*Por Jane E. Brody
Enquanto o novo coronavírus, contra o qual atualmente não existe vacina, causa um caos econômico global, doenças e mortes, há outras infecções graves que são frequentemente ignoradas ou descartadas. Especialistas dizem que, antes das perturbações causadas pela Covid-19, a maioria dos pais americanos era diligente em manter as imunizações de seus filhos atualizadas, mas muitos outros rejeitaram vacinas prontamente disponíveis, seguras e eficazes que podem proteger seus filhos contra doenças letais.
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Um novo relatório, usando dados da Pesquisa Nacional de Imunização de 2014, escrito muito antes do surgimento do novo coronavírus, concluiu que mais de um terço das crianças nos Estados Unidos não recebe as vacinas recomendadas em tempo hábil, deixando-as vulneráveis às doenças evitáveis que podem se espalhar para outras pessoas que, por razões médicas, não podem ser imunizadas com segurança.
Os autores do novo relatório, publicado na revista "Pediatrics", escreveram que apenas 58 por cento das crianças de 19 a 35 meses estavam em dia com todas as imunizações recomendadas pelo Comitê Consultivo em Práticas de Imunização que os médicos participantes podem administrar gratuitamente às pessoas sem plano de saúde. Esse número não inclui as crianças que não estavam com as vacinas em dia durante o primeiro ano e meio de vida, quando as chances de consequências graves são maiores.
O comitê recomenda que as crianças sejam vacinadas contra 14 doenças potencialmente graves até os dois anos de idade.
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Como alguém que sofreu todas as infecções que agora podem ser prevenidas por vacinas, acredito que os pais que não as contraíram por terem sido imunizados deveriam saber que essas doenças podem ser muito piores do que eles imaginam. Aos oito anos, por exemplo, fiquei na cama por duas semanas com varicela e, apesar dos banhos diários de aveia, isso me deixou com centenas de cicatrizes que perduraram até os meus vinte anos. Pelo menos fui poupada de infecções letais que ocorrem nos pulmões e no cérebro.
Mas, no ano seguinte, contraí caxumba nos dois lados da cabeça e fiquei sem sono durante dias. Ainda assim, tive sorte. Sobrevivi à caxumba sem danos permanentes. O que não acontece com todas as crianças. Tenho um amigo não é capaz de gerar filhos porque a caxumba infectou seus testículos e o deixou estéril. A caxumba também pode causar inflamação ovariana, perda de audição e doenças potencialmente fatais como meningite e encefalite.
O sarampo está agora em uma ascensão precipitada. Mais casos de sarampo foram relatados neste país nos primeiros cinco meses de 2019 do que em qualquer outro ano inteiro desde 1992.
Durante todo o ano, segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, houve 1.282 casos confirmados de sarampo, resultando em 128 hospitalizações e 61 complicações graves, incluindo pneumonia e encefalite. Isso foi mais que o triplo do número de 2018. A maioria das pessoas infectadas não havia sido vacinada. Nos países desenvolvidos, um ou dois casos de sarampo a cada mil infectados resultam em morte.
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Desde 2000, a maioria dos casos de sarampo afetou crianças cujos pais se recusaram a vaciná-las contra a doença, conforme demonstrado em uma revisão de 18 estudos publicados.
Talvez você se lembre do surto nacional de sarampo de 2015 que se originou na Disneylândia entre crianças não imunizadas. As taxas de vacinação nas comunidades afetadas estavam bem abaixo dos números necessários para criar "imunidade de rebanho" e proteger indivíduos que não podiam ser imunizados com segurança.

A coqueluche, ou tosse convulsa, também está aumentando de forma generalizada e assustadora, tanto em casos como em mortes, especialmente na última década. Em 1976, houve apenas 1.010 casos relatados. Mas em 2012, o ano de pico mais recente relatado pelo CDC, houve 48.277 casos (o maior número desde meados da década de 1950) e 18 mortes, quase todas afetando bebês. Metade dos bebês com coqueluche requer hospitalização.
Vou poupá-lo de mais exemplos angustiantes de complicações que podem acompanhar doenças evitáveis por vacina. Basta dizer que os profissionais de saúde precisam fazer um trabalho melhor para vencer a resistência dos pais que recusam imunizações recomendadas para os filhos. Enquanto os críticos das vacinas existem desde que estas surgiram, o problema da resistência generalizada neste país começou com um documentário de 1982 alegando que as reações adversas causadas pela vacina contra difteria-tétano-coqueluche minimizavam seus benefícios.
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Então, 25 anos depois, o movimento antivacina foi ampliado por um relatório falsificado e posteriormente desacreditado, sugerindo que a vacina contra o sarampo, a caxumba e a rubéola estava causando uma epidemia de autismo. O aumento da resistência à vacina decorreu da preocupação dos pais de que a administração de várias vacinas ao mesmo tempo a crianças muito pequenas era perigosa, apesar de especialistas garantirem o contrário. Como uma especialista, Chephra McKee, me disse: "Aplicar vacinas significa ter de levar os bebês ao médico ou à clínica várias vezes, perfurando-os repetidamente e expondo-os desnecessariamente a crianças doentes que estão na sala de espera."
Então, o que pode ser feito agora para melhorar as taxas de imunização? McKee, doutora em farmácia do Centro de Ciências da Saúde da Universidade de Tecnologia do Texas (Texas Tech), quer que os profissionais de saúde sejam mais abertos e dispostos a falar com os pais sobre as preocupações destes em relação às vacinas. Segundo ela, os pais frequentemente dizem: "Ninguém quer saber o motivo pelo qual reluto em vacinar meu filho."
Para os pais preocupados com a segurança das vacinas, McKee explicou que os profissionais de saúde devem educá-los sobre os benefícios das imunizações e os riscos envolvidos na recusa em vacinar as crianças.
No estado de Nova York, a taxa de isenções de vacinação escolar por motivos religiosos aumentou bastante entre 2000 e 2011, segundo um estudo publicado na "Pediatrics".
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Embora as razões religiosas sejam responsáveis pela maioria das recusas a vacinas, o aumento drástico dessas reivindicações de isenção sugere que a liberdade religiosa é frequentemente usada como uma "brecha nebulosa" para contornar os requisitos escolares de que as crianças sejam imunizadas, escreveram McKee e Kristin Bohannon no "Journal of Pediatric Pharmacology and Therapeutics".
O dr. Saad B. Omer, diretor do Instituto de Saúde Global de Yale, disse que deveria haver procedimentos administrativos mais complexos para reduzir o número de pais que se recusam a imunizar seus filhos por razões não médicas.
Ele sugeriu em uma entrevista que, antes que os pais possam reivindicar tal isenção, eles deveriam ser obrigados a assinar um formulário mostrando que um médico os aconselhou sobre os riscos de rejeitar imunizações não apenas para seus filhos, mas também para sua comunidade. "Os pais devem fornecer evidências de que sabem o que estão fazendo e reconhecer as implicações das isenções de vacina", completou Omer.
Omer também sugeriu que os médicos deveriam ser mais bem treinados em como comunicar informações factuais sobre vacinas aos pais céticos e que o aconselhamento sobre vacinas deveria ser coberto pelo plano de saúde.
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