Guto tem um ano e sete meses, mas o processo de criar vínculos com quem o escolheu para amar ainda está em pleno andamento. Há cinco anos Nelita Zanella, 40, e Zélia Amélia Odorizzi, 49, que vivem juntas desde 2005, decidiram que a família precisava de mais alguém para ser completa. Com ajuda da Justiça, adotaram Guto. Zélia se lembra do dia em que soube que poderia receber um filho: foi em 2011, durante a limpeza da lama que a enchente havia trazido para dentro da casa colorida próxima ao Centro de Lontras, no Alto Vale do Itajaí.

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Mais três anos se passaram até que o menino chegou. As mamães o conheceram por uma foto no fórum de Rio do Sul, mas quase não enxergaram o rosto do bebê, com a visão embaralhada pelas lágrimas. Depois se aproximaram aos poucos.

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– Foram 16 dias, duas horas por dia no abrigo onde ele estava. O primeiro dia foi mais difícil para nós e para ele, mas no segundo ele veio com a gente bem feliz. No último era difícil deixá-lo e vir embora. Ele chorava, queria vir conosco – recorda Zélia.

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O bebê chegou à casa dia 9 de junho e desde então a vida é uma festa. A felicidade também virou rotina na casa de Angelina Pfau Mandel, 55, e Rubens Mandel, 56, e está sempre estampada no olhar do casal quando falam de Estefani Letícia, nove anos. A dificuldade de engravidar os levou a iniciar em 2003 o processo para encontrar a filha de coração.

– Esperamos três anos por ela, mas hoje parece que aquele tempo não existiu. Tenho a sensação de que ela sempre foi minha, só não tinha nascido até nos encontrarmos – conta a mãe, emocionada.

Contato provisório

O contato foi difícil. Rubens recebeu uma ligação da Justiça informando que havia uma criança, porém, desnutrida: pesava sete quilos com um ano e sete meses (a média para esta idade é 12 quilos). Foram três encontros para que se conhecessem, mas ela não parava de chorar e não queria deixar o colo da cuidadora. Quatro dias depois, ainda em meio ao choro, era hora de conhecer o novo lar.

– Ela tinha medo, não vinha comigo. Comecei brincando de longe e fui conquistando dia a dia. Até que ela quis ver o cachorro do vizinho do outro lado do muro e a mãe falou “pede pro seu pai”: aí ela veio com os bracinhos abertos – revela Rubens enquanto mostra o álbum de fotos da menina.

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Do primeiro encontro veio o período da guarda provisória, também chamado de estágio de convivência. Foi difícil e levou um ano até que Estefani compreendesse a nova família. Na época não havia acompanhamento intenso de psicólogos e assistentes sociais – que Nelita e Zélia vão receber até o fim do ano para fortalecer os laços com Guto – mas as dificuldades foram vencidas pela união da família.

Certas de que vão passar pela adaptação com os vínculos afetivos fortalecidos, Nelita e Zélia já estão ansiosas pelo dia em que Guto passará a se chamar oficialmente Matheus Augusto Odorizzi Zanella, o que está previsto para ocorrer até o fim do ano, quando esperam receber a guarda definitiva.

Estágio de convivência

O estágio de convivência que Guto e a nova família terão de passar está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e na Lei da Adoção. A extensão do período é determinada pelo juiz da Vara da Infância da comarca onde ocorre a adoção. De acordo com o juiz Álvaro Luiz Pereira de Andrade, da comarca de Blumenau, o estágio de convivência tem como objetivo averiguar a adaptação da criança ou adolescente à nova família, respeitando princípios constitucionais como o direito à convivência familiar, a opinião e o interesse do adotando.

Segundo o ECA, o estágio de convivência pode ser dispensado se a criança já estiver sob o cuidado ou a guarda legal de quem vai adotar por tempo suficiente para que seja possível avaliar se existe vínculo, porém a dispensa também só pode ser feita pelo juiz.

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A psicóloga forense da comarca de Blumenau Alessandra Heiden Girardi explica que o período é mais para orientação do que avaliação do comportamento e que o objetivo é ajudar a nova família a se integrar:

– É um apoio para pais e filhos, não tem nada de diferente de uma orientação que é dada a qualquer outro pai (biológico) de como educar seu filho e fazer com que a relação melhore. É um suporte para desabafarem dificuldades mas também para receberem ajuda.