Para o ex-presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL) e consultor sênior em infraestrutura e logística Bernardo Figueiredo, Santa Catarina deveria adotar um modelo de Parceria Público-Privada para recuperar as rodovias no Estado. Segundo ele, “não há nenhuma experiência no mundo de infraestrutura que foi feita 100% pela iniciativa privada”. Confira a íntegra da entrevista:
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Governo de SC quer privatizar rodovias estaduais a partir de 2018
O modelo brasileiro de conservação de rodovias claramente não deu certo. Por que chegamos nesse estágio em que o Estado não consegue prover essa manutenção?
Há uma questão de fundo que é a situação fiscal do Estado. Desde os anos 1980, com a recessão, o Brasil investe pouco em infraestrutura. Nunca vivemos um período prologando com situação fiscal folgada. Eu trabalho há 45 anos só com transporte e não vivi uma época dessa. A concessão é uma tentativa de buscar um caminho para isso. Mas as pessoas também precisam se informar, porque a concessão não é uma coisa mágica que resolve tudo. Não há nenhuma experiência no mundo de infraestrutura que foi feita 100% pela iniciativa privada. Você pega as concessões do Chile, Colômbia, do México, da França e da Espanha e todas têm uma forte participação de recursos públicos. A gente tenta buscar um modelo em que o pedágio seja suficiente para não precisar do poder público. Nós temos uma das maiores malhas concedidas do mundo e está todo mundo trabalhando para ampliar esse instrumento, porque é um bom instrumento. Eu trago para a gestão da rodovia, a eficiência, a competência e a agilidade da iniciativa privada, que é muito maior que a do setor público. E tem que ser dessa forma mesmo.
Mas por que o governo chegou nesse ponto?
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Porque ele não tem dinheiro para gastar. A gente achava que não precisava. Quantas vezes você ouviu nos últimos meses que o governo precisa enxugar o quadro? Mas até 2007 o DNIT não tinha engenheiro. Quando você terceiriza a fiscalização, cria-se um ambiente muito ruim. Você cria uma promiscuidade que acaba gerando outros tipos de problemas. Então a gente não tinha dinheiro para investir e achava que poderia desaparelhar o governo que a iniciativa privada faria tudo. O próximo passo é descobrir que não existe essa mágica de o setor privado fazer tudo. O pedágio também não é um instrumento que resolve e financia tudo. O usuário tem um limite. A conclusão é a seguinte: temos que trazer o Estado para dentro do processo.
Como motivar essa integração?
O primeiro passo é ter consciência de que eu preciso do Estado, de que a iniciativa privada não dá conta de tudo. O que você faz quando tá apertado e tem uma boa ideia para ganhar dinheiro? Faz um financiamento, se endivida. Daqui a pouco você paga o empréstimo e tem uma vida muito melhor. O Brasil precisa acreditar nisso. Se eu fizer uma infraestrutura competente ligando, por exemplo, a área produtora de milho do Centro-Oeste com o setor de frangos e porcos de Santa Catarina, eu vou fazer com que se aumente a produção e também a minha arrecadação de impostos lá na frente. É preciso ter essa inteligência, de saber qual o investimento que eu faço hoje que vai me dar mais retorno lá na frente. Mas não existe mágica. É preciso saber que se tem um déficit enorme, mas pode se ter também um projeto que vai fazer esse país explodir, com toda a área produtiva do Centro-Oeste.
Mas diante desse cenário a concessão é uma solução possível?
A concessão é um instrumento, não uma solução. Porque se o cara não fizer nada, a estrada vai continuar a mesma. A solução é investir, mas o Estado sozinho não consegue. Por outro lado, para ter um pedágio razoável, é preciso tirar todo o investimento. Tem se falado em pedágio apenas de manutenção. Mas será que ele é capaz de reduzir o custo de produção? Esse é o problema.
O senhor sugere uma parceria público-privada (PPP).
Tem que ser.
O diretor-geral do DNIT praticamente descartou novas PPPs por conta de problemas nas BRs-163 (MT) e 050 (MG).
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Temos que enfrentar nossos problemas com realismo. Na BR-163, ocorreu uma enorme frustração de tráfego. Existia uma expectativa de tráfego e logo em seguida o Brasil entrou no buraco. Esse fato provocou um desequilíbrio que impediu a concessão de fazer o que tinha sido previsto. Não é falta de maturidade ou qualquer coisa. Se eu faço um diagnóstico ruim, provavelmente vou ter um resultado ruim. É preciso pensar o que leva isso. Será que os estudos são bem feitos?
Tudo depende de bons estudos?
O segredo da eficiência, tanto no setor público quanto no privado, está na consistência do preparo para realizar determinada ação. Uma ponte, por exemplo. Sem um estudo bem feito, ela pode custar o dobro do que eu previa.