Dados do Ministério do Trabalho mostram um cenário surpreendente em Joinville em relação à geração de empregos em 2014. À primeira vista, eles parecem indicar que a indústria está em queda, dando espaço para o setor de serviços. Mas não é bem assim.

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De fato, os números apontam que o setor de serviços teve, no último ano, uma elevação acentuada no saldo de vagas, de 76%, em relação a 2013. Os últimos dados do produto interno bruto (PIB), referentes a 2012, revelam que a atividade, pela primeira vez, passou a representar mais da metade da soma das riquezas produzidas na cidade. É como se os serviços estivessem subindo a ladeira, enquanto a indústria de transformação faz o caminho oposto – fechou 927 postos, um baque em comparação às 2,4 mil vagas geradas em 2013.

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Mas os números não conseguem precisar quem está contratando os serviços em ascensão. O setor inclui uma gama de especialidades voltadas ao consumidor final, comércio e indústria. Isto acontece com a função que mais gerou postos de trabalho no ano passado dentro do setor de serviços, a de auxiliar de serviços gerais. Os profissionais destas empresas especializadas em limpeza interna e externa prestam serviço para estabelecimentos comerciais e indústrias.

Os números também revelam que uma função bem característica da manufatura, a de alimentador de linha de produção (ou operador de produção), aparece dentro da estatística de serviços, e em posição de destaque, com a quarta maior geração de vagas.

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Por lei, atividade-fim não pode ser terceirizada. Os funcionários devem fazer parte do quadro das indústrias. Porém, os mesmos dados indicam um alto índice de desligamentos por término do contrato de experiência ou de regime temporário e, enquanto não são efetivados, os profissionais ainda estão ligados à empresa de serviço de recrutamento, embora estejam trabalhando dentro da fábrica.

Fatores

O secretário de Desenvolvimento Econômico de Joinville, Jalmei Duarte, se surpreendeu com os dados porque não identificou nenhum boom em serviços, como o que aconteceu há quase uma década, com a chegada de empresas de call center à cidade. Para ele, uma série de fatores, como a própria terceirização de serviços, pode acabar mascarando os dados da indústria.

Na visão do vice-presidente da Federação da Indústrias do Estado de SC (Fiesc), Mário Cezar de Aguiar, o modelo econômico que incentivou o consumo por meio do acesso ao crédito, redução de taxas de juros e a maior redistribuição de renda é o principal motivo do crescimento do setor de serviços.

De acordo com o gerente de recrutamento e seleção da RH Brasil, Joanir Schadeck, é preciso avaliar aspectos que vão além da queda da atividade industrial. Para ele, o que se observa é uma especialização crescente de funções, cada uma focando naquilo que representa a essência do seu negócio. Com isso, serviços de apoio, como o de aluguel ou manutenção de empilhadeiras, por exemplo, ficam para empresas dedicadas. Outro fator, segundo ele, é a importação de produtos quando a fabricação local não é competitiva, o que requer providenciar serviços especializados. No quadro geral, o número de vagas em Joinville caiu quase 25%.

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– A indústria encolheu um pouco, mas Joinville ainda é uma cidade fortemente industrial.

A RH Brasil ilustra o processo de especialização. Ela consolidou em 2014 os investimentos para diversificação dos negócios. Hoje, são três empresas com administrações separadas e especializadas, que vão do recrutamento a promoção de vendas.

“É difícil separar indústria e serviço”

O presidente do Sistema Fiesc (Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina), Glauco José Côrte, considera que é preciso olhar para a indústria e o serviço de forma conjunta. Para ele, é cada vez mais evidente a integração entre esses dois setores. Muito do que se fazia na indústria, afirma, tornou-se um serviço especializado, como a logística e o transporte. Confira alguns trechos desta entrevista concedida a Negócios & Cia. em que ele analisa o tema em âmbito global:

Dia a dia

A produção do motor é industrial, mas a montagem pode ser serviço, se for feita por um terceiro dentro da fábrica, então é dificil separar indústria e serviço. Esta é uma tendência mundial. Quando uma empresa abre um centro de distribuição, é indústria ou serviço?

Desenvolvimento

A recuperação da economia passa pela indústria e o próprio serviço se desenvolve por demanda mais da indústria do que por outros fatores de produção. Serviço diz respeito geralmente a empresas pequenas, como consultoria, e com poucos empregados. Na indústria, o portfólio é mais amplo.

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Tendência

No Brasil, o desenvolvimento do setor de serviços é precoce se comparado com países como Alemanha e Coreia, e a qualidade dos serviços não tem ajudado a competitividade do setor industrial. Um fator importante que vem ocorrendo é a importação de serviços, não só de máquinas. O País vai buscar design no exterior, contrata especialistas na área. Há muitos segmentos que contratam serviços para manter a especialidade.

Cenário mundial

O setor de serviços participa da formação do valor adicionado de diversas economias, inclusive no Brasil, onde passou de 53% em 1990 para 68% em 2012. Já em Santa Catarina, onde a indústria continua com participação na economia bastante acima da média nacional, os serviços representavam 58% em 2012. Na Alemanha, os serviços representavam 62% do valor adicionado em 1990 e também ganharam participação. Mas o crescimento foi menos acelerado do que no Brasil, e a participação chegou a 67% em 2012. Atualmente, estima-se que os serviços representam 65% do valor adicionado dos produtos finais nos países industrializados e permeiam a atividade industrial de duas formas: impactam diretamente nos custos de produção e comercialização e na agregação de valor. A primeira abrange aspectos como a logística, infraestrutura e serviços financeiros. A segunda envolve a diferenciação dos produtos e customização, características que elevam o preço de mercado do bem e aumentam a produtividade do trabalho.

Forte relação

Os dados mostram que mais de 80% da receita líquida do setor de serviços, tanto no Brasil quanto em Santa Catarina, têm forte relação com a indústria. Destacam-se os serviços de informação e comunicação, serviços profissionais e transportes.