O coronavírus botou o planeta de joelhos. A verdade é que todo mundo – e todo o mundo – está com medo. Parece estranho, mas não existe nada de anormal em sentir medo. Pelo contrário, dizem os especialistas no assunto. Trata-se de um sentimento importante para o ser humano, pois através dele testamos a nossa capacidade de reconhecer limites e de como agir diante das realidades.

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O problema é quando esse medo se intensifica, vira pânico e gera uma paralisação que pode travar a pessoa e/ou provocar uma histeria. Ainda mais em um país como o Brasil, o qual, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, é o mais ansioso do mundo. A observação é do psicólogo sistêmico individual João Meireles.

Para ele, em termos de saúde mental o coronavírus chega como uma onda que não temos como impedir. No país que vibrou com os títulos mundiais de Gabriel Medina (duas vezes), Adriano de Souza e Ítalo Ferreira, entre 2014 e o ano passado, a questão está em como cada um busca a forma de surfar a onda. Alguns cuidados podem impedir que ela nos leve para um lugar qualquer, do qual será mais difícil sair depois que o mar serenar.

É preciso pensar que tudo tem solução, assim como entender o momento que atravessamos. O sentimento de angústia é normal e decorre da nossa incapacidade em não conseguir saber o que vai acontecer – diz o psicólogo.

No caso da pandemia, o medo se configura em uma ameaça a própria pessoa ou a alguém a quem ela ama. Isso faz com que muitas vezes se coloque a probabilidade como uma verdade e isso gera o estresse.

– Todos nós sabemos que um dia vamos morrer. Mas nem por isso se deve ficar pensando que vai acontecer no momento seguinte, o que nos jogaria em um colapso – compara Meireles.

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Mas como não ficar sob o domínio do pânico diante de tantas notícias ruins? Filtrar as informações é um bom começo, diz o psicólogo. Meireles sugere ser necessário buscar sites confiáveis e reportagens com profissionais de saúde capacitados, assim evitando notícias falsas e alarmistas. É prudente também evitar ficar o tempo todo conectado ou com a TV ligada. Para ele, descobrir formas de tornar o confinamento mais agradável é também cuidar da saúde mental.

– É preciso viver o tempo presente. Cada dia é um dia. Quem ficar no passado e não viver o presente está deprimido. Quem ficar no futuro estará ansioso.

Joice Cardoso do Nascimento, 45 anos, mora com a família no bairro do Rio Vermelho, em Florianópolis. Divide a casa com o marido, o cunhado e um sobrinho de 11 anos. Ela faz serviços gerais e estuda. O marido trabalha em uma empresa terceirizada e o cunhado é autônomo. Cada um tinha uma rotina, até a pandemia chegar a Santa Catarina:

– Estamos tentando enfrentar esta situação que é nova. A nossa família tinha outra forma de viver, cada um com seus horários e atividades. Agora, é uma outra realidade. Mas a gente entende ser importante e vai se adequando. Cada um tem que ceder um pouco. Estou aproveitando para organizar a casa, pois como trabalho fora tenho pouco tempo. Também tento estudar com o menino, ajudando ele nas atividades – conta Joice.

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Pensamento positivo e imunidade do corpo

Lorena Cascallana é mestre em psicologia clínica pela PUC de São Paulo. Para ela, preservar saúde mental é fundamental e significa pensar coisas boas. Aceitar o confinamento com resiliência é um passo importante.

– Não adianta ficar reclamando sobre coisas que não se pode fazer agora, como caminhar, tomar banho de mar, sentar no bar com os amigos. A queixa não faz nada além de carregar negativamente nossa saúde mental, o que também faz com que nossa imunidade abaixe – explica.

Lorena sugere uma comparação: assim como nosso corpo não pode ficar permanentemente na defensiva, a nossa mente não deve ficar presa a uma situação. Manter o bom nível vibratório ajuda os demais que também dividem o mesmo espaço de isolamento social. Brigas e tristeza não ajudam nunca, ainda mais em períodos em que a própria situação já gera coisas ruins e pode deflagrar situações de violências.

É preciso estabelecer rotinas de hábitos bons. É momento de olharmos para o que se está consumindo: comida, filmes, notícias, músicas. Tudo isso produz energia, energia produz pensamento e esse pensamento acarreta uma sensação que sendo boa irá ajudar o sistema imunológico – diz a especialista.

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(Foto: Diorgenes Pandini)

Pais precisam ajudar os filhos

As crianças também estão mexidas. Algumas podem não saber exatamente o que está acontecendo, mas percebem as rotinas das famílias estão alteradas. Sentem falta da rua, das brincadeiras com os amigos, ficam mais tempo do que o normal na internet. Estranham a presença constante dos pais, os quais normalmente trabalham fora e só as encontram à noite. Se para os adultos a adaptação de ficar em casa não é uma situação fácil de lidar, a “novidade” do Covid-19 também se faz um desafio para os pequenos.

O psicólogo João Davi Cavallazzi Mendonça, formado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e especialista em terapia familiar sistêmica, recomenda aos pais ou responsáveis ajudarem as crianças a compreender o que está ocorrendo. Porém, precisam lembrar que se trata de uma criança e que há determinado níveis de informações difíceis dela processar.

– Se a criança capta um ambiente de muito pânico em casa, pode aumentar a ansiedade dela, pois ainda não tem a capacidade de entender a complexidade da situação – explica o especialista.

Portanto, um cuidado especial que os pais podem adotar é blindar um pouco as crianças, por exemplo, evitando ficar com a TV ligada o tempo todo no noticiário contando número de mortes. Outra alternativa é deixar para conversar sobre alguma situação mais dramática em particular, quando a criança não estiver presente.

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– Às vezes, níveis muito altos de ansiedade aumentam também a ansiedade das crianças. Como elas não sabem lidar com este sentimento, manifestam-se de diferentes formas: não conseguem dormir, fazem birras, brigam com irmãos ou exigem a presença constante dos pais.

Se for necessário, busque ajuda

Se os pais conseguem compreender que a criança também pode estar debaixo da influência da ansiedade, do medo ou algum outro sentimento decorrente desta situação, será mais necessário ter mais paciência.

– Compreender melhor o comportamento da criança e até ajudá-la a nomear os sentimentos pode trazer algum alívio.

Por fim, lembra o psicólogo: se a situação ficar muito difícil, peça ajuda profissional. Há vários grupos de terapeutas e outros profissionais trabalhando por aplicativos de mensagens. Psicólogos cadastrados pelo Conselho Federal de Psicologia podem ajudar em atendimentos on-line para aliviar a tensão.

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Recomendações para manter a saúde mental

As sugestões abaixo são de OMS, Conselho Federal de Psicologia e dos psicólogos João Davi Mendonça, João Meireles e Lorena Cascallana:

Empatia é tudo nesse momento

A Organização Mundial de Saúde recomenda: Não existe nenhuma relação da doença com uma etnia ou nacionalidade. Demonstre empatia com todos os afetados em qualquer país. Evite julgamentos, críticas ideológicas, preconceitos. As pessoas infectadas não fizeram nada errado e merecem nosso apoio e compaixão, sejam brasileiros ou de qualquer parte do mundo.

Busque informações, mas não tanta

Excesso de informação causa ansiedade. Além disso, tem muita notícia falsa sobre o coronavírus. Evite ler qualquer matéria na internet e compartilhar coisas em suas redes se não souber a origem. Procure fontes confiáveis para se informar, como o site do Ministério da Saúde, da Secretaria de Saúde do Estado e da sua prefeitura da sua cidade. Dica de especialista: escolha um horário para acompanhar o noticiário, caso contrário, você passará o dia todo só pensando no assunto.

Divulgue notícias boas

Ajude a ampliar histórias positivas e úteis de pessoa que tiveram a Covid-19, como as experiências de pessoas que se recuperaram da doença. Tem uma delas que emocionou o mundo: a senhorinha de 95 anos que depois de internada numa UTI na Itália, um dos principais focos do coronavírus, recebeu alta. Notícias assim funcionam como um bálsamo diante da pandemia e enchem a gente de esperança.

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Crie uma rotina

Trabalhar em casa exige certa disciplina, se não a pessoa desconcentra. Estabeleça uma hora para acordar. Dentro do possível, capriche no café da manhã. Você iria trabalhar de pijama? Então siga o ritual do banho e roupa confortável. Ambiente organizado faz bem também para a cabeça, pois dá uma sensação de leveza. Outra coisa: não faça do home office uma desculpa para trabalhar mais horas do que o devido.

Na quarentena, faça terapia on-line

Muitos pacientes e psicólogos estão migrando para as sessões de terapia do consultório presencial para o online. Se está sentindo que é hora de contar com a ajuda de um profissional é bom não perder tempo: há plataformas disponíveis.

Tecnologia para se aproximar

Temos WhatsApp, Instagram e Facebook para nos comunicar. Um telefonema para um familiar ou amigo também pode ajudar a gente e o outro. Pense em quem pode estar mais solitário neste momento: pais mais velhos, avós, pessoas que moram sozinhas.

Aprenda a lidar com a solidão

O distanciamento social mostra que precisamos aprender a lidar com a nossa companhia. Aprender a ficar só é uma habilidade que temos que adquirir. Um esforço que nos tornará mais fortes, mais seguros de nossas ações e potencial depois que tudo passar.

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Dedique tempo para atividades que gosta

Sabe aquele hobby que não dava tempo? Chegou a hora! Ler, desenhar, pintar, cozinhar…

Pratique meditação

Sabe aquele ditado mante sã em corpo são? Ninguém precisa virar monge, mas a meditação pode ajudar a nos manter mais calmos e menos estressados. A internet tem muitos aplicativos guiados.

Estresse não diminui com álcool ou fumo

O momento é de estresse, mas cigarro, álcool ou outras drogas não ajudam. A longo prazo, eles pioram o seu bem-estar físico e mental. E que tal aproveitar a quarentena para tentar fumar ou beber menos?

Aplaudir faz bem

Reconheça o trabalho dos médicos, cuidadores e dos agentes de saúde que se empenham para salvar vidas. Você pode fazer isso indo até a sacada ou o portão da casa e participar dos aplausos que estão sendo organizados de forma espontânea. O gesto deixará seu coração mais leve.

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Atenção com as crianças

Pais nervosos, filhos ansiosos. Por isso, é importante manter a calma mesmo diante de uma realidade adversa. Não esconda da criança o que está acontecendo e conte para ela explorando a capacidade de entendimento. Se for difícil a palavra ‘coronavírus’, fale em ‘bichinho’. Aproveite para conversar sobre a necessidade de ficarmos em casa. É preferível enfatizar que todos estão unidos nos esforços para deter o vírus ao invés de discursos pessimistas e destrutivos. Seja criativo e lembre: as crianças aprendem muito com as brincadeiras. Assim como nos ensinam.

Paciência com os idosos

Este é um momento difícil de lidar com os idosos. Muitos resistem ao distanciamento social e não querem alterações de rotina. O isolamento pode causar mais ansiedade, irritação e estresse naqueles que enfrentam sinais de demência ou mesmo perda do cognitivo.