A coluna de hoje traz um tema diferente, sugerido por uma leitora, que prefere não se identificar. Ela conta que estava no aeroporto de Roma, na sala da companhia aérea Alitalia. Pegou uma revista para se distrair até a hora de seu vôo. Era uma edição da Panorama, de junho deste ano. Um dos artigos chamou tanto a atenção dela que resolveu trazer a revista para casa e me enviar o texto, mesmo em italiano. Consegui uma ajuda para traduzir, e realmente conta uma história extraordinária, de um homem mais extraordinário ainda. A reportagem fala de um homem simples, na Tunisia, que recolhe os corpos dos refugiados mortos no oceano durante a travessia, dando-lhes uma sepultura digna, já que ninguém se preocupa com isso. “Tocou-me profundamente”, ela contou. Faço um resumo da história aqui por achar que vale ler. Enquanto existirem pessoas como esse moço, nem tudo estará perdido.
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“O homem que sepulta imigrantes” é o título. Quem assim o artigo é Alessandro Turci, da Tunisia. Ele abre a matéria assim: Os cadáveres trazidos pelo mar e pelo vento aqui para Zarzis , na fronteira Líbia -Tunísia, não podem, na verdade, ser considerados como tal. No Mediterrâneo vagam mutilados: cabeças, membros, às vezes troncos. Mas, mesmo se estivessem inteiros, não seriam mais reconhecíveis, porque foram privados de um direito semelhante ao da vida, que é o da identidade. É aqui que entra em cena Schams, diminutivo de Chamsedine. Chams recolhe os mortos, pede ajuda para transportar e, em um campo abandonado na periferia da cidade, cava mais uma fossa. Ali, fica o cemitério dos desconhecidos, que ele criou.
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Chamis já conseguiu um único benefício ao seu cemitério: um carro para recolher os mortos, que ainda não havia chegado ao seu destino quando o artigo foi publicado. O mar de Zarzis é percorrido por pescadores locais, na esperança de encontrar peixes, e não cadáveres. Mas muitas vezes precisam acionar Chams para levá-los e sepultá-los, todos sem nome nem identidade. Desconhecidos, como se nunca tivessem existido. Escreve o jornalista: “Estamos num palco absurdo. Mas para este espetáculo não se paga entrada. Os mortos sem nome de Chams já pagaram por todos. Até por aqueles que os esperarão em vão”.