Após visitar cinco das 48 prisões de Santa Catarina, a coordenação nacional de acompanhamento do sistema carcerário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) classificou como vexatória a revista íntima aos familiares de presos e criticou a falta de investimentos de empresas privadas que cuidam da administração de penitenciárias.
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Os pontos foram destacados na tarde desta sexta em Florianópolis pelo advogado criminalista Adilson Rocha, de Minas Gerais, que preside a coordenação.
Ele fez elogios ao Estado no que trata do grande número de presos exercendo trabalho nas cadeias (57%), e pelo comando das unidades ser 100% exercido por agentes penitenciários.
A comitiva esteve em presídios e penitenciárias de Blumenau, Itajaí, São Pedro de Alcântara e Palhoça e irá entregar um relatório ao governador Raimundo Colombo na próxima semana.
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O grupo também foi formado por integrantes da comissão de assuntos prisionais da OAB/SC e não visitou a Penitenciária de Florianópolis, na Agronômica, que fica em área residencial e tem sido palco de fugas nos últimos meses.
Incluindo o regime aberto, há 18,2 mil detentos em SC.
Secretário da Justiça rebate
– Uma coisa é ir em cinco unidades e não conhecer as 48 que funcionam – disparou o secretário-adjunto da Justiça e Cidadania, Leandro Lima, avaliando que o presidente da comissão é um advogado criminalista e por isso não teria a neutralidade necessária para fazer a avaliação como por exemplo tem um juiz.
O secretário disse que o Estado não aprova a revista vexatória, mas que ela também tem papel importante para detectar a entrada de substâncias proibidas. Lima informou que houve a compra de 12 scanners que vão ser instalados em sete penitenciárias e nos cinco maiores presídios.
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Na Penitenciária de São Pedro de Alcântara, completou o secretário, o scanner está em fase de testes.
Novos equipamentos
Lima prevê a ativação de todos os aparelhos pela empresa responsável em até dois meses. Ele destacou o repasse de quatro aparelhos de raio-x, 18 portais de detecção de metal, 81 raquetes manuais e 35 banquetas pelo governo federal, num valor de R$ 554,6 mil que vão ser entregues até setembro.
Sobre a gestão privada, o secretário afirmou que os contratos estão sendo reavaliados e é um equívoco a comissão questionar a prestação dos serviços. Lima ressaltou ainda que o monitoramento eletrônico (tornozeleiras) vai atingir 400 presos em até dois anos.
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Entrevista: Adilson Rocha, presidente da Comissão Nacional do Sistema Carcerário da OAB
Quais os pontos que o senhor destaca nas prisões de SC?
Várias coisas preocupam. Quero iniciar com duas coisas boas: a gestão 100% feita por agentes do sistema prisional, algo inédito no Brasil e tudo de bom que SC tem. É preciso manter e fortalecer essa condição, esse é o caminho. O segundo ponto, a exemplo de Brasil, é o percentual de presos que trabalham. O Estado dá o exemplo ao inserir o preso na condição de pessoa e conceder a ele o trabalho remunerado e, em alguns casos, o estudo. É o maior percentual do país (57%) e pode melhorar muito ainda.
E os pontos preocupantes?
Temos vários entretantos. Número um: essa administração privada que é feita por empresas em que a sociedade paga R$ 3 mil/mês por pessoa presa. O que a gente espera da resposta dessa empresa é que haja uma contrapartida, um investimento mais forte em relação ao preso. Nessas unidades, todos deveriam estar trabalhando, estudando, recebendo atendimento médico, odontológico, assistência jurídica eficiente e isso não acontece. Encontramos deficiências altas no trabalho, no estudo e nas assistências médica e jurídica.
E sobre as condições físicas das prisões?
A estrutura física não é lá essas coisas, mas em comparação com o resto do Brasil ainda é um luxo. Quero destacar o interesse empresarial catarinense em dar o emprego. Isso não acontece nos demais Estados e vamos deixar moção de louvor aos empresários de SC. A mão de obra prisional é altamente vantajosa, que trabalha e não enrola.
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Como amenizar o problema da superlotação a curto prazo?
Isso tende a aumentar se não houver mobilização. É preciso melhorar o monitoramento eletrônico – ainda não efetivado – ferramenta importantíssima e altamente barata para desafogar o sistema prisional. É preciso que se acabe a revista vexatória nas visitas, uma vergonha, com crianças, idosos.
Mas nessa questão das revistas tem a questão da segurança…
Da forma rigorosa de SC não existe. Devem fazer com scanner, treinar agentes para observar os familiares dos presos. Hoje, na revista íntima a pessoa fica em pé, tem que ficar o bumbum pra lá, virar pra cá, depois tem que abrir as abas do produto, mostrar o interior do estabelecimento. A forma de transporte do preso, com mãos na cabeça, marca-passos nos pés, parece Guantânamo. Isso pode se fazer com preso do PCC, perigosíssimo, agora não com ralé, o que você tem aqui em maioria. Me refiro a ralé na condição de ser criminoso, mas não de elite, bandido de altíssima periculosidade. Tem que treinar agentes para não se impedir que se vá à cadeia. Isso afasta o convívio familiar.
SC não consegue construir novas prisões pela recusa dos prefeitos. O que o senhor tem a dizer sobre isso?
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(Interrompe) Seria bom se não construísse. O que o Estado precisa é criar políticas para manter ou senão diminuir essa população carcerária. Encontramos muitas pessoas presas por furto, ameaça, lei maria da penha e crimes menores que não precisariam estarem presas. A assistência jurídica aqui é altamente deficitária. O Estado de SC precisaria pensar: ‘não vou mais construir cadeia porque cadeia é igual gaveta na sua casa, se você tiver uma estará lotada, se você tiver 100 todas estarão lotadas’. Tem que repensar e SC pode ser exemplo no sistema brasileiro, aplicando políticas de desencarceramento, dando mais efetividade à execução penal.