Seu avô, conta o secretário extraordinário de Copa do Distrito Federal, Cláudio Monteiro, passou a primeira camada de asfalto em Brasília. Nascido em Niterói, Monteiro desembarcou com a família em 1957 para ajudar a construir a capital federal. Em 2011, foi dele a responsabilidade de colocar de pé o Mané Garrincha em tempo recorde. O estádio que já chegou a ser chamado pelo ministro Aldo Rebelo de “coliseu”, pela magnitude e pelo custo, ultrapassará os R$ 1,7 bilhão com as placas de energia solar, ainda não instaladas.
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Investimento que Monteiro defende com unhas e dentes:
– Quando eu era jovem e passeava pelo Eixo Monumental, aqui, pensava: ‘mas pra que tanto?’ Hoje, engarrafa. Esse estádio é uma obra para cem anos.
Cabe a Monteiro também evitar que o primeiro estádio entregue para a Copa do Mundo não se torne um elefante branco em uma cidade sem time de futebol. Ou, como argumenta Monteiro, com todos os times do país.
Nesta entrevista, a partir da experiência de Brasília, ele opina sobre questões que se repetirão nas demais arenas pós-Copa.
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Legado do estádio
“As pessoas costumam vincular um espaço a um evento ou a uma modalidade. Não é preciso ser assim. O primeiro passo para garantir o legado foi construir esse estádio em uma área central da cidade, que estava degradada. Pós-Copa do Mundo nós vamos dar a destinação correta ao Mané Garrincha, que não é a de um estádio de futebol, mas de um centro de entretenimento. Pense num shopping com uma arena dentro. Esse é o Mané. Nós já temos reservados 40 bares, dois restaurantes. Os camarotes já estão vendidos. O subsolo é preparado para salas de cinema.”
Perfil das cidades
“Cada sede precisa pensar no perfil da sua cidade antes do empreendimento. Em Brasília tínhamos um déficit de programação. O fim de semana do brasiliense era contemplativo. Olhar para os lagos, assistir TV… Se quisesse ver um show, pegava um avião. A vantagem que temos para mudar isso é o imenso potencial econômico. A renda per capita aqui é cinco vezes maior que a do Rio e três vezes maior que a de São Paulo.”
Administração estatal
“O modelo de administração de cada arena difere. Quando consórcios começaram a construir os estádios, os clubes passaram a obedecer o que a empresa que administra o estádio determina. A nossa vantagem, nesse sentido, é que podemos firmar parcerias diretamente com os clubes. Eles vêm aqui por um acordo financeiramente vantajoso, mas eles que administram a realização dos jogos. Claro, há códigos, com o de Defesa do Consumidor, que temos de cumprir. Mas, por contrato, os clubes usufruem da infraestrutura do Mané como responsáveis. O clube pode, inclusive, vender ingressos mais baratos aos seus sócios.”
Custo do estádio
“Temos o objetivo de buscar esse valor de volta. O que é preciso entender é que, no nosso caso, não é ‘gasto da Copa’. Um estádio é uma obra para cem anos, se fizermos da forma correta, com a devida manutenção e sem necessidade de reformas. Por cinco anos a manutenção está na garantia da construtora, e só a partir da entrega oficial, em março. Em arrecadação, já foram cerca de R$ 60 milhões, mas não é esse o valor principal. A nossa estimativa de que cada evento no Mané mobiliza 12 mil postos de trabalho diretos em serviços, e uma movimentação de R$ 12 milhões na economia da cidade.”
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Calendário esportivo
“É mais um fator em que o perfil da cidade ajuda. Brasília é uma síntese do Brasil. Todo time regional aqui é um time nacional. Temos torcedores de Grêmio, de Inter, e de Fortaleza, Bahia… Já temos oito jogos acertados para o Brasileirão de 2014, mas ainda buscamos dobrar essa quantidade. O Flamengo é nosso parceiro. Conforme o contrato deles com o Maracanã, eles têm autonomia para fazer 10 jogos como mandantes fora de lá.”
Medo de esvaziamento
“É brincadeira isso. Por termos diversas torcidas, é o menor risco de esvaziamento. Quando Flamengo e Portuguesa reuniu 12 mil torcedores, todo mundo noticiou que os brasilienses tinham perdido o interesse no estádio. Fui ver, era o maior público daquela rodada, em uma quarta-feira à noite, às 21h. Desinteressados, ainda somos os mais interessados do Brasil (risos).”
Brigas de torcida
“Depois dos episódios desagradáveis (torcedores de Vasco e Corinthians se enfrentaram nas arquibancadas e de São Paulo e Flamengo no entorno), constatamos que os clubes não podem trazer encrenqueiros na bagagem e colocar em risco famílias daqui. Então, hoje, os clubes têm de cadastrar quem trarão com 10 dias de antecedência e, na chegada do estádio, são novamente identificados. E, quem vem, senta na arquibancada como todo mundo. Não pode estender bandeira de organizada. Creio que é uma fórmula que devia ser exportada pra todo o Brasil. Por que não?”
Shows
“O que os produtores mais querem é colocar uma cidade de bom poder aquisitivo na turnê internacional de uma banda. Mas a logística é complicada e, antes do Mané, só tinham estacionamentos aqui. Só se pode colocar um grande show por mês no estádio sem prejudicar o calendário esportivo, porque demora 10 dias para montar o palco e cinco para retirar. Já tivemos de dizer não a uma banda maior que o Aerosmith (que se apresentou no dia 24 de outubro, para 25 mil) por conta disso. Depois da Copa, teremos ao menos dois no segundo semestre. Um é o Andrea Bocelli em 12 de outubro, que será só aqui e em Aparecida (SP).”
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Outros eventos
“O Mané primeiro sediou a Copa das Confederações. Vai sediar o número máximo de jogos da Copa do Mundo, sete. Mas temos mais para buscar. Atribuo à construção do Mané, à revitalização da área como um todo, termos conseguido trazer de volta a Universíade (Jogos Mundiais Universitários) para o Brasil, em 2019. A partir deste ano, a Motovelocidade também volta para Brasília depois de 10 anos. Em 2016, seremos uma das sedes do futebol da Olimpíada. Se há estrutura e a cidade entra no circuito, um evento chama o outro.”