Todos os dias, fazemos entre seis e dez decisões financeiras. Para fazer a escolha mais sábia, é preciso conhecer a própria condição financeira. Saber quanto entra e quanto sai por mês. Planejar, investir. E se engana quem acha que educação financeira é só para quem ganha muito dinheiro.
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– Por que vou controlar o meu orçamento se ganho tão pouco? É exatamente por isso que tenho que controlar. Porque se não controlo o dinheiro, é o dinheiro que vai controlar a gente – diz Leandro Koerich, o Leo K, empreendedor, palestrante e escritor.
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A nossa história ajuda a entender como o brasileiro lida com o dinheiro. A hiperinflação se arrastou entre os anos 1980 e 1990, gerando até o confisco das poupanças. A instabilidade da nossa economia e o “descrédito com o poupar” construíram o comportamento de algumas gerações. Agora, os mais novos, que nasceram em anos mais estáveis, querem fazer diferente.
– No nosso processo de lida com dinheiro, de entendimento sobre o universo do dinheiro, existe um período muito importante, que é chamado de “socialização econômica”, são os nossos primeiros sete anos, onde a gente observa, compreende e introjeta mesmo, e acaba sedimentando uma maneira de encarar o dinheiro. Você provavelmente vai replicar de alguma forma essa visão sobre o dinheiro para o seu contexto – explica Thiago Godoy, especialista em educação financeira.
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E para mudar esse comportamento, o dinheiro tem que ser assunto nas escolas, tem que chegar na mesa de jantar, nas rodas de conversa, no bar. Mas é um tema espinhoso. Segundo uma pesquisa do banco Wells Fargo, dos Estados Unidos, debater sobre dinheiro é mais difícil do que falar sobre morte, religião, política e sexo. É um tabu. E o que acontece quando um assunto é varrido para debaixo do tapete? Vira um problemão.
– Talvez porque o dinheiro seja um assunto tratado de forma pesada entre as pessoas, porque ter dinheiro ou não ter pode trabalhar com emoções, autoestima, senso de valorização e senso de valor que a pessoa pode atribuir a ela e outras pessoas, com a sensação de sucesso ou insucesso. Então, é um pouco mais profundo – pondera Godoy.
– A gente traz muito dos nossos valores pessoais junto com o dinheiro. O dinheiro está para trazer abundância, mas em alguns momentos ele também traz o sentimento de escassez, ainda mais num país tão desigual como o nosso. A gente precisa entender que o dinheiro não é só a matemática, não é só um número jogado. Muitas vezes a conversa sobre dinheiro vai tocar em pontos importantes para uma convivência – reforça a economista Graziela Sabatini.
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Historicamente, o catarinense sabe administrar bem as finanças. O Estado aparece no topo do ranking entre as unidades da federação com menos endividados e inadimplentes.
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– O endividamento é um importante termômetro sobre a saúde financeira dos catarinenses, que sinaliza a capacidade de consumo das famílias – avalia o vice-presidente da Fecomércio SC, Emílio Rossmark Schramm.
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Mas dois comportamentos acendem um alerta. O primeiro é o tipo da dívida da população: o cartão de crédito, o maior vilão das finanças. O segundo é a parcela da renda comprometida com dívidas.
– A gente pode se endividar, mas é bom sempre manter o controle, para que a gente tenha um bom percentual do nosso orçamento para fazer o consumo do dia a dia, ter disponível pra uma emergência, trabalhar com esse valor e não ter a renda comprometida tão alto com endividamento – comenta o superintendente da Fecomércio-SC, Renato da Silva Barcelos.
Exemplo da família e educação são importantes nas finanças
Dentro de casa, não é comum falarmos sobre dinheiro. Trocamos presentes, contamos sonhos, mas planejamento financeiro dificilmente vai à mesa. E essa falta de comunicação geralmente é o que faz o trem financeiro descarrilar.
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– A saúde financeira começa primeiro na comunicação, entender quais são os gatilhos de compra, quais são os sonhos, os planos e integrar a família, todos os indivíduos dessa família para que a gente consiga ter um planejamento sustentável desse orçamento e desse dinheiro que todo mundo traz para dentro de casa – defende a economista Graziela Sabatini.
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Para os especialistas, o problema começa na falta de controle. Toda a família deve saber responder a essas perguntas: Quanto entra e quanto sai? Para onde vai o dinheiro da casa? Quais são as contas fixas? Quanto se gasta com supermercado, lazer, saúde, educação?
