Os amigos Arthur Estevão e Eduarda Perotto, ambos de quatro anos, desenhavam empolgados em folhas sulfites, usando canetinhas e lápis de cor, o que eles imaginavam que seria um parque ambiental e uma área de lazer. O parquinho infantil foi unânime. Eduarda ama balanços. Arthur apostou num lugar para andar de skate e bicicleta. E assim eles foram sonhando e colocando no papel um pouquinho do que lhes traz felicidade. O mais emocionante é que este lugar pode se tornar realidade.

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Moradores do Morro das Pedras, no sul da Ilha, os dois pequenos não foram os únicos que usaram o feriado de 7 de setembro para sentar numa cadeira, refletir e desenhar. A iniciativa partiu da Associação Comunitária do bairro, que trouxe esta experiência pela primeira vez a Santa Catarina. A proposta, que já foi realizada em Minas Gerais, é fazer com que a sociedade civil pense num projeto de parque para sua comunidade e apresente ao poder público.

— Queremos inverter os papéis. Ao invés do poder público fazer um parque e entregar, sem atender todas as necessidades da comunidade, nós vamos cumprir este papel ao entregarmos pronto um projeto. A ideia no Morro das Pedras é fazer um link entre o parque ambiental, a praia e a Lagoa do Peri, pensando ainda em melhorar a mobilidade do bairro — explicou o presidente da associação, André Luiz Vieira.

O momento foi chamado de Viradão Criativo. As portas da associação foram abertas às 15h do feriado e só se fecharam por volta de 10h desta sexta-feira. Ali se reuniram mais de 250 pessoas interessadas em opinar sobre a estrutura do parque — respeitando, é claro, como enfatiza o presidente, a área de preservação permanente (APP). Além disso, outras cerca de 400 crianças, de escolas da região, também enviaram seus desenhos.

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Enquanto os participantes desenhavam, por um telão eles tinham acesso a uma imagem de satélite da área verde, onde se delimitava certinho a área que poderia ser construída e a APP. O parque tem 100 mil metros quadrados, explicou André, mas a área de lazer, por exemplo, ficaria apenas em uma pequena parte, no que seria a entrada do parque, na Rua Sagrado Coração de Jesus.

Durante a noite, os desenhos foram finalizados e as sugestões começaram a ser analisadas por todos os moradores participantes. A partir daí, um grupo de arquitetos, tanto de Florianópolis como de outros estados do país, começou a desenhar — profissionalmente — as ideias. O trabalho durou toda a madrugada.

— Saímos com um projeto pronto para um mirante no parque, por exemplo, feito pelos arquitetos — detalhou André.

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Ao final do viradão, às 9h30min desta sexta, foram entregues mais de 150 páginas de ideias e laudos técnicos ao prefeito em exercício, João Batista Nunes. Até a próxima semana, a Associação Comunitária também irá entregar o projeto técnico, formalmente, em forma de ofício, à prefeitura, para que sejam obtidas as autorizações legais para a viabilização da ideia.

— É uma ideia muito interessante a comunidade se organizar e realizar projetos neste sentido, do jeito que ela deseja. A prefeitura já está, inclusive, procurando parcerias público-privadas para conseguir investimentos para a estrutura se tornar realidade — sinalizou o prefeito em exercício.

De acordo ainda com André, a associação já recebeu manifestações positivas de empresários da região que querem “patrocinar” a criação do parque.

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Coisa de profissional

A ideia do projeto estava sendo amparada por gente com muito conhecimento. Eram biólogos, antropólogos, sociólogos, arquitetos, ambientalistas. Todos os tipos de preocupação foram levados em consideração pelos profissionais. O objetivo é que não sejam criados empecilhos e que o projeto saia do papel do jeito que a comunidade escolheu.

Os biólogos Marco Perotto e Juliane Schmidt, por exemplo, realizaram um amplo estudo onde catalogaram todas as espécies de existentes na região do futuro parque. Foram encontradas 88 espécies, sendo sete tipos de plantas exóticas (como pinus, eucalipto) e uma até ameaçada de extinção: o cedro. Lembrou ainda que a área serve de morada para dezenas de pássaros, e que o espaço poderia ainda ter uma área de contemplação para as aves.

— Encontramos árvores de oito a 12 metros. Para não danificar esta área, a sugestão é fazer uma trilha no entorno do parque, e usar a zona de transição, onde ficam árvores que não são nativas, por exemplo, para prática de arvorismo — opinou o biólogo.

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O arquiteto Evandro Andrade ainda sugere uma área para unir o parque com um terreno onde hoje fica a Comcap Sul. O espaço poderia incentivar a reciclagem, a criação de hortas comunitárias e a compostagem — práticas que disseminassem o objetivo da preservação ambiental entre moradores, e principalmente, entre as crianças.

Ideias a serem levadas em consideração

O editor de áudio e vídeo Everton Santos, 22, e coleguinha Fabrício Gomes, de 12, pensaram numa concha acústica para o futuro parque, numa quadra para a prática de vários esportes, e numa concha de bocha para os mais velhos. Everton ainda sugeriu uma área para plantio de mais mudas de árvores nativas. Coisa linda, não?

A área para apresentações culturais foi acatada pelos moradores, e está entre as demandas pedidas para a área de lazer do parque. A comunidade local ainda optou em priorizar uma área para hortas, uma casa para a o ensino de educação ambiental, um “cachorródromo”, um pórtico, um prédio para a administração do parque. Até um teleférico está sendo levado em consideração, que uniria o morro da caixa de água do bairro ao futuro mirante — outra sugestão para o local. Uma área para uma feirinha também foi pensada. E claro, pontos de lazer ao longo de toda trilha do entorno do parque e a criação de decks para andar entre as árvores que ficam na área de APP.

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— As crianças sugeriram ainda um muro de escalada e área para tirolesa. A comunidade ainda sentiu a necessidade de melhorar os serviços públicos. Hoje, a Comcap ocupa 1/4 de seu terreno, e acreditamos que uma parte dele poderia ser usado para a criação de uma unidade de saúde, delegacia ou um centro de referência social — explicou o presidente da associação.

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