Um emergência que poderia ter se transformado em uma tragédia para centenas de pessoas e uma catástrofe ambiental. É assim que técnicos que trabalharam na operação de combate à nuvem de fumaça provocada por reação química em uma montanha de fertilizante consideram o que ocorreu em São Francisco do Sul há dez dias. E há muito o que aprender com ela. “AN” ouviu alguns deles para formular essas sete lições

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1) Regular, prevenir e fiscalizar

Até agora há divergências entre os órgãos federais e estaduais para saber quem deveria ter a missão de fiscalizar fabricação, transporte, manuseio, armazenamento, comércio e uso de fertilizantes como o que provocou a reação química e a fumaça em São Francisco do Sul. Também não há quem saiba dizer com precisão o que há nos depósitos, que substâncias circulam pela cidade em caminhões, contêineres e vagões.

Ministério da Agricultura, Cidasc, Bombeiros, Ibama, Fatma, Secretaria Municipal de Meio Ambiente e o próprio Porto de São Francisco do Sul – além das empresas dona da carga e proprietária do depósito – terão de dar explicações nos inquéritos que já foram abertos. Cabe, a partir de agora, criar regras claras, leis municipais e estaduais para definir quem fiscaliza cada etapa. É a “burocracia do bem” que, nas palavras do prefeito Luiz Zera, deve ser posta em prática a partir de agora, sem criar amarras para o desenvolvimento da cidade, mas garantindo a segurança da população e do meio ambiente.

2) Quem faz o quê na emergência

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A ação de mais de 20 órgãos municipais, estaduais e federais durante os momentos mais decisivos da crise pode ter demonstrado muita união, mas também mostrou que não há um plano de ação prévio. Cada órgão ajudou com os recursos e a disposição de que dispunha na hora, no improviso. Prefeitura e Defesa Civil Estadual dividiram o comando sem todas as informações técnicas necessárias, tanto para o combate a um problema químico/ambiental/industrial, quanto para a evacuação em massa. É preciso que haja um roteiro prévio, determinando quem é responsável por cada parte das atribuições, nos mais variados cenários, inclusive com simulações periódicas.

3) Preparo e integração entre empresas

A ação dos técnicos da Vale Fertilizantes mostrou não apenas a importância de conhecimento técnico para ação de emergências relacionados a produtos específicos, mas trouxe à região um modelo diferente de ação para prevenção e controle de emergências. Pelo plano de auxílio mútuo, que integra as empresas da região de Cubatão (SP), funcionários e brigadistas de uma empresa têm treinamentos e conhecimentos de outras empresas da mesma região. Ou seja, é preciso preparar para que cada setor industrial da região possa interagir com os outros. Assim, emergências em áreas têxteis, metalúrgicas, químicas ou da indústria plástica podem ser combatidas conjuntamente.

4) A eterna vigilância é o preço a ser pago

Como o papel aceita tudo, é preciso pagar um preço maior, o da eterna vigilância. A apresentação de laudos, autorizações, alvarás e planos de emergência não dispensa o monitoramento frequente e a fiscalização nos locais onde estão as substâncias. A empresa pode ter toda a documentação para um tipo de material que, em seis meses ou um ano, pode ser substituído por outro. Há milhares de mercadorias que chegam todos os dias pelo Porto, pelas estradas e pela ferrovia. Além de tudo isso ser listado, é preciso que haja vigilância.

5) Conhecer e treinar

Todos as pessoas envolvidas nos trabalhos nos últimos dias em São Francisco do Sul, independentemente das instituições que representam, e até a população que acompanhou o noticiário ou discutiu o problema nos bares, escolas e no trabalho, saíram conhecendo um pouco mais sobre fertilizantes, reação química, fumaça tóxica, perigos para o ser humano e para o meio ambiente. O conhecimento técnico básico sobre os produtos que circulam na cidade e o treinamento para saber o que fazer em relação à prevenção e emergências com cada um deles deve ser uma rotina para bombeiros, integrantes da Defesa Civil, professores, trabalhadores dos terminais e técnicos.

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6 ) Evitar conflitos de zoneamento

A importância da quase interminável discussão sobre as áreas de expansão do Porto de São Francisco do Sul, áreas industriais, áreas de preservação e zonas de crescimento urbano na cidade ficou evidente durante o trabalho. Afinal, as áreas ao lado da BR-280, próximas do porto, devem ou não se tornar corredores exclusivos para terminais, fábricas e armazéns? O que fazer com a população? Contêineres e substâncias químicas podem ou não conviver com crianças saindo da escola, animais domésticos, pesca, construção civil? As respostas dependem de legislação, de planejamento urbano e, claro, de recursos para resolver problemas pontuais. O que não pode é, a partir de agora, crias novos conflitos de zoneamento.

7) Cooperação e agilidade

A lição mais positiva de todas é que não há solução possível sem cooperação e agilidade de todos os envolvidos. Os mais de 20 órgãos que participaram da operação – Defesa Civil Estadual, Defesa Civil Municipal, Bombeiros Militares, Bombeiros Voluntários, Secretaria de Meio Ambiente, Marinha, Exército, Porto de São Francisco, Cidasc, Polícia Militar, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Rodoviária Estadual, Ibama, Fatma, Conselhos Regionais de profissionais, Sindicatos, Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, Polícia Civil, Polícia Federal – mostraram que, antes de qualquer coisa, houve uma preocupação com as vidas.