Há quase três meses, a rotina de Ketllyn da Maia Mathes, de seis meses, mudou de cenário. A menina deixou o conforto do lar no Dia das Mães para tratar de uma pneumonia no Hospital Infantil Dr. Jeser Amarante Faria. Durante o tempo de internação, fez vários exames e, na última semana, foi diagnosticada com atrofia muscular espinhal (AME), doença que afeta o desenvolvimento motor por causa da produção deficiente de uma proteína fundamental para o sistema nervoso.
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Durante o tempo de internação, Ketllyn precisou refinar o olhar para se comunicar com o mundo externo, já que não consegue se mexer. Mãe de primeira viagem, Indiassara Stingelin da Maia, 25 anos, conta que não percebeu nada diferente no desenvolvimento da menina nos primeiros meses de vida. A desconfiança de que Kettlyn poderia ter alguma dificuldade motora surgiu apenas dois meses após o nascimento. Durante uma consulta de rotina, a médica da unidade de saúde do bairro Aventureiro questionou se o bebê não se mexia.
– Como é a minha primeira filha, não percebi nada de diferente. A pediatra é que notou que tinha algo errado. Eu achava que ela era preguiçosa para se mexer – conta.
Enquanto esperava uma consulta com o neurologista para averiguar a situação, o bebê adoeceu e pegou pneumonia. Vários exames foram feitos no hospital e o diagnóstico veio quase quatro meses depois.
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Segundo levantamento do Hospital de Infantil de Joinville, cinco pacientes já foram atendidos pela unidade com a patologia. Dessas, uma foi diagnosticada em 2013; outra em 2016; e três neste ano. A Secretaria de Estado da Saúde não tem registro do número de pacientes nascidos com a patologia em SC.
O tratamento oferecido nos hospitais é por meio de medidas de suporte, com a intervenção de uma equipe interdisciplinar para evitar complicações. A doença tem quatro níveis de gravidade, segundo o pediatra especialista em desenvolvimento infantil Guilherme Abreu Silveira.
Os graus da doença são divididos de acordo com a idade em que a patologia se manifesta. No caso da Ketllyn, a doença é do tipo 1 – o mais grave –, já que foi diagnosticada ainda nos primeiros três meses de vida.
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Medicamento traz esperança a familiares e pacientes
O novo tratamento para a doença é feito com o medicamento Spinraza, já comercializado nos Estados Unidos. O remédio é injetado diretamente na medula espinhal da criança e incentiva o gene chamado SMN-2, que produz a proteína fundamental. Em um organismo saudável, essa produção é feita pelo gene SMN-1.
No Brasil, o medicamento ainda não tem aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para ser comercializado.Apesar de a regulamentação já ter sido solicitada para órgão regulador em maio deste ano, o processo pode demorar devido aos trâmites e testes necessários para entrar no mercado. Sem o medicamento, os pacientes diagnosticados recebem o suporte clínico em unidades hospitalares.
O tratamento com o Spinraza pode trazer uma nova esperança aos pacientes com AME. A pequena Kettlyn, por exemplo, poderia viver muito além da expectativa que lhe foi dada. Segundo a mãe da menina, Indiassara da Maia, os médicos disseram que ela pode viver até os três anos, com o correto suporte hospitalar.
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Indiassara conta que uma campanha para arrecadar fundos para o tratamento com o medicamento está nos planos da família. Entretanto, neste momento, as doações serão utilizadas para obter aparelhos emergenciais, como uma cama hospitalar para o uso em casa.
– Ela vai receber alta nos próximos dias, por isso, primeiro, vamos comprar as coisas para o conforto dela em casa – ressalta.
O especialista salienta que somente a regulamentação do medicamento no País não garante o tratamento a todos os pacientes. Isso porque as doses dos remédios são caras.
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– Depois do registro, o governo federal precisaria incorporar ao Sistema Único de Saúde (SUS). Assim, o tratamento será acessível a todos – completa.
A família de Kettlyn está organizando eventos em favor da saúde da bebê e vendendo camisetas para ajudar a comprar os aparelhos. Para ajudar, basta entrar em contato por meio da página AME Kettlyn, no Facebook.
Jonatas deve iniciar o tratamento nos próximos dias
O bebê joinvilense Jonatas Openkoski é outro que luta contra a AME. Ele estava internado no Hospital Infantil havia sete meses e recebeu alta médica na última quinta-feira. A história de Jonatas ganhou repercussão nacional após os pais lançarem campanha para arrecadar dinheiro para o tratamento com o Spinraza.
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O valor necessário para o tratamento era de R$ 3 milhões e foi alcançado em maio. Agora, com Jonatas em casa, a família poderá iniciar o tratamento. O pai do bebê, Renato Openkoski, afirma que pretende fazer a encomenda do medicamento na segunda-feira, mas, para receber o Spinraza, Jonatas deverá estar bem de saúde e em casa por 40 dias.
O especialista Guilherme Abreu Silveira explica que o tratamento é vitalício. Ou seja, além das quatro doses iniciais – chamada de fase de ataque –, o paciente precisará receber outra dose do remédio a cada quatro meses para o resto da vida na fase de manutenção.Joaquim Okano Marques é outro bebê diagnosticado com a AME no País. Após intensa mobilização para arrecadar fundos para o tratamento, ele começou a receber as primeiras doses do Spinraza em abril deste ano.
– Pelos dados da literatura médica, só iremos observar a real melhora dele após a sexta ou sétima aplicação. Mas o que já deu de perceber: evolução nos movimentos de pescoço, das pernas e da boca – afirma Silveira.
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A doença tem um alto índice de mortalidade no País por não ter tratamento regulamentado. Por este motivo, existe dificuldade em compilar estatísticas que demonstrem a quantidade de doentes no Brasil. O especialista estima que em território nacional existam, pelo menos, de 2 mil a 3 mil pessoas com a doença.