Entre lideranças do mundo todo, a COP 27, evento da Organização das Nações Unidas (ONU) para tratar das mudanças climáticas, terá também ao menos uma representante catarinense: a professora Regina Rodrigues, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Na avaliação dela, no entanto, a presença do Estado no evento ainda está muito distante do ideal e, para superar isso, é necessário diminuir o que ela chama de abismo entre a produção científica e a percepção da sociedade sobre o tema.
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A oceanógrafa da UFSC irá palestrar em uma sessão nomeada “Informações Climáticas para Tomada de Decisões”, em sua segunda participação no megaevento. Na COP anterior, a 26ª, em Glasglow, na Escócia, Rodrigues esteve presencialmente. Agora na edição sediada no Egito, em Sharm El Sheikh, ela vai falar em um painel online, transmitido pelo YouTube a partir das 4h (de Brasília) desta quarta-feira (9).
— Minha palestra vai ser sobre disponibilizar informação climática para a sociedade, porque nós, cientistas, criamos um monte de informação climática, mas elas não são acessíveis para poderem ser usadas por tomadores de decisão, pela sociedade civil e por formadores de políticas públicas.
— A Casan precisa saber, por exemplo, se precisa construir reservatórios de água. A prefeitura de Florianópolis precisa saber se vai aumentar o número de ressacas e tempestades, a erosão das praias. Nós, como cientistas, publicamos em locais que são pouco acessíveis para o restante da sociedade. A gente precisa diminuir esse abismo que existe entre nós — explica a pesquisadora.
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Regina Rodrigues é referência mundial no tema e foi reconhecida por isso pela mais recente edição do Prêmio Gulbenkian para a Humanidade, honraria que trata de iniciativas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. A professora foi premiada junto com outros 35 pesquisadores, sendo ela a única brasileira do grupo, que produziram o recente relatório do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC) sobre o processo de desertificação e degradação do solo em todo o planeta.
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Um capítulo editado por Rodrigues no documento trata dos riscos para a produção agropecuária agravados pela crise do clima, só um entre outros impactos que já afetam o Estado e deveriam colocá-lo ativamente na discussão climática, segundo diz a pesquisadora. Ela cita ainda como justificativa os eventos extremos cada vez mais recorrentes e intensos em Santa Catarina, como os ciclones.
A professora explica que, por ser um local especialmente impactado pelas mudanças, o Estado poderia ser hoje protagonista em uma discussão alçada justamente na COP 27: a de compensação climática.
— As mudanças climáticas são causadas pelo aumento da emissão de gases de efeito estufa. Os países ricos são os que mais emitiram, mas são os países pobres tropicais que sofrem mais com os impactos. A discussão agora é que os países ricos deveriam pagar por isso, colocando dinheiro em fundos, para ajudarem os países pobres a se adaptarem — afirma Rodrigues.
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Ela cita como exemplo o Fundo Amazônia, que reúne repasses da Alemanha e da Noruega para o Brasil, para a preservação do bioma amazônico, e deverá ser retomado por articulação do presidente eleito Lula (PT), convidado para ir ao Egito. A pesquisadora pondera, no entanto, que aportes deste tipo não se limitam ao governo federal, mas poderiam também ser levantados para o governo de Santa Catarina e também para os municípios catarinenses, desde que houvesse, claro, disposição em buscá-los.
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— Se a gente depender só do governo federal, é muito pouco. Existem eventos na COP para cidades, para prefeitos. É bom estar lá, você aprende a tomar medidas contra as mudanças climáticas, pode conquistar prêmios, ganhar fundos. Gostaria muito de ver, por exemplo, Florianópolis, que é uma cidade exposta e que tem a natureza como seu principal cartão econômico, participando mais ativamente. Isso reflete um pouco que não há uma pressão popular sobre os políticos — diz.
A professora afirma ainda que o Estado poderia tomar à frente na discussão do clima com investimentos em pesquisa e em desenvolvimento de novas tecnologias adaptativas às mudanças, o que já mobiliza também o setor privado em outros países.
— A China já viu isso e é hoje o país que mais investe em energia eólica e solar fotovoltaica. A Fapesc [Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina] poderia investir nisso, em estudo e desenvolvimento de tecnologias para Santa Catarina ser mais sustentável e resiliente. É uma oportunidade para o Brasil entrar na frente e sair dessa dependência do petróleo. Quem não entrar nesse trem, vai ficar para trás.
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