O antigo debate sobre o repasse da gestão do Teatro Álvaro de Carvalho (TAC) para o Sesc entrou na pauta da última reunião do Conselho Estadual de Cultural (CEC), no dia 2 de fevereiro. Localizado em prédio histórico no Centro de Florianópolis, o TAC é um dos mais antigos de Santa Catarina e é administrado pelo governo do Estado, via Fundação Catarinense de Cultura (FCC). Há pelo menos dois anos o Sesc – Instituição privada mantida por empresários do comércio – manifestou interesse em administrar o espaço. Com base nisso o governo do Estado elaborou projeto de lei que faria a concessão por 20 anos do equipamento cultural à iniciativa privada. O CEC agora tem até 45 dias para se posicionar positiva ou negativamente sobre a minuta, que depois segue ainda tramitando na Casa Civil e na Assembleia Legislativa.
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O Conselho é responsável por discutir, deliberar e propor ao secretário de Estado de Turismo, Cultura e Esporte (SOL) as diretrizes da política de desenvolvimento da cultura no Estado. A presidente da entidade, Roselaine Vinhas, informou que ainda não há nenhum posicionamento oficial. Durante a última reunião, que teve a participação de sete pessoas da sociedade civil, os conselheiros discutiram o tema e optaram por criar uma câmara especial, formada pelos presidentes das câmaras de cada área – música, patrimônio, cinema, dança, folclore e artesanato, artes visuais e arte-educadores – e que vai trabalhar focada em sanar todos os questionamentos acerca do projeto de lei, entre benefícios e malefícios de passar a gestão do TAC para o Sesc.
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– Tem muitas coisas em jogo. Entre as dúvidas estão as razões do governo para passar a gestão para o Sesc, como eles trabalhariam, o que mudaria. Esse debate é antigo. Vamos levantar esse histórico. Representamos tanto o governo quanto a sociedade civil e precisamos sanar todas as dúvidas antes de qualquer posicionamento – disse.
O Sesc manifestou-se apenas por nota oficial divulgada pela assessoria de imprensa em que afirma que a parceria com o governo do Estado permanece em negociação.
“Em Santa Catarina, a instituição é a maior rede de difusão artística da produção local e nacional de artes visuais, teatro, dança, música, cinema e literatura e também o maior promotor de circulação de espetáculos. Além disso, mantém galerias de arte, uma extensa rede de bibliotecas e uma grande variedade de cursos de artes em diversas áreas”.
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A nota informa ainda que a intenção é que o TAC tenha uma programação permanente, valorizando a cultura local e nacional. Para a curadoria, a ideia é criar uma comissão de pauta, integrada por colaboradores do Sesc e profissionais especialistas na área convidados. Além disso, a instituição estará aberta para receber as propostas dos artistas, que serão avaliadas periodicamente para compor a programação.
O documento acrescenta que “todas as ações do Programa de Cultura do Sesc devem ser pautadas pela qualidade artística, caráter inovador e viés educativo, priorizando trabalhos autorais e de pesquisa de linguagem, evitando a reiteração de conceitos estabelecidos por trabalhos de estéticas meramente comerciais e já com grande inserção na mídia de massa. Os artistas locais serão valorizados e melhorias na política de seleção dos trabalhos implementadas”.
Procurado pelo Diário Catarinense para esclarecer dúvidas como quais seriam as contrapartidas para o público e artistas locais e a razão do interesse pelo prédio e não reformar o próprio ou construir outro, por exemplo, mas a instituição optou por não se manifestar.
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PRÉDIO DO TAC FOI INAUGURADO EM 1875
O prédio onde funciona o Teatro Álvaro de Carvalho foi inaugurado oficialmente em 1875, inicialmente com o nome de Teatro Santa Isabel, e é administrado pela Fundação Catarinense de Cultura (FCC). A última grande reforma foi em 2003. Segundo a assessoria de comunicação da FCC, de lá para cá reparos são feitos periodicamente para a manutenção do prédio, que é antigo e necessita de atenção constante. No ano passado foram colocadas poltronas no balcão do teatro, com a reabertura do espaço que comporta 92 espectadores, além da revisão do cabo e lâmpadas do lustre principal que fica acima do público.
– Em janeiro foi feita uma série de reparos na parte interna do prédio, como a substituição das passarelas e escadas de madeira sobre o palco (usadas para o acesso de trabalho dos técnicos), limpeza e pintura do palco, conserto de pequenos vazamentos no telhado, manutenção geral nos equipamentos de luz e som do palco e parte elétrica, além da limpeza e revitalização do porão, com a colocação de exaustores e ventilação.
O QUE PENSAM OS ARTISTAS?
“Esse debate é antigo. É inegável que o Sesc no Brasil é um dos pilares que sustenta a cultura, um papel que o Estado não faz. Então quando se pensa em passar a gestão para eles, a impressão que se tem é que administrariam melhor que o governo. Mas o TAC é público, e o Sesc é uma instituição privada. O acordo deveria exigir melhorias, então se imagina que o Sesc não teria interesse se fosse uma concessão curta, porque é investimento alto e que leva tempo. A grande questão é que o TAC é utilizado e muito pelos artistas da cidade e comunidade, mediante pedido de pauta. Se a gestão for do Sesc, eles poderão ocupar conforme a lógica deles. É uma decisão política e que decreta a incompetência do Estado. Quem perderia não seria o público, mas os artistas, até porque o Sesc tem uma política de gratuidade de espetáculos que corrobora para a cultura de que não é preciso pagar por arte.”
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Barbara Biscaro, atriz e membro da Setorial Permanente de Teatro de Florianópolis
“Acho ótimo que o Sesc tenha seu teatro aqui. O atual é pequeno. Em São Paulo, o Sesc tem mais de 15 teatros. Já aqui temos uma carência de espaços. Se eles têm interesse em ter um local maior isso é salutar. Teremos mais uma opção. Porém, em outros lugares do país, o Sesc nunca se preocupou em pegar espaços da prefeitura ou do Estado. Além do mais, a política de pagamento aos artistas do Sesc é muito aquém.”
Júlio Maurício, produtor e diretor de teatro
“O Sesc preenche uma lacuna grande de circulação de espetáculos. Uma coisa que o MinC deveria fazer. Mas esse projeto é diferente da função que o Sesc tem. O TAC é um espaço que a comunidade usa. E o Sesc não tem essa função. Ficaremos dependentes da curadoria do Sesc, e essa curadoria poderia fechar as portas para os grupos locais. O Estado é que tem a responsabilidade de cuidar.”
Nazareno Pereira, ator e produtor de teatro
“Não é simplesmente ser contra ou a favor. É cuidar para alavancar esta pauta de forma democrática. Estamos falando de um patrimônio público. Um bem comum que guarda nossa identidade, nossa história, onde desenvolvemos nossa produtividade e abrigamos nosso público. Entendo que nos últimos tempos nossa administração pública se porta de forma irresponsável e leviana no geral e vem promovendo um desmanche no setor cultural. O que precisamos é estar presentes, exigir explicações, motivos, pressionar para encontrar alternativas e não deixar à revelia. Além disso, 20 anos é tempo demais e muito embora não negue a competência do trabalho que o Sesc desenvolve em nosso Estado, no meu ver precisamos é de mais espaços, mais apostas e parcerias para o setor.”
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Tatiana Cobbett, cantora e bailarina