.

Uns perto da família, outros longe de casa, uns tendo mansões, outros que só querem asas.

Eu vejo e analiso todo o esquema, eles evitam o sentimento, chamam de problema. Ilusão vem na noite, vestida de vermelho. Te dá um sorriso antes de mostrar seu veneno. Ilude sempre os fracos, investe nos mais fortes. Ela sempre está à solta, mostrando sua sorte.

Continua depois da publicidade

Rotina fez da mente um lugar pouco visitado, deixam doce, tragam doce, pra tirar o amargo. Mas amarga é sensação que te faz flutuar, pura ilusão de ótica para te afundar Tá fácil ignorar os problemas atuais, heróis da wikipedia pagando de intelectuais

Tem guerra! Tem fome! Fecha a página do face que isso some

Lindo é ficar louco, torrar os neurônios, sorrisos ao vento, abrindo porta aos demônios Ritmo acelerado pra arrumar encrenca. Copo quebrado, olha a morte na sua forma violenta

Eu observo toda a criação de doenças, pra vender a cura testando em sua inocência

A menina acha lindo ser vulgarizada, mexe a bunda linda pra ser valorizada

Falta de informação, não sei confere, não tem comida em casa mas tá na internet

Tá tudo lindo né, mas não é real, volta pro mundo do prumo, sai do surreal.

Geração que lança, lança perfume, neurônios a mil, placas de não perturbe.