Suspeita de ter participado de fraudes em contratos com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) entre 2010 e 2014, conforme investigação da Operação Ouvidos Moucos da Polícia Federal, a empresa S.A. Tour Viagens e Turismo Ltda continuou prestando serviço de aluguel de veículos para a universidade nos anos seguintes. A dispensa de licitação em um contrato de R$ 561 mil com a Pró-reitoria de Administração (Proad) é questionada pela Controladoria-Geral da União (CGU) na análise das contas da instituição referentes a 2016. O relatório da Controladoria foi divulgado em 22 de setembro. A chefia de gabinete da reitoria da UFSC afirma que apenas cumpriu o contrato firmado na gestão anterior da universidade.

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A falta de justificativas para a dispensa de licitação e dos preços aplicados e de não terem checado a idoneidade das empresas que disputaram o contrato são pontos destacados no trecho da auditoria que cita o contrato 34/2016. Além disso, a CGU critica o fato das empresas participantes serem originalmente de turismo e não de transporte:

“Finalmente, verificou-se que a empresa contratada, assim como aquelas que foram consultadas para apresentação de propostas, não trabalham com transporte coletivo, o que demonstra a inadequação do fornecedor escolhido. Todas as empresas consultadas são agências de turismo”.

No documento, a UFSC justifica o contrato emergencial devido ao “pouco tempo hábil” entre as mudanças de gestão na reitoria – que ocorreu em maio de 2016 – para a realização de um processo licitatório. E ainda ressalta que os valores aplicados nos contratos foram calculados por meio de uma média de gasto por dia no ano anterior. O chefe de gabinete da reitoria, Aureo Moraes, afirma que a contratação foi realizada ainda na gestão anterior, a de Roselane Neckel, então foi apenas cumprida pelo reitor seguinte, Luiz Carlos Cancellier – afastado por decisão da Justiça Federal desde 14 de setembro.

O contrato 34/2016 vigorou entre abril de 2016 e o mesmo mês de 2017. De acordo com o Portal da Transparência do Governo Federal, a S.A. Tour recebeu pelo menos R$ 425 mil na prestação de serviço de transporte e locomoção da UFSC. O relatório que analisa as contas de 2016 da CGU tem 108 páginas e avalia os procedimentos adotados em diversas despesas da universidade.

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Em 13 contratos analisados em 2016, incluindo serviços licitados ou que tiveram dispensa ou inexigibilidade de licitação, todos tiveram procedimentos questionado pelos técnicos da Controladoria. Apesar de ter sido apenas uma amostragem dos contratos firmados naquele ano, 769 no total, os 13 documentos avaliados estipularam gastos que somam quase R$ 20 milhões. A chefia de gabinete afirma que todos os itens apontados pela CGU foram esclarecidos.

Proprietário da S.A.Tour aparece em apuração da PF

O empresário Murilo da Costa Silva, sócio da S.A. Tour, foi uma das cinco pessoas conduzidas coercitivamente na Ouvidos Moucos, deflagrada pela Polícia Federal em 14 de setembro. De acordo com o inquérito aberto ainda em 2014, há indícios de fraudes na locação de veículos para transportar professores e bolsistas do curso de Física até os polos da universidade em outras cidades. Conforme a investigação, a UFSC teria pago R$ 124,6 mil por 99 traslados entre 2010 e 2014 – um preço 88% superior do que o valor de mercado e o suficiente para comprar três carros novos, conforme a CGU, que também investigou as irregularidades.

A empresa teria recebido a maior parte do dinheiro: R$ 112 mil. Também não houve licitação para a escolha dos responsáveis pelo serviço de aluguel de carro, apenas recebimento de propostas orçamentárias. No entanto, a PF destaca que algumas empresas não tem sede ou estrutura, indicando serem laranjas.

No dia da operação, Murilo não quis falar com a imprensa. O sócio dele, Carlos Alberto Bellin Amante Jr., confirmou por telefone que um dos proprietários das empresas consideradas laranjas e que disputaram o contrato com o EaD prestava serviço de transporte de van para a S.A. Tour. Na tarde de ontem, Carlos falou novamente com a reportagem e explicou que o contrato do ano passado questionado na auditoria da CGU é sobre aluguel de ônibus:

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— Para saber detalhes, eu preciso pegar contrato por contrato. Mas esse eu lembro que era sobre fornecimento de ônibus para a universidade. Não temos ônibus, somos uma agência que contrata os serviços. Também quero deixar claro que atendemos a UFSC durante a vigência do contrato.

A operação Ouvidos Moucos investiga fraudes em gastos da UFSC no programa Universidade Aberta do Brasil (UAB). Na mesma data, outras sete pessoas, incluindo o reitor Luiz Carlos Cancellier, chegaram a ficar presos temporariamente por um dia. Os sete servidores estão afastados de seus cargos na UFSC por decisão da Justiça.