Aprendi muito cedo que o Papai Noel poderia ser um maluco qualquer. Minha família sempre foi visitada pelo bom velhinho. Primeiro, no dia 24 à tarde, na cidade de Braço do Norte, ele aparecia de pé na carroceria de uma caminhonete, cercado de crianças e distribuindo balas e pirulitos, ao som de um Jingle Bells ou Noite Feliz qualquer.

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Depois ele vinha novamente à noite, dessa vez uma visita exclusiva, na casa dos meus avós, na mesma cidade. Com o tempo percebi que ele mudava a cada ano, no começo era um Papai Noel que vinha do Polo Norte, mas era muito parecido com o meu avô, usava até uns óculos iguaizinhos. Depois passamos a receber visitas de um bom velhinho magrão, quer dizer, ele tinha uma barriga estranha, que saía do lugar quando alguém sentava no seu colo. Era um Papai Noel que bebia todas, tinha sempre um copo de cerveja na mão. Era o mais divertido de todos, pelo menos a gente ria muito das piadas que ele contava. Só a minha prima que insistia em dizer que aquele era seu pai. Mas as tias tratavam de esclarecer que o tio tinha ido comprar cerveja. A conclusão que eu chegava era que ambos gostavam muito da bebida.

No dia seguinte a gente ia até Grão Pará, ali do lado, e almoçava com os outros avós e uma família muito grande. Lembro de raros amigos secretos organizados por lá, com a participação de cerca de cem pessoas. Uma farra! A revelação do amigo com um círculo formado por tanta gente, com uma pessoa falando no meio, tinha algo ritualístico que me fazia gostar do Natal.

Aquelas festas em Braço do Norte terminaram quando meu avô decidiu ser Papai Noel lá no céu e o tio bebum já não frequentava os natais da família. Os primos e eu já estávamos na idade de achar tudo um saco. As festas foram transferidas para Florianópolis e alguém sempre resolvia deixar a TV ligada ou repetir o CD da Simone à exaustão; anos depois era o DVD do André Rieu, que apesar de ser menos chato que a Simone, deixava algumas pessoas em estado vegetativo em frente à televisão, confirmando o tédio da noite santa.

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Momentos de oração em torno da mesa, com a família de mãos dadas, valiam a festa.

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Correria de final de ano, agito em torno das compras, decoração vista do carro em velocidade reduzida.

Reunir uma família na noite de 24 de dezembro nos dias de hoje envolve supermercados lotados, trânsito para chegar ao local da ceia, troca de presentes ou amigo secreto, ambos com o desconforto do presente errado, da pressa em tirar a foto e postar na internet, com cara de bobo, segurando o “presente mico”. Na falta de Papai Noel para mandar cartinha, as pessoas fazem lista do que querem ganhar de amigo secreto e não há surpresa. Melhor é garantir o presente certo, já que não há tempo nem para fazer a troca, afinal, no dia seguinte tem que pensar como será o Ano Novo.

Espere para ver mais fotos no celular, mais Facebook e Instagram. E depois ficam todos aguardando quem vai “curtir” na rede, enquanto poucos curtem o que está acontecendo ali na festa. E tem que desejar Feliz Natal para os amigos online, bem na hora da ceia. A coisa é tão maluca que há um caos na telefonia, ligações que não se completam e rede ainda mais lenta.

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Como a reunião é algo quase que obrigatório para quem tem família, tenho praticado a experiência do “Natal fora de época”, que consiste em fazer o encontro uma semana antes ou depois. O que no começo parecia algo inadmissível para mães e sogras, mostrou-se uma chance de reunir as pessoas num momento mais descontraído, sem as pressões da data, do prato e do presente certo. A única obrigação no “Natal fora de época” é estar com a família e renovar o carinho. E se você marcar depois do dia 24, ainda pode comprar o presente com desconto! Feliz Natal!