Imagine um pássaro que voa para frente, mas mantém a cabeça voltada para trás, olhando para o que deixou. Em seu bico, ele carrega um ovo, delicado e frágil, mas cheio de promessas: o futuro. Este é o símbolo de Sankofa, um conceito da cultura africana Akan, que convida a olhar para o passado não como um peso, mas como uma fonte de aprendizado e liberdade.

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Na filosofia africana, Sankofa ensina que recuperar o passado não é um tabu, mas uma necessidade. O que foi esquecido ou perdido – histórias, tradições, identidades culturais – pode e deve ser recuperado. É um ato de resistência e valorização, essencial para fortalecer raízes. 

A filosofia Sankofa pode ser aplicada nas escolas. Para crianças e adolescentes é uma forma de conhecer e aprender sobre o passado e as raízes da cultura africana. Com esse aprendizado, eles podem construir um futuro mais respeitoso e consciente.

Educação antirracista nas escolas

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Educação para além da escola

A conversa começa dentro das salas de aula da Escola Municipal Beatriz de Souza Brito, em Florianópolis. Um grupo de alunos participa de um projeto de educação antirracista, que tenta provocar muitas reflexões e conhecimentos que não ficam só na escola, mas conseguem ultrapassar muitas fronteiras.

— Aqui é onde a gente se encontra, onde a gente discute como é que a gente vai produzir materiais relacionados à cultura afro-brasileira, indígena. O objetivo do grupo é que eles se tornem multiplicadores da educação antirracista na sala de aula e no seu ambiente familiar — afirma Nalze Pereira, professora que tenta levar mensagens para os estudantes.

Aplicando a filosofia Sankofa, eles também olham para o passado para aprender mais sobre pessoas que são referência, como Antonieta de Barros.

— Ela é daqui de Florianópolis e se tornou jornalista, oradora e escritora. Foi ela quem instituiu o dia 15 de outubro como Dia dos Professores — afirma a estudante Iara Cordeiro que sempre mergulha nas atividades.

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— Me sinto representada — diz.

— Eu tenho orgulho de ser negro — é a declaração do Pablo, de 14 anos que também participa do projeto.

Experiências novas

Orgulho que a Jasmily também aprendeu a sentir com o tempo. Agora ela ensina crianças menores a ver a beleza de seus traços.

— A gente fez uma atividade de pegar o espelho, mostrar e falar que aquela criança é um príncipe, uma princesa, para demonstrar que ela é bonita, porque na idade das crianças normalmente tem muitas que não se acham bonitas — conta a estudante.

Todo esse trabalho já está sendo percebido. A diretora da escola, Camila Porciuncula colhe os resultados.

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— A empatia de um estudante com o outro, o respeito, a valorização da cultura que o outro traz, o olhar para além do seu próprio mundo, a valorizar o que o outro tem. Isso sem precisar nenhum respaldo, sem precisar de que ninguém fosse ali pra validar.

Há mais de 20 anos, uma lei estabelece que é obrigatório ter no ensino a “história e cultura afro-brasileira” dentro das disciplinas que já fazem parte do currículo dos ensinos fundamental e médio. Para Maria Aparecida Moreira, presidente da Associação de Educadores Negros de Santa Catarina, ainda existe um longo caminho a ser percorrido.

— As coisas estão caminhando em passos muito, muito lentos. Não é só o português, não é só história, não é só a arte. Ela coloca principalmente essas três, mas são em todas as disciplinas, porque as pessoas na escola têm o hábito de achar que é só o professor de história que vai trabalhar. Não, são todos os professores e todas as disciplinas. Nós temos que pensar que mais do que um compromisso, é uma legislação. E sendo uma legislação, ela tem que ser cumprida por todas e todos os educadores.

O desafio é grande, assim como o sorriso do Yuri. No atabaque ele mostra a importância de valorizar a nossa cor da pele.

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— Para mim é uma forma de a gente se expressar, uma cultura que não é muito conhecida agora mas que era dos escravos de antigamente.

Para esses adolescentes, o presente é uma volta ao passado. É um resgate da sabedoria ancestral para construir um futuro melhor, e para isso precisamos seguir um longo caminho. O primeiro passo? Saber as origens e ter um grande orgulho de carregar na pele uma cor que é um verdadeiro patrimônio.

Projeto celebra a história negra

*Texto de Vitória Fagundes e Cristiano Gomes

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