A CPI dos Alvarás da Câmara de Vereadores de Florianópolis conseguiu nesta quarta-feira a justificativa que buscava para avançar sua investigação além do segundo semestre de 2012. Em depoimento da ex-funcionária da prefeitura Rita de Cássia Stotz, obteve a indicação de que os dirigentes da secretaria Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano na gestão passada puxaram para sua responsabilidade a aprovação de prédios e empreendimentos comerciais que deveriam ser analisados pelo corpo técnico da prefeitura, como manda a lei.

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Aposentada desde o início do ano passado, ela confirmou que teve processos em análise pedidos pelo então secretário, José Carlos Rauen, e que passaram a ser deliberados apenas por ele durante o período que trabalhou ali. Anterior a 2012.

– Houve um caso em que ele pegou o projeto e aprovou, o secretário Rauen. Em algumas vezes ele aprovou nosso parecer técnico, em outras não. Nem sempre para um lado, nem para o outro. Às vezes achava rigoroso demais e às vezes de menos. Nas vezes em que não concordava com o parecer negativo, ele tomava o processo para ele – disse a funcionária que trabalhou durante 32 anos na secretaria.

Ela trouxe à comissão documentos para comprovar que não aprovou o alvará apontado como com problema na análise da prefeitura. Sua análise técnica foi feita enquanto ainda estava ali, mas a liberação foi dada pelo comando da secretaria. Perguntada se o parecer era contra ou a favor da construção, alegou não se lembrar de qual tinha sido a sua posição à época e nem se o alvará o contrariava. Preferiu apenas provar que não tinha nada a ver com isso para a CPI.

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De acordo com Rita, o que deve ser considerado para a emissão de um alvará não permite margem de interpretação. A análise seria sempre baseada na legislação e segue procedimentos descritos e enumerados ali, sem permitir duas respostas diferentes para o mesmo caso.

– Ela relatou interferências diretas e constantes no trabalho técnico, inclusive feitas na informalidade porque não constam nos processos. Houve ali um outro tipo de solução que não foi a técnica – disse o presidente da CPI, Afrânio Boppré (PSOL), que afirmou que o depoimento de Rita mostra a necessidade de investigar também os alvarás emitidos antes de 2012.

Uma análise sobre os alvarás emitidos no segundo semestres de 2012, realizada pela prefeitura no início da atual gestão, mostrou que em apenas 180 dias, a secretaria emitiu quase 150 alvarás. Média de 1,2 dia por análise. De acordo com os depoimentos, a análise técnica para a emissão de um alvará leva de cinco a quinze dias em média. O fato motivou a criação da CPI, já que vários desses alvarás não estariam de acordo com a legislação.

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O retorno das atividades da CPI dos alvarás nesta semana começou a ouvir os depoimentos dos analistas de projetos que deram os pareceres técnicos sobre os alvarás em que foram identificados problemas. As primeras quatro entrevistas foram com servidores mais antigos do quadro de funcionários da secretaria, em que poucos problemas foram encontrados na reanálise dos alvarás emitidos no segundo semestre do ano passado.

Os vereadores integrantes da comissão buscaram coletar informações para o depoimento mais esperado, do ex-secretário de meio ambiente, marcado para o dia 29. As entrevistas com os funcionários prosseguem durante esta semana, com mais audiências nesta quarta e quinta-feira. O foco neste primeiro dia foi em ouvir os funcionários mais antigos da secretaria.

As inquisições dos membros da CPI, constatadas nesta e na sessão da última semana, tem apontado em três direções: averiguar se houve pressão para aprovação de alvarás pelos técnicos, se havia alguma forma de suborno para a aprovação de determinado empreendimento, em especial os de maior volume, e se esse suposto comércio de álvaras se tornou uma prática corriqueira dentro dos processos que liberavam as construções na Ilha.

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– É um número grande para esse período – disse com Kazuo Matsumoto, um dos depoentes, que destacou que o trabalho é realizado por apenas sete pessoas, das quais três devem se aposentar em breve.

O funcionário é um desses três. Com 34 anos de prefeitura, relatou que quando começou a trabalhar ali, em 1979, dividia a carga de trabalho com outros 16 engenheiros. O passar dos anos aumentou o trabalho e reduziu a equipe, que agora não conseguiria nem se enxergar do outro lado da bancada por causa da pilha de processos, que segue aumentando.

Apesar das declarações isoladas que apontam para indícios de irregularidades, os depoimentos foram mornos e revelaram mais um descontentamento geral com o sucateamento da equipe que trabalha com a análise de novos projetos de construção civil em Florianópolis. Além dos dois depoentes citados, compareceram para esclarecer detalhes à CPI os funcionários Doralina Gonçalves, 25 anos de trabalho na secretaria, e Eduardo Gonçalves, 28 anos no órgão.

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O Diário Catarinense tentou entrar em contato com o ex-secretário José Carlos Rauen em ligação para seu celular, mas não conseguiu resposta até o fechamento desta matéria.