Nos anos 1960, a Barra da Lagoa era uma pequena comunidade isolada no leste da Ilha de Santa Catarina. Para chegar ao vilarejo, os moradores tinham que ir de barco ou por trilha, mais ou menos como é hoje na Costa da Lagoa. Durante muito tempo, o único mercado que existia na região chamada de Fortaleza da Barra era o de Orlando Assunção Rodrigues, o Seu Landinho. E para abastecer a comunidade, o comerciante botava o carrinho de mão na bateira, remava para a Lagoa da Conceição, depois ia a cavalo até a “cidade”, de onde voltava com pães, massas e caixas de cerveja. Ele fazia essa jornada todo dia.
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O mercado existe até hoje e essa rotina pesada forjou a saúde intacta do Seu Landinho, que aos 75 anos ainda trabalha, mas agora cuidando de cabeças de gado no morro da Galheta. Quem vê aquele senhor baixinho pra lá e pra cá com o carrinho de mão não imagina a força que o velhinho tem. Seu Landinho é do tempo em que a Barra “só tinha boi e mandioca”. Ele viu o progresso chegar à região, trazendo infraestrutura e turistas estrangeiros, e o comércio dele acompanhou essas mudanças e prosperou.
– Nós fizemos um campinho de futebol e eu tive a ideia de abrir um boteco com uma mesa de sinuca. E aí a comunidade ajudou, todo mundo queria tomar uma cachacinha! – recorda, com carinho, a origem de tudo.
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A primeira televisão da comunidade
O progresso chegou primeiro no bar do Seu Landinho. Um amigo dele, que havia comprado uma televisão, ficou com dificuldades em pagar. O comerciante assumiu as 10 prestações da novidade tecnológica e colocou a TV no bar, a primeira da Barra da Lagoa. Vinha gente de todos os cantos só para assistir a novelas ou futebol. O dono teve que comprar cadeiras para os mais velhos sentarem.
O manezinho lembra que o boteco ficava lotado na época da novela Mulheres de Areia. Mas teve um dia que estava passando um filme com cenas de nudez e foi um constrangimento.
– Minha esposa achou aquilo uma pouca vergonha e aí foi um saragaço só! Todo mundo foi embora – conta, aos risos.
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Quando o governo disponibilizou o serviço de balsa para a Barra da Lagoa, as coisas melhoraram. Foi nessa época que ele comprou uma balança, ampliou o estabelecimento e decidiu passar de boteco para mercado de secos e molhados.
– O barzinho tava me dando muita dor de cabeça. E a prefeitura também nunca me deu o alvará.
Pouco depois foi construída a estrada que dá acesso ao bairro, a Rodovia Jornalista Manoel de Menezes. E aí as coisas ficaram muito mais fáceis para toda a comunidade da Barra da Lagoa. Seu Landinho decidiu alugar o mercado para dois sobrinhos, que hoje tocam o mercadinho, que agora tem de tudo.
Passou a se dedicar à criação de gado e à plantação de cana-de-açúcar. Chegou a ter mais de 50 bois e porcos no terreno no morro da Galheta. Mas os bichos também começaram a trazer problemas. Primeiro com relação às mudanças na legislação ambiental, que impediam a criação nos costões próximos ao mar. Depois porque os animais que fugiam iam parar na beira da praia, assustando os banhistas. E, por último, começou a sofrer com o furto de animais. Hoje, são cinco bois.
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Por isso ainda é o cotidiano do idoso pegar o carrinho de mão, encher de comida e subir o morro para alimentar os bichos. Essa rotina, diz ele, é que o mantém disposto. Seu Landinho ainda mora do lado do mercado que tocou por quase cinco décadas. E se lembra com orgulho da importância que a vendinha teve no desenvolvimento do bairro.
– Muita gente não tinha dinheiro pra me pagar e eu anotava no caderninho. Podia dar seis meses, mas todo mundo pagava.