Toda vez que o notebook de André Lopes começa a falhar é a mesma história. O bancário entra no site da fabricante para procurar uma assistência autorizada e descobre que a mais próxima fica a 1.145 quilômetros. Em São Paulo, exatamente. Apenas lá há um centro de reparos da Dell no Brasil – defeitos que não envolvam troca de peças podem ser resolvidos por assistência remota, diz a garantia. Mas esse não é o caso de André. Há alguns meses, um tombo fez rachar o seu note.

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– Se eu mandar meu computador por correio até a assistência técnica, vai acabar levando 30 dias até que me devolvam. Estou procurando peças em assistências não autorizadas em Porto Alegre, mas são caras e, em muitos casos, não originais – conta.

Por ora, o bancário vai usando o computador rachado. É o segundo equipamento avariado na casa: também por dificuldade de encontrar assistência autorizada, André usa um netbook com problemas na bateria sempre conectado à tomada.

O caso descrito não é um problema isolado de André e tampouco se restringe a produtos da Dell. Donos de eletroeletrônicos enfrentam dificuldades para encontrar autorizadas que reparem seus equipamentos, mesmo dentro da garantia. A situação vale para câmeras digitais, TVs de tela plana e aparelhos de som e se complica quando é preciso trocar telas quebradas de smartphones e tablets. A sensação é de que as representantes sumiram.

– As empresas reduzem cada vez mais seus pontos de assistência técnica. Em muitas cidades, o cliente é obrigado a levar o aparelho na loja onde comprou, pois não há nenhuma representação da indústria – diagnostica Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste, a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor.

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Essa situação piorou nos últimos quatro anos, quando uma massa de brasileiros aumentou sua renda e teve acesso a eletroeletrônicos sofisticados. De acordo com Maria Inês, as fabricantes não ampliaram na mesma proporção seus canais de atendimento, nem os estoques de peças, esquivando-se dos custos operacionais.

Tecnologia tornou mais caro reparo de eletrônicos

Aficionado por tecnologia, Raul Webber lembra dos primeiros PCs da IBM, lançados há cerca de 30 anos. Abertos os desktops, as placas revelavam dezenas de circuitos de 50 pinos cada, distantes cinco milímetros um do outro. Quando um estragava, era relativamente simples identificar, retirar, consertar e soldar novamente.

Com o passar dos anos, os computadores diminuíram, espremendo também os circuitos. A indústria passou a condensar o “cérebro” da máquina, colocando cada vez mais potência e funcionalidades em placas diminutas. Os notebooks mais modernos ganharam uma única pastilha de silício com 400 pinos, a menos de um milímetro um do outro – o equivalente à espessura de uma unha.

– Passou a ser muito mais trabalhoso e caro diagnosticar o pino estragado e fazer uma troca. É mais fácil mudar todo o circuito – explica Webber, professor de arquitetura de computadores do Instituto de Informática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

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A miniaturização de processadores, placas-mãe, fontes, discos e memórias virou regra na indústria eletrônica. Além de desktops e notebooks, smartphones, tablets e TVs de tela plana passaram a ser concebidos com o que há de mais avançado – e menor – na eletrônica. E isso explica por que a manutenção destes produtos se tornou mais cara e difícil de ser encontrada.

Diante de altos custos para manter laboratórios equipados com tecnologia de ponta para fazer diagnóstico e conserto, grandes fabricantes passaram a concentrar sua assistência em um único local, e não mais espalhada por todo o Brasil. Via de regra, a indústria orienta os clientes a enviar sua máquina por correio até um centro de reparos próprio.

O avanço tecnológico também pressiona o preço da manutenção. Uma vez que consertar equipamentos passou a envolver a troca de peças inteiras, o custo muitas vezes se aproxima ao de uma nova máquina. Consertar smartphones e tablets deixou de ser opção para a Apple. Na Somma, autorizada da empresa americana no Estado, aparelhos com telas quebradas ou com falhas no funcionamento são trocados por novos, mesmo fora da garantia.

Na sede da representante em Porto Alegre, é feita uma inspeção do aparelho, e, comprovando-se a falha, um novo é providenciado. Para a troca, é cobrada uma taxa que corresponde a aproximadamente metade do valor de um aparelho novo. Alex Hermann, diretor da Somma, explica que a fabricante subsidia parte do valor e troca o aparelho para garantir que o problema não irá ocorrer novamente:

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– A Apple não faz mais conserto de aparelhos. O reparo é a substituição.