*Por Gretchen Reynolds

O exercício físico pode ajudar a mudar, de maneiras surpreendentes, o cérebro daqueles que o praticam, de acordo com um novo estudo de atividade física e saúde cerebral. A pesquisa, que incluiu ratos e humanos, descobriu que o exercício leva o fígado a bombear uma proteína pouco conhecida, e que elevar quimicamente os níveis dessa proteína em indivíduos fora de forma rejuvenesce o cérebro e a memória de animais idosos. As descobertas levantam questões intrigantes sobre se, algum dia, os benefícios do exercício para o cérebro estarão disponíveis em forma de cápsula ou seringa – essencialmente um “exercício em pílula”.

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Já temos evidências consideráveis, é claro, de que a atividade física protege o cérebro e a mente dos declínios que acompanham o envelhecimento. Em estudos anteriores com roedores, os animais que corriam sobre rodas ou esteiras produziram novos neurônios, e seus índices de aprendizado e memória foram superiores aos dos ratos sedentários. Da mesma forma, as pessoas idosas que começaram a andar para fins de pesquisa viram um aumento de volume de tecido em áreas do cérebro associadas à memória. Mesmo entre os mais jovens, quem contava com uma forma física melhor entre seus pares tendia a ter um melhor desempenho nos testes cognitivos.

Muitas questões, porém, permanecem sem resposta. Por exemplo: como, em nível celular, o exercício remodela o cérebro e altera sua função. A maioria dos pesquisadores suspeita que o processo envolve a liberação de uma cascata de substâncias no interior do cérebro e em outras partes do corpo durante o exercício e depois dele. Essas substâncias interagem e iniciam outras reações bioquímicas que acabam mudando a aparência e o funcionamento cerebral. Mas há pouca clareza em relação a quais seriam as substâncias, onde elas se originam e como se encontram e se misturam.

Para o novo estudo, publicado neste mês na “Science”, os pesquisadores da Universidade da Califórnia, em San Francisco (UCSF), decidiram examinar a mente e o fluxo sanguíneo de ratos. Em pesquisas anteriores do mesmo laboratório, os cientistas injetaram sangue de roedores jovens em indivíduos mais velhos e observaram melhorias no funcionamento mental desses animais. “Foi como transferir uma memória da juventude por meio do sangