Como muitas crianças de sua idade, Eduarda Ludwig Rubim, cinco anos, é fã da novela Carrossel. Entre brinquedos, álbum de figurinhas e revistas temáticas, ela guarda com carinho as bonecas das duas personagens preferidas, a meiga Carmen e a arrogante Maria Joaquina. Na trama carregada de estereótipos exibida na TV, a menina rica despreza e ofende, inclusive com tons racistas, seu colega Cirilo, um garoto negro e de família humilde. Mesmo com todas as deficiências de caráter, a personagem caiu no gosto infantil. Mas, afinal, faz bem incentivar estas brincadeiras?

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No quarto de paredes cor-de-rosa com estampa das princesas da Disney, Eduarda solta a criatividade para recriar os conflitos das duas personagens e inventar suas próprias histórias. Acompanhada de perto pela mãe, a psicopedagoga Patrícia Ludwig, 35 anos, a menina usa a boneca “do bem” para dar lições à malvada e projeta cenas do cotidiano na brincadeira.

– Às vezes, ela não gosta de algo que a gente diz, e aí isto aparece na brincadeira – explica a mãe, que deu a boneca Maria Joaquina para a filha.

Para Patrícia, é importante ficar de olho no passatempo da filha para entender os conflitos que a menina não externa e ajudar a resolvê-los.

Professora de Psicologia da Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Tânia Ramos Fortuna afirma que a brincadeira favorece a saúde mental das crianças:

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– É às avessas, lidando com personalidades socialmente reprováveis, que elas elaboram as características do próprio ser.

A brincadeira ainda permite que as crianças entendam suas angústias pessoais e determinados sentimentos, que são inatos ao ser humano, mas inadequados socialmente. E é desta maneira que elas aprendem a equilibrar os impulsos. Por isso, os adultos devem aproveitar a emergência destes comportamentos para alertar sobre o que é socialmente válido.

– Vivenciando a maldade nas brincadeiras, as crianças saciam sua curiosidade – diz Tânia.

Portanto, não há razões para se preocupar quando sua filha decidir reunir suas vilãs de plástico para o chá da tarde. A pequena Eduarda indica que há consciência para diferenciar o bem do mal.

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– Eu acho errado a Maria Joaquina maltratar o Cirilo, mas é que às vezes ele fica chato. E no fim, acho que ela vai ser legal – sentencia a menina.