
O ano é 2025. O local Joinville, nome que significa “Cidade (Ville) da União (Join)”. Se os moradores de Joinville soubessem a importância do significado desse nome para o destino da cidade, talvez esta história tivesse ocorrido alguns anos antes…
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São nove horas da noite e Isabella está no salão de celebrações do grande Teatro Cau Hansen, que foi recentemente ampliado e modernizado para sediar mais uma edição do internacionalmente conhecido Festival de Dança de Joinville. Nos últimos 30 minutos ela vivenciou momentos memoráveis: assistiu à primeira performance mundial de um casal de bailarinos contracenando com um robô autônomo, testemunhou o fechamento de um negócio bilionário e brindou o aniversário de cinco anos do programa que uniu as forças locais em torno de uma causa comum para o futuro da cidade.
Tudo isso em 30 minutos na cidade que já foi conhecida como a “Manchester” brasileira, em referência à cidade inglesa, símbolo da chamada 1ª Revolução Industrial.
Isabella é advogada especializada em direito internacional e está particularmente satisfeita porque acabou de liderar o fechamento de um negócio espetacular do ponto de vista econômico, estratégico e tecnológico para a cidade, para o Estado, para o Brasil. Uma empresa de tecnologia em robótica de Joinville fechou acordo para fazer parte de uns dos maiores grupos de automação e tecnologia de informação do mundo.
Ocorre que a empresa não será absorvida, ela será a nova sede mundial de inovação em robótica para todo grupo, que fatura mais de 10 bilhões de dólares no mundo todo. É uma conquista impressionante para Joinville, Santa Catarina e Brasil como um todo. Quem comemora junto com Isabella é o fundador da empresa, Lucas, que criou a startup há menos de cinco anos com um conceito inovador e absolutamente relacionado às características da cidade: aliar Arte e Tecnologia. Assim nasceu o simpático “JoinV”.
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Mas antes de entender como arte e tecnologia foram tão importantes para um negócio tão estratégico, é fundamental destacar que a empresa multinacional já atua em Joinville há mais de três anos com soluções para indústria 4.0, tema que tornou a cidade conhecida como o principal laboratório nacional e um dos principais polos do mundo na área.
Empresas do Brasil e do exterior vêm conhecer as práticas da chamada quarta revolução industrial que estão sendo aplicadas em empresas de diversos setores como fundição, linha branca, sistemas eletroeletrônicos, tubos e conexões, têxtil e uma infinidade de setores tradicionais “industriais” que estão aplicando as mais modernas práticas tecnológicas e de gestão para tornar suas indústrias mais competitivas e sintonizadas com as tendências mais recentes da economia e inovação.
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Isabella é uma advogada que já trabalha para diversas destas empresas e faz parte de um grande cluster de serviços especializados em finanças, negócios, suporte jurídico e outras competências tão fundamentais para o fortalecimento do cluster industrial.
Voltando ao Teatro, comemorando junto com Isabella e Lucas, estão o jovem russo Yuri e a amazonense Madalena. Yuri e Madalena são estrelas do Balé Bolshoi de Joinville, única unidade da famosa Escola fora da Rússia, cuja presença foi essencial para fortalecer a estratégia da cidade para se tornar a capital cultural da dança no Brasil. O que ninguém imaginava é que em algum momento a experiência bem-sucedida da área de dança pudesse se integrar à robótica e virar um negócio industrial, econômico e tecnológico mundial. Mas isso aconteceu.
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Lucas teve a genial ideia de utilizar os movimentos dos bailarinos e estudar cada um dos seus passos para, com um sistema de inteligência artificial, ensinar o robô “JoinV” a aprender como ser cada vez mais maleável, flexível e ágil. Os robôs de sua empresa são como bailarinos, que se movimentam utilizando sensores e atuadores para executar as funções mais complexas e inimagináveis. É um verdadeiro balé tecnológico industrial artístico!
Essa inovação despertou tamanha atenção por parte da imprensa e do setor empresarial que, na semana seguinte ao lançamento, atraiu investidores e especialistas de todo o mundo para conhecer a empresa e começar os primeiros testes com o robô bailarino e, principalmente, para avaliar se a tecnologia de integrar inteligência artificial com movimentos humanos complexos poderia ser aplicada em outras áreas da robótica, da automação, realidade virtual, dos games, entretenimento e medicina.
A conclusão foi impressionante, a tecnologia do JoinV funcionou plenamente para todo um campo de tarefas complexas que exigem precisão cirúrgica, capacidade de agir rápido e executar movimentos que parecem desafiar as leis da física. Yuri e Madalena não compreendiam muito bem quando foram equipados com milhares de sensores e se plugaram a um sistema computacional que monitorou toda uma performance de A Dança do Cisne, repleta de movimentos extremamente complexos, velozes, ágeis, rígidos, pesados, permitindo ao sistema de inteligência artificial a geração de um algoritmo completamente inovador, resultado de uma experiência real que une a capacidade física com a sensibilidade artística, a intuição e a razão, competência emocional e atlética, sonho e pragmatismo, precisão e expressão. Depois disso, JoinV foi desenvolvido e testado em parceria com técnicos em laboratórios do Silicon Valley, Israel, Japão e Alemanha.
Criar uma empresa como esta não é fácil. Exige um ambiente especial. Foi isso que começou a se consolidar há cinco anos quando as forças da sociedade decidiram, de uma vez por todas, unir esforços e fazer valer o nome da cidade. Universidades esqueceram diferenças. Empresários passaram a cooperar. O setor público se tornou referência em gestão e aplicação de novas tecnologias. Lideranças comunitárias passaram a dialogar de forma cada vez mais franca e construtiva com o setor empresarial. Investidores nacionais e internacionais passaram a acreditar nas empresas da região. Famílias tradicionais começaram a investir em startups. Em suma, a cidade acreditou que era possível e… se uniu.
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Então foi assim. Este era o segredo dessa noite especial e diferente: gente especial e diferente. O grande salão do Teatro Cau Hansen está repleto desse tipo de gente: empreendedores tecnológicos inovadores, executivos de diversas empresas industriais e de serviços, nacionais e multinacionais, profissionais especializados de todos os cantos do mundo, investidores, dirigentes públicos, pesquisadores e artistas.
Uma mistura típica de uma cidade que se tornou talvez uma das mais cosmopolitas do Brasil, com empresas da China, Singapura, Estados Unidos e da Europa, interagindo com profissionais desses e de outros países, com empreendedores e trabalhadores extremamente qualificados, formados, especialmente, nas excelentes escolas da cidade. Mais do que se tornar um laboratório piloto da indústria 4.0, Joinville se tornou, a “Cidade 4.0”. Uma cidade moderna, global e sustentável, com arte, indústria, negócios, comércio, tecnologia e serviços de ponta. Pois é, parecia impossível, mas a Manchester virou Londres.
* As "Crônicas de um futuro possível foram concebidas pelo autor para provocar a reflexão acerca de temas que se fundamentam em fatos e dados da realidade atual para explorar novas possibilidades e alternativas de futuro que estimulem e promovam a geração de novas ideias, mudanças de comportamento, conceitos criativos, tecnologias inovadoras e visões de futuro diferenciadas e inspiradoras.
José Eduardo Azevedo Fiates é diretor de Inovação e Competitividade da Fiesc e superintendente geral da Fundação CERTI.
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