– Tudo bem? Você tem uma linda bunda.

Foi assim, usando as poucas palavras em português que aprendeu, que Sacha Baron Cohen atendeu ZH ao telefone. Duas vezes. Na primeira, ao repórter Daniel Feix, ele falou conforme atendera os demais profissionais da imprensa escrita mundial: como o próprio comediante Sacha Baron Cohen. Na segunda, a Roger Lerina, colunista de ZH e apresentador da TVCOM, Sacha encarnou o histriônico e desbocado General Shabazz Aladeen, personagem de seu novo filme, O Ditador, em performance repetida aos demais repórteres de televisão.

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Entrevista

Sacha Baron Cohen Comediante, ator do filme “O Ditador”

Zero Hora – A construção de General Aladeen, o protagonista de O Ditador, faz referência predominantemente a Muamar Kadafi?

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Sacha Baron Cohen – Minhas inspirações foram os ditadores do Oriente Médio acima de tudo. Há figuras incríveis como o mandatário do Turcomenistão (Gurbanguly Berdimuhamedov), que tem 15 prostitutas à disposição e deixa todos confusos com suas bizarrices sexuais. A mim interessa muito este tipo de gente, que lida com o poder de uma maneira tão estúpida e tão inconcebível que ultrapassa a fronteira da responsabilidade e vira um caso de humor estapafúrdio. Kadafi me parece engraçado, além de tudo. Vários ditadores do Oriente Médio são tão ridículos que, apesar de seus atos, podem ser vistos pela via do humor.

ZH – Há algo de contraditório nisso, porque ao mesmo tempo chama atenção a tirania e a falta de humanismo deles.

Sacha – O que estes personagens têm de fascinante – como personagens, é claro – são os vícios. Aquela coisa obscura em sua mente que determina que eles não se controlem e façam algo ridículo aproveitando-se do poder que detêm. Eles são cruéis, também, e isso tem tudo a ver com sua falta de noção, mas trata-se de outro aspecto de sua personalidade. O que me interessa é o humor estapafúrdio que emana do seu comportamento.

ZH – Você chegou a ser proibido de ir à cerimônia do Oscar, este ano, vestido como o personagem de O Ditador. O fato de a indústria ter medo de você, de certo modo, significa que o humor que você propõe é bem-sucedido, não?

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Sacha – O fato de terem ficado com medo é um indício bom. Aponta que estou fazendo o que deve ser feito no sentido provocativo que o humor deve ter. Para falar a verdade, fiquei chocado com a preocupação da Academia de Hollywood. Chegaram a dizer que se eu ficasse a uma milha da cerimônia me prenderiam, que colocariam 150 agentes do FBI para me controlar, que monitorariam meus passos etc. Quando autorizaram minha presença no tapete vermelho, o fizeram sob a condição de me escoltar. Puseram vários policiais na limusine que me conduziu ao Oscar. Queriam me revistar, ver tudo o que eu levava nos bolsos. Até deram uma apalpada, mas quando desci do carro é que fariam a revista mais ampla. Eu sabia que nesta revista encontrariam as cinzas do ditador (da Coreia do Norte) Kim Jong-un (as quais foram derrubadas sobre um repórter do canal E!), então fiquei constrangendo os policiais, incitando-os a revistarem as duas strippers que acompanhavam Mr. Aladeen. Fiquei dizendo que a bomba estava com elas. Funcionou: acabaram me deixando passar sem encontrar o pote com as cinzas.

ZH – Humor deve incomodar, mas quais limites devem ser respeitados?

Sacha – O importante é deixar claro que se está pregando a liberdade. Vivemos em um mundo com medo, todo mundo teme sair às ruas, interagir com as pessoas. O humor tem de refletir este medo. É claro que há algo de respeitoso que deve se manter, mas quando é necessário para provocar discussões sobre este estado de medo que está impregnado em todos nós, sobre este jeito de viver na contemporaneidade, com tantas invasões no âmbito pessoal, aí se pode ir além.

ZH – Você merecia ao menos ser lembrado no Oscar pela excelente performance que teve como o policial de A Invenção de Hugo Cabret (2011), de Martin Scorsese. Ficou chateado de ser esquecido?

Sacha – Obrigado, mas ganhar prêmios nunca foi minha ambição – embora, não custa lembrar, eu já tenha sido indicado ao Oscar (pelo roteiro de Borat, em 2007). O que quero é fazer as pessoas rirem, fazê-las se darem conta do ridículo, ficarem chocadas com o contexto em que vivem e, em certos casos, sua própria vida. Ganhar prêmio deve ser uma consequência, não posso trabalhar pensando em ser premiado.

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ZH – Por favor, descreva a experiência de trabalhar com Martin Scorsese.

Sacha – Fantástica. É o maior diretor vivo. A maneira como ele controla o set, sabe o que faz, vislumbra como o filme vai ficar a partir de cada enquadramento, cada efeito, cada movimento de câmera, isso é incrível. Durante as filmagens de Hugo, contei a ele sobre o projeto de O Ditador. Disse que queria aprender com ele como dirigir um filme. Ele me respondeu: “Então senta aqui, terei prazer se puder ajudar”. E assim ficamos seis meses lado a lado, eu aprendendo as maiores lições que já tive sobre cinema. É sensacional a liberdade que ele proporciona aos atores e, ao mesmo tempo, o controle que consegue manter sobre eles. Mostra como o improviso é importante, sem que o diretor perca a mão. Scorsese é o maior.

ZH – Você produz, escreve e atua. Não pensa também em dirigir os filmes com seus personagens?

Sacha – Já pensei nisso. Acontece que meus filmes têm uma forma de produção diferente. Estou sempre junto, tomando todas as decisões, atuo quase como um codiretor. Mas não consigo ficar controlando enquadramentos e coisas mais técnicas, por isso opto por chamar um diretor que resolva essas coisas.

ZH – Quais são os seus próximos alvos?

Sacha – Não sei. Alguém do Brasil, quem sabe.

ZH – Quem do Brasil?

Sacha – Não tenho ninguém em mente, confesso. Não me complique…

ZH – Você vai mesmo interpretar Freddie Mercury na cinebiografia sobre o músico? Como estão os preparativos e como é a sua relação com a música do Queen?

Sacha – Sim, vou. E estou empolgado. Porém, o roteiro ainda está sendo escrito, não há muita coisa definida além do que já se noticiou. Não sei quem vai dirigir, vamos ter de esperar para ver. Mas boto muita fé neste projeto.

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Confira entrevista com Almirante General Shabazz Aladeen, personagem do filme “O Ditador”