Os desafios sociais aumentam e se renovam a cada dia da pandemia do novo coronavírus. A busca mundial pela vacina, a necessidade urgente de testagem para identificar e isolar os casos e a corrida do setor produtivo e do comércio por alternativas que ajudem a superar os efeitos econômicos causados pela Covid-19 são só os exemplos mais visíveis dessas dificuldades que se impõem. Em Santa Catarina uma série de ações utiliza a tecnologia ou a inovação científica para tentar superar esses desafios nas mais diferentes áreas.

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Um dos braços importantes desse trabalho está nas universidades. Levantamento da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina aponta que instituições de ensino de SC já desenvolveram 188 projetos relacionados à pandemia. Aliadas a soluções criadas pelo próprio mercado, essas pesquisas e inovações apoiam o Estado a amenizar os efeitos da Covid-19 e a construir os novos caminhos que serão percorridos no pós-pandemia.

A vocação catarinense para o setor tecnológico é um dos diferenciais no desenvolvimento de soluções. Vocação, aliás, que alçou SC ao quarto lugar no ranking nacional de polos tecnológicos em faturamento – R$ 17,7 bilhões, o que representa 5,9% do PIB catarinense -, ultrapassando Minas Gerais e Rio de Janeiro. Os dados são do Tech Report 2020 e foram divulgados nesta semana pelo Observatório da Associação Catarinense de Tecnologia (Acate) e pela Neoway, com apoio do Finep.

Ao lado e nas duas próximas páginas, conheça iniciativas catarinenses que envolvem a tecnologia e a ciência para vencer a pandemia.

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Vacina catarinense em estudo na UFSC

A vacina se tornou o maior sonho de consumo mundial para vencer a pandemia do novo coronavírus. Um dos projetos em estudo é desenvolvido por uma parceria da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) com outras instituições como as universidades federais de Minas Gerais (UFMG) e do Rio de Janeiro (UFRJ), o Instituto Butantã e mais dois órgãos internacionais, Universidade de Cambridge (Inglaterra) e o Karolinska Institutet (Suécia).

A vacina em estudo pelos pesquisadores da UFSC tem como base a centenária BCG – aquela vacina da marquinha no braço –, que previne a tuberculose e é considerada uma das imunizações mais seguras. O professor de Imunologia da UFSC, André Báfica, explica que a ideia é que a bactéria usada na vacina BCG possa ser utilizada para conduzir os antígenos do novo coronavírus (proteína do vírus por onde ele infecta as células de um organismo). É a esses antígenos que o sistema imune do paciente precisa desenvolver resposta imunológica em uma vacina.

Outras vacinas em desenvolvimento utilizam outros vírus como plataformas para estimular essa reação prévia do organismo à proteína do novo coronavírus. Báfica diz que uma das vantagens é que a BCG induz a ativação dos chamados linfócitos C, que auxiliam os linfócitos B na produção dos anticorpos.

– Como todos nós já usamos a BCG, muitos de nós já temos uma memória imunológica. A gente iria “pegar carona”, digamos assim. Ao dar uma nova dose, você reestimula quem já usou a BCG, e é possível que tenha maior resposta imunológica – detalha o pesquisador.

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A vacina ainda está na fase pré-clínica – antes, portanto, dos testes feitos nas fases clínicas que vão de 1 a 3. No momento, os pesquisadores receberam os gens feitos de forma sintética e vão inseri-los na bactéria BCG para acompanhar se o material será aceito.

O projeto da vacina com base em BCG foi aprovado em programas de apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc).

Algoritmo otimiza a testagem de trabalhadores

Projeto já foi implantado em academia de Florianópolis para otimizar testagem
Projeto já foi implantado em academia de Florianópolis para otimizar testagem (Foto: Divulgação)

Uma das dificuldades para manter o trabalho presencial em algumas empresas é a necessidade de testagem em massa dos trabalhadores. O projeto Movimento Seguro propõe otimizar a aplicação dos testes de Covid-19. A solução foi elaborada pelo pneumologista Roger Pirath Rodrigues e pela fisioterapeuta respiratória Flávia Carsten Duarte Rodrigues, e tem parceria com a empresa Manager Systems, de Florianópolis, que armazena e analisa os dados.

A ideia consiste em um questionário aplicado semanalmente a funcionários com perguntas sobre qualquer tipo de sintomas que eles possam ter sentido no período. Entram aí até mesmo sinais que às vezes passam despercebidos pelos trabalhadores, como dores no corpo, e também hábitos que elevam o risco, como o uso de transporte público e contatos estabelecidos.

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Essas respostas são cruzadas por um algoritmo clínico, que aponta quem teria maior possibilidade de estar infectado. Um grupo que varia de 8% a 10% do total de funcionários que respondem o questionário é submetido ao teste RT-PCR, que detecta a presença do vírus no corpo. Nas oito primeiras semanas do projeto, entre 15% e 20% dos trabalhadores submetidos ao exame testaram positivo para Covid-19. Já entre um grupo escolhido entre os que ficaram de fora dos indicados pelo algoritmo todos tiveram resultado negativo.

– Baseado no fato de haver pessoas pouco sintomáticas e na questão de a Covid-19 ser uma doença de surtos, que tem facilidade de transmissão interna em ambientes fechados, controlar os casos dentro de empresas pode ser fator determinante para impedir a doença de se alastrar mais, e até de ter que fechar o serviço. Além disso, o custo de testagem é menor – aponta Roger Pirath Rodrigues.

Teste rápido mais simples e barato

Teste rápido mais simples e barato para coronavírus foi desenvolvido em laboratório de bioquímica da Udesc de Lages
Teste rápido mais simples e barato para coronavírus foi desenvolvido em laboratório de bioquímica da Udesc de Lages (Foto: Diorgenes Pandini, Diário Catarinense, arquivo)

Pesquisadores da Universidade do Estado de SC (Udesc) em Lages, na Serra catarinense, desenvolveram um teste rápido de Covid-19 mais simples e mais barato. Os cientistas criaram uma molécula que se une ao novo coronavírus e, ao fazer isso, muda de cor. Dessa forma, ela pode ser usada para detectar uma infecção na fase aguda.

A formulação ainda não está totalmente concluída, mas os resultados até aqui despertam otimismo nos pesquisadores. O teste rápido poderia dispensar a necessidade de coletar material e enviar ao laboratório para análise, como necessário no caso dos testes RT-PCR, e poderia identificar a infecção de forma imediata, como ocorre com os testes rápidos atuais – a diferença é que esses testes hoje só identificam a resposta do organismo ao vírus contraído em um momento anterior, e não a presença do vírus em si no momento da testagem.

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A expectativa dos pesquisadores é que o novo teste rápido esteja no mercado entre três e quatro meses.

– O projeto foi muito bem-sucedido no desenvolvimento da molécula. Ela se une de forma muito potente ao vírus, mas é preciso agora refinar de modo que gere cor para dar uma resposta imediata (em caso de infecção) – explica a professora Maria de Lourdes Magalhães, coordenadora do projeto.

Telemedicina e apoio remoto a pacientes

A empresa Dígitro, de Florianópolis, desenvolveu uma plataforma de telemedicina para facilitar os atendimentos remotos a pacientes durante a pandemia. A ferramenta é usada pela prefeitura de Rio Branco, no Acre, que fez mais de 30 mil consultas virtuais desde abril. A alternativa evita a ida de pacientes a unidades de saúde.

A plataforma permite que médicos, enfermeiros, psicólogos e nutricionistas façam consultas on-line. Também permite esclarecimentos, orientações, agendamentos de consulta presencial (nos casos necessários) e por meio de chat ou telefone. Para o usuário, todo o atendimento ocorre no aplicativo de conversa que ele preferir utilizar, como Whatsapp, Telegram, Messenger ou mesmo uma página de contato da empresa. Para o hospital, clínica ou órgão público, a plataforma se conecta com serviços de agendamento, banco de dados e facilita também a triagem dos pacientes antes dos atendimentos remotos.

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Ainda no campo da telemedicina, um grupo de empresas de tecnologia de Blumenau desenvolveu um serviço de atendimento pelo Whatsapp, com uso de inteligência artificial. Até esta semana o sistema havia registrado mais de 19 mil atendimentos, entre informações e teleconsultas. Pessoas com sintomas de covid-19 ou dúvidas sobre a doença passam por uma triagem feita por robôs. Os casos suspeitos são repassados para atendimento médico, por meio de videochamada, chat ou chamada de áudio.

Doktor tira dúvidas de pacientes de forma remota e aciona atendimento de telemedicina em Blumenau
Doktor tira dúvidas de pacientes de forma remota e aciona atendimento de telemedicina em Blumenau (Foto: Eraldo Schnaider, Prefeitura de Blumenau, divulgação)

Em Florianópolis, a prefeitura também implantou o programa Alô, Saúde Floripa, que faz triagem de pacientes por meio de aplicativo e, nos casos necessários, encaminha para teleconsultas e inclui o morador em um serviço de monitoramento remoto.

Aprendizagem de máquina para testes e a triagem

Outro projeto de pesquisadores catarinenses aprovado em programas de apoio do CNPq e da Fapesc prevê o uso de algoritmos de aprendizagem de máquina para lidar com problemas relacionados à Covid-19. O projeto ainda está em fase inicial, mas se divide em quatro áreas. As primeiras delas é a identificação de fake news sobre o novo coronavírus. Para isso, o projeto prevê a formação de um conjunto de dados com notícias falsas e verdadeiras para que depois o algoritmo possa identificar se o conteúdo sobre o novo coronavírus pode se tratar de material inverídico.

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Outras duas áreas são consideradas mais importantes e lidam mais diretamente com os problemas na área da saúde. Uma delas é a formação de uma base de dados a partir de exames de sangue e urina de laboratórios para ajudar a diagnosticar a Covid-19 sem necessariamente usar o teste RT-PCR. A terceira área de atuação seria também o diagnóstico da doença, mas com base em padrões de exames de imagens. Por fim, o projeto também propõe a criação de uma espécie de equipamento que permita uma triagem automatizada de pacientes em hospitais ou unidades de pronto-atendimento.

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O professor Samuel da Silva Feitosa, do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), coordenador do projeto, explica que o equipamento permitiria a medição de pressão arterial e de saturação de oxigênio no sangue, e organizaria o atendimento de urgências e emergências conforme o protocolo de Manchester, mas de forma mais automatizada.

O projeto ainda está na fase de treinamento dos alunos selecionados e tem duração total de dois anos.

E-commerce em sete dias e gestão do espaço em lojas físicas

Soluções para o varejo ajudam em momento de fechamento de lojas físicas ou de capacidade reduzida
Soluções para o varejo ajudam em momento de fechamento de lojas físicas ou de capacidade reduzida (Foto: Diorgenes Pandini, Diário Catarinense, arquivo)

Além dos desafios na área da saúde, a pandemia do novo coronavírus também provoca reflexos severos na economia. As semanas de comércio fechado exigiram uma migração relâmpago para o mercado digital nos casos de empresas que ainda dependiam apenas da loja física.

Para atender quem precisava dessa transição em tempo recorde, a empresa Check Store lançou o projeto Start, que propõe criar sites de e-commerce do zero e colocá-los no ar em até sete dias. O custo parte de R$ 2 mil, mas é apontado como bem inferior ao valor de desenvolvimento de um e-commerce do zero.

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O diretor-executivo Érico Scorpioni diz que o número de novas lojas colocadas no ar por mês saltou de duas para 15.

– São pessoas novas, que não estavam com o e-commerce no radar, e a pandemia empurrou para isso. Para muitos, o novo e-commerce salvou o ano e ajudou a segurar as contas – conta.

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Ainda no segmento do varejo, uma solução da Teltec Solutions, de Florianópolis, permite monitorar o fluxo de pessoas aglomeradas em determinado local de uma loja. Isso permite intervenções para garantir a segurança de clientes e funcionários. A ferramenta Store Automation Management (SAM) usa sensores de ambiente e plataformas de marketing para monitorar os espaços das lojas e evitar aglomerações próximo a um caixa, por exemplo

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