Para exemplificar, Graziela usa um termo da literatura de planejamento financeiro, a “fotografia financeira”:
– Ela tira uma foto daquele momento, para entender onde que (o dinheiro) está, quanto que deve, quanto que sobra, quanto que falta no mês, onde que precisa cortar, e isso só começa quando os indivíduos estão dispostos a anotarem. E quando coloca no papel enxerga que o caminho lógico vai ser mais trabalhoso, mas é o caminho mais fluido de percorrer – explica a especialista.
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O empreendedor Leandro Koerich completa:
– Se a gente consegue aprender a viver com menos do que ganha, vai sempre sobrar dinheiro. A gente tem que adotar um padrão de vida, um estilo de vida um pouco que seja um pouco abaixo do que a gente ganha. Porque senão o dinheiro acaba sendo dor de cabeça. E dinheiro não é dor de cabeça, dinheiro é solução. A gente tem que fazer do nosso dinheiro solução.
Os últimos dois anos foram desafiadores financeiramente para a maioria das famílias. Tem muita gente no vermelho. Por isso, a prioridade sempre deve ser acabar com as dívidas que consomem parte do orçamento, para depois começar a pensar numa nova vida financeira saudável. E quando chegar no azul, a regra é organização.
– O interessante é que o consumo da família fique na média de 55% do orçamento. A gente tem a questão do lazer, de outros consumos fora o consumo de sobrevivência que seria interessante em torno de 10%. O investimento para o próprio conhecimento, seja ele educação, cursos, nessa área, e também o percentual para investimento. A partir do momento que faço meu orçamento e vi que está sobrando tanto, se essa sobra equivaler a 1% do orçamento, no próximo mês você já vai guardar 1% do orçamento – explica a economista Graziela Sabatini.
Cada família vai encontrar a melhor maneira para se organizar. A cozinheira Tatiana de Souza e o marido trabalham. Por isso, as contas de casa são divididas:
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– Meu marido ganha um tanto, eu ganho outro, e a gente compartilha. Por exemplo, tem a prestação do carro, alimentação, gás, água – diz Tatiana.
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Esse diálogo entre o casal é um exemplo muito construtivo para Maria Júlia, filha deles.
– Uma criança de sete anos, ela não lida com o dinheiro, mas ela entende a dinâmica do dinheiro observando os pais. Se você foi criado num lar onde os pais procuravam por ofertas, comparavam preços e tomavam decisões mais pautadas em relação a consumo, você vai ter uma forma de olhar para o dinheiro. Se você nasceu num lar ou quem criou você era mais impulsivo, imediatista e descontrolado, você provavelmente vai replicar de alguma forma essa visão sobre o dinheiro – destaca o especialista em educação financeira Thiago Godoy.
Educação financeira nos bancos escolares
As escolas também têm conquistado um papel cada vez maior no processo de aprender a lidar com o dinheiro. O Ministério da Educação lançou um programa de capacitação de professores em educação financeira em 2021. Em três anos, a expectativa é formar 500 mil professores que poderão levar o ensinamento até 25 milhões de alunos. Algumas escolas em Santa Catarina já se adiantaram.
– A gente está estudando sobre guardar dinheiro, economizar para comprar o que precisa no futuro – diz a pequena Leandra Brolessi, de oito anos, que estuda em uma escola de Florianópolis que trabalha a educação financeira.
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– É o momento em que eles começam a se questionar principalmente quando a gente trabalha a quantidade e o valor. Achamos isso muito importante para que eles consigam entender essa relação – completa a professora Claudiane da Silva Perpétuo.
Sempre de olho no futuro, até para saber o que fazer quando o primeiro salário cair na conta. A Juliana da Silva Severo é jovem aprendiz, e comenta sobre essa experiência:
– Foi uma felicidade imensa quando o primeiro salário… Se eu não me engano, eu gastei com uma pizza, coisa que eu queria muito, muito gastar. Mas todo mês tento guardar um pouco, nem que seja R$ 10 ou R$ 20 – lembra.
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Juliana ajuda com as contas de casa e sonha com a independência financeira:
– Estou guardando na minha conta e futuramente pretendo investir, mas ainda não sei no quê.
Educação financeira em tempos de crise
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