Rufem os tambores, o urso voltou a beber água no pote de jade: o poeta, romancista e pintor Fernando José Karl dá a lume a exposição “Jazz, Bruto”. Um bambu entre a chuva e o vento tanto verga quanto dança, tanto escuta quanto canta. E foi da raiz das tempestades que se fez esse retorno à pintura de Fernando Karl. Vinte anos depois da sua exposição inaugural, “Balneário Badgerd”, quando estreou pelas mãos de ninguém menos que Marina Mosimann, seu regresso aos pincéis é uma grande notícia de outono.

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Nesse tempo, ganhou um filho, perdeu a mãe, publicou novos livros. Exilado em seu retiro são-bentense, Fernando emite, amiúde, cerejas verbais tingidas dessa “sulitude” que nos une e isola simultaneamente. Nessas duas décadas, tem sido um criador que lateja sem trégua. Com seus poemas e imagens, muito mais que povoar o mundo, cria o mundo.

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Criador de mil e uma faces, tudo que toca freme, gravita, engravida e ganha vida, como obra do sopro sobre o barro inerme no Sexto Dia da Criação. E ele distribui as tintas como se benzesse, espargindo gestos de prior sobre a tela, mas também com o cuidado de quem faz um curativo. Toda arte ocupa sempre o lugar de uma ferida exposta. Fernando pinta os tempos intuídos, devassados a plenos pulmões para o infinito, no avarandado da casa antiga da vó Ana. E o Paraíso lhe pertence, pois nada retém ou acumula à sua passagem pelo jardim das sensações. Na sua generosidade, nada pretende para si, nem a mão beijada da mãe ou mesmo os afetos de ser pai. E se declina de colher desse pomar que a nós anima e a todos irmana; é que tem fomes mais sutis e para além de humanas.

Sua verve suaviza ao fervor da música intempestiva, sensual e inaudita: eis o traço, a curva e a linha. Eis o homem em seu ofício, no alarde luxuriante das cores, no bailado bruto do ofídio, no bote fatal do pincel-coral e sem antídoto.Sua pintura não guia à arte do encontro, nem desvia do gérmen da despedida. Não se vê no seu léxico cromático o homem espicaçado pelo comezinho da vida. A cor é sua pátria e a língua de seus poemas silenciados pela tinta sobreposta jaz para sempre como o magma resfriado que forma a rocha.

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“Jazz, Bruto” será aberto nesta sexta-feira, às 20 horas, na Galeria 33.