*Por Alexandra Stevenson
Hong Kong – A sala de espera do hospital estava cheia de mulheres usando trajes de proteção caseiros e com o cabelo bem escondido em toucas de banho. Capas de chuva estavam fechadas sobre os casacos. Todas elas, ansiosas e grávidas durante o surto de coronavírus, esperavam horas para ver o mesmo médico.
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“Não me sinto à vontade”, disse Vigor Liu, que está grávida de cinco meses de seu primeiro filho. Depois de esperar por três horas, Liu finalmente viu o médico para uma breve conversa de dez minutos. O conselho dele: pare de ler as notícias.
À medida que a China lida com a epidemia que atingiu mais de 80 mil pessoas e matou quase três mil, as grávidas dizem que o já sobrecarregado sistema de saúde do país começou a deixá-las de lado.
Enfermeiros e médicos foram retirados de suas funções e enviados para centros de crise, e mais de mil hospitais foram destinados a pacientes com coronavírus. Hospitais comunitários menores que oferecem obstetrícia e serviços ginecológicos estão temporariamente fechados por causa da escassez de pessoal.
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O rápido desvio de recursos deixou muitas futuras mães com dificuldades para obter acesso ao pré-natal básico geralmente fornecido nessas instalações, muitas vezes a primeira e única parada de uma gestante para atendimento médico na China. Relatos na mídia estatal mencionando mães infectadas que dão à luz aumentaram os temores de passar o vírus para os recém-nascidos, embora não haja uma indicação clara de que isso tenha acontecido.

As mulheres que deram à luz desde o início do surto também descrevem uma experiência solitária e às vezes aterrorizante de assistência médica limitada em hospitais com falta de pessoal. As novas mães não conseguem vacinar seus recém-nascidos porque cidades e províncias inteiras fecharam as clínicas. Os check-ups de bebês estão sendo adiados.
Especialistas dizem que a situação está prejudicando o grande esforço político nos últimos anos para que as chinesas tenham mais filhos, em meio a taxas de natalidade historicamente baixas e uma crise demográfica iminente.
Na cidade de Wuhan, o centro do surto, as gestantes enfrentaram a perspectiva assustadora de descobrir um lugar onde poderiam dar à luz. Os hospitais comunitários estão fechados, o transporte público da cidade está parado e ninguém pode sair por causa das regras de quarentena. Sem motoristas voluntários, as mulheres nem conseguiriam comparecer às consultas médicas agendadas.
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Uma rede de voluntários em Wuhan está tentando ajudá-las a encontrar hospitais que ainda ofereçam cuidados pré e pós-parto. O grupo – que inclui psicólogos e motoristas – está trabalhando com mais de 600 gestantes e novas mães dentro e fora da cidade, e oferece serviço 24 horas por dia para ajudar em emergências.

Recentemente, Jane Huang, de 40 anos, se encontrou com os voluntários. Ela tem um filho e está grávida de 17 semanas, mas o hospital distrital onde está registrada não está mais aberto a gestantes. Huang se preocupa com a ideia de que, se não encontrar um hospital em breve, nem ela nem seu bebê sobreviverão por causa de sua hipertensão e seus problemas renais.
“Eu me preocupo todos os dias com a possibilidade de meu filho morrer na minha barriga. Eu me preocupo porque, se houver um parto prematuro, ele não conseguirá sobreviver. Fico preocupada com os encargos financeiros se eu tiver de fazer diálise ou mesmo um transplante de rim. Receio que meu filho possa ter alguma anormalidade se vier ao mundo sem ajuda. Penso em muitas coisas todos os dias”, disse Huang por telefone.
Mesmo em tempos normais, a quantidade de detalhes burocráticos com os quais as chinesas têm de lidar antes de dar à luz pode ser desafiadora. Não há um sistema de cuidados primários funcionando na China, onde a cobertura pode ser limitada e já há escassez de médicos. As gestantes devem procurar um hospital que ofereça serviços de maternidade e se registrar para dar à luz lá. Algumas se registraram em hospitais que foram transformados em centros do vírus. Aquelas que podem pagar consideram desembolsar milhares de dólares para dar à luz em um hospital privado.
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Quem não pode pagar está à mercê dos hospitais públicos, a maioria dos quais está severamente sem pessoal. “Em geral, as pessoas estão ansiosas, e, se você está grávida, tem um conjunto extra de ansiedades”, disse Roberta Lipson, executiva-chefe da United Family Healthcare, uma cadeia de hospitais privados em várias cidades chinesas.

Lipson disse que a United viu que o número de mulheres que já havia planejado dar à luz em um hospital público e depois mudou de ideia – ou perguntou sobre a mudança para um hospital privado – aumentou. Cerca de 1.774 hospitais foram designados para gestantes infectadas pelo coronavírus. Esses são exatamente os hospitais que as grávidas que não estão doentes querem evitar.
A Comissão Nacional de Saúde da China disse aos hospitais que, se as gestantes forem registradas para dar à luz em um centro de tratamento de vírus recém-designado, eles devem “tomar medidas razoáveis o mais rápido possível” em relação a essas mulheres. Mas muitas delas dizem não ter certeza do que isso significa para sua situação: serão forçadas a dar à luz em um hospital designado para pacientes com coronavírus? Serão transferidas para outro lugar? Serão rejeitadas?
“Uma dificuldade é que diferentes hospitais usam diferentes plataformas para transmitir informações. Para as gestantes, encontrar informações sobre cada hospital, um a um, seria complicado”, disse Bin Tu, voluntário em Wuhan.
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