Em Joinville, algumas histórias podem estar perdidas em meio ao crescimento da área urbana na cidade. Uma delas era a do Asilo Municipal de Alienados Oscar Schneider, um hospital psiquiátrico construído no início dos anos 1920 para abrigar pessoas com transtornos mentais — em toda a amplitude que o conceito significava na época, bem distante da reforma psiquiátrica, do movimento antimanicomial e dos serviços humanizados. O imóvel, que depois foi utilizado de outras duas formas bastante curiosas, existia no terreno do Cemitério Municipal de Joinville, na rua Borba Gato, no bairro Atiradores.
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A casa funcionou de 1923 a 1942 e foi idealizada pelo ex-prefeito de Joinville que lhe dava nome, Oscar Schneider. O objetivo era oferecer um tratamento digno aos doentes mentais, mas não foi bem o que aconteceu. É o que contou a doutoranda em psicologia Mariana Zabot Pasqualotto no livro "Memórias da Loucura em Joinville: o (des)aparecimento do Abrigo de Alienados na Cidade", lançado em 2015, a partir de uma pesquisa feita por ela com o doutor em psicologia Allan Henrique Gomes e seis estudantes de psicologia da ACE.
A obra recorda a trajetória dos tratamentos dados, desde a criação da Colônia Dona Francisca, àqueles considerados loucos. Desta forma, qualquer pessoa com algum tipo de deficiência física e mental corria o risco de ser removida de sua vida para virar interno do Asilo Municipal de Alienados. No livro de registros, os pesquisadores encontraram, por exemplo, uma paciente em que o diagnóstico era "ser muda".
A partir da publicação da obra, Mariana recebeu novas informações e imagens de pessoas que quiseram dividir histórias sobre o local. Entre eles estava Jackson Correa, 55 anos, que cedeu para reprodução uma imagem da construção do prédio. O avô dele, Alvino Klingenfuss, estava entre os pedreiros que levantaram as paredes do primeiro "hospício" de Joinville.
— Era comum que registrassem a construção dos prédios, principalmente quando faziam a festa das cumeeiras — conta Jackson, que ainda recorda das histórias de vizinhos que, durante a Segunda Guerra Mundial, foram levados para o local como "prisioneiros políticos".
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Isso porque, quando o Asilo Municipal fechou, em meio à época da guerra, a construção tornou-se o lugar para deter pessoas que iam contra a Campanha de Nacionalização do governo de Getúlio Vargas, que proibiu a comunicação e o ensino dos idiomas dos países adversários do Brasil, como o alemão, o italiano e o japonês. Um deles era o fotógrafo Fritz Hofmann. Nascido em 1872 em um município da Saxônia, na Alemanha, ele mudara para Joinville em 1903.
— Ele se recusava a falar português, e continuou só falando em alemão até o fim da vida, em 1960 — conta a bisneta Fatima Hofmann.
Por isso, Fritz foi detido três ou quatro vezes e obrigado a passar alguns dias no presídio político da rua Borba Gato. Em seu acervo fotográfico, consta uma imagem do local que, desconfia a família, foi feita enquanto ele esteve preso no local.
Com o fim da guerra, o imóvel seria reformado e transformado em quitinetes para as famílias de policiais militares. Foi lá que Ademir Leopoldo Veridiano, 59 anos, cresceu: ele morou em uma destas casinhas entre os três e os 15 anos. Para Ademir, viver em um local que servira de manicômio e prisão não era incômodo. O grande problema era que, na época, o Cemitério Municipal de Joinville já ganhava ampliações e rodeava o imóvel, fazendo com que os túmulos estivessem "no quintal" de sua infância. Mesmo assim, nunca ouviu uma piada de colegas de escola.
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— O pessoal comentava, mas não fazia zombaria. Joinville era muito pequena e tudo era muito diferente de como é hoje — conta Ademir, responsável por mostrar a Mariana e aos outros pesquisadores onde estão as ruínas da casa atualmente.