Meena, de 20 anos, já foi uma garota de vila, por isso, ela reconhece as mudanças que acontecem quando garotas criadas como ela, chegam nessa cidade como estudantes e tomam seu primeiro gole de liberdade.
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Calça jeans, proibidas em casa, são enfiadas em um cantinho da mochila para uma troca de roupas no meio do dia. Um celular é adquirido e mantido em segredo.
Ela sempre lhes diz: – Você nunca sabe quem pode estar vigiando. Se chegam rumores até a vila de que uma jovem ultrapassou os limites morais da vila – pode ser algo simples como ser vista conversando com um grupo de universitários depois da aula – sua vida pode virar de cabeça para baixo em um único dia.-
-Eu digo a elas que precisamos ter cuidado-, Meena disse. -Talvez elas não saibam que alguém pode vigiá-las e relatar os acontecimentos.-
Conforme jovens indianas deixam seus lares rurais para terminar sua formação nas cidades, frequentemente as primeiras mulheres da família a fazerem isso, elas agem como universitárias de qualquer lugar, sentindo-se fora dos limites da independência. Porém, aqui na região agrícola do estado de Haryana, onde códigos morais medievais são policiados por uma rede de vizinhos e parentes, a experiência é um pouco diferente. Há sempre o perigo de alguém estar, discretamente, coletando informações.
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O velho e o novo estão, frequentemente, batendo de frente um com o outro na Índia, mais rigidamente em lugares como Haryana, um estado em grande parte agrícola, e conservador perto de Nova Deli, cujos moradores podem transitar 32,2 km para trabalhar em clubes noturnos e prédios de escritório. Todavia, suas vilas natais são lugares pacatos, cujas ruas principais são patrulhadas por brilhantes e pesados búfalos pretos asiáticos.
As vilas são comandadas por khap panchayats, conselheiros homens não-eleitos, que impõem um forte controle sobre a vida social, incluindo o comportamento das mulheres. Esse trabalho torna-se muito mais difícil uma vez que as mulheres deixam a cidade. Quando um líder khap listou as lojas da cidade que permitiam que mulheres guardassem seus celulares e trocassem suas roupas por roupas ocidentais, outro deles sugeriu posicionar informantes com máquinas fotográficas do lado de fora das lojas para obter evidências fotográficas conforme as mulheres fossem e voltassem.
Om Prakash Dhankar, líder khap que expressou seu apoio para esta abordagem, diz que medidas como essas protegeriam as jovens de perigos muitos maiores que poderiam acontecer se elas cultivassem, livremente, amizades com homens.
– O celular tem um papel crítico- , disse ele em uma entrevista. -Você ficaria surpreso de saber como isso acontece. Uma garota senta no ônibus, liga para um amigo, pede a ele que coloque créditos no seu celular. Ele vai colocar créditos no celular dela de graça? Não. Ele vai encontrá-la em certo lugar, com mais cinco amigos, e eles vão chamar isso de estupro.-
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Na geração passada, as mulheres daqui viviam em um completo isolamento dos homens, e só podiam aparecer em público usando um tecido leve que cobrisse completamente sua cabeça e rosto. Embora essa tradição esteja desaparecendo, muitas mulheres ainda não podem sair de casa sem a permissão do pai ou marido.
Os khaps de Haryana focam muito de sua energia na defesa de uma única proibição antiga: não é permitido que homens e mulheres se casem com pessoas da mesma vila. A interpretação local de antigos textos hindus diz que os moradores da mesma vila são como irmãos e irmãs, tornando sua união incestuosa. Os jovens desafiam a proibição muito raramente, mas aqueles que o fazem, às vezes, são assassinados por uma gangue de parentes homens. Por mais que os khaps condenem essas “mortes honrosas”, eles tratam com a mesma rigidez a prevenção desses romances, uma tarefa que envolve um controle rígido sobre as mulheres.
Meena, que deixou sua vila há vários anos para escapar de um casamento arranjado, disse que as jovens dali morrem de medo dos idosos no khap, que investigam seu comportamento e emitem um fluxo constante de críticas. As críticas, por sua vez, amedrontam os pais, que temem ser condenados ao ostracismo.
-Eles dizem: ‘Por que sua filha está andando pela vila com a cabeça descoberta?’-, disse ela. -Se você anda com a cabeça erguida, eles dizem: ‘Olhe para baixo, para o chão, não faça contato visual. Não tenha conversas irrelevantes’.-
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Se a influência deles se estende às universitárias em Rohtak, uma das maiores cidades de Haryana, ou não, é outra questão.
Recentemente, conforme as jovens saíam aos montes pelos portões da Universidade Maharishi Dayanand, descendo a rua sob a luz dourada do entardecer, elas descreveram a química que acontece quando as jovens mulheres da vila se misturam com alunos de cidades grandes. Algumas começam romances ilícitos, algo completamente proibido em casa. No entanto, para muitas, as mudanças são modestas.
– Nas cidades, as garotas têm celulares porque os pais lhe dão mas, na vila ninguém nos dá celulares- , disse Sunita Meham, de 23 anos. – Ela vem para a faculdade e vê outras pessoas usando celulares, então ela também quer usar um. Se os pais concordam, e se os amigos não param de ligar naquele celular, eles perguntam: ‘Por que você tem tantos amigos?’. Para evitar todas essas perguntas, ela tem um celular secreto.-
Satish, que tem uma lojinha de xerox perto da faculdade, disse que os khaps estão simplesmente muito distantes para monitorar o comportamento dos alunos. Os celulares são, frequentemente, trocados como presentes e mantidos como segredo para a família, disse ele. “Geralmente”, contou, “todo mundo aqui tem, pelo menos, dois celulares”.
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Sonal Dangi, de 20 anos, deu de ombros para a conversa sobre controles mais rígidos. As mudanças sociais tomaram conta de Haryana, disse ela, e não podem ser impedidas.
– Tudo tem seu lado positivo e seu lado negativo”, disse ela. “Entretanto, eles não podem impedir.-
Em contrapartida, outros foram bem mais cautelosos. Os árbitros morais da vila têm informantes em todo lugar, disse Meena. Os policiais frequentemente trabalham com os khap, segundo alguns. Um jovem homem da mesma vila pode avisar a família de uma mulher se a vir andando com um homem, dizem outros. Assim como o motorista do riquexó que a levou até a cidade.
Mesmo entre os khap panchayats, pareceu haver pouco consenso em como, ou se deve-se, vigiar as jovens mulheres longe de casa. Em entrevistas, muitos líderes khap locais zombaram da ideia de Dhankar de colocar unidades de vigilância em lugares onde as jovens trocam de roupa, tirando os tradicionais trajes esvoaçantes.
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Não obstante, Dhankar não se deixou intimidar, dizendo que as fotos poderiam ser mostradas para os pais das garotas, ou para policiais amigos, que poderiam ameaçar dar queixas falsas a menos que comportamento mudasse. Dhankar disse que grandes perigos são esperados quando uma jovem mulher esconde segredos da família.
-Começa com uma pequena mentira-, disse ele. -Depois, elas começam a pedir dinheiro emprestado e outras coisas ruins. O resultado é que ela cometerá suicídio ou alguém a matará.-
Conforme ele explicava isso, sua filha, professora de ciências no ensino médio, na casa dos 40 anos, entrou na conversa com uma opinião vigorosamente divergente, e Dhankar admitiu, alegremente, que as mulheres da casa geralmente ignoram o que ele diz.
Com um tom mais sério, ele disse também que foi um equívoco ver qualquer colisão de interesses entre mulheres jovens e os tradicionalistas da vila. Eles estão, segundo ele, jogando no mesmo time.
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– Contanto que a garota viva dentro dos códigos morais, ela pode ter quanta liberdade quiser- , disse ele. -Se elas forem atrás de casos amorosos ou mais liberdade, então serão mortas.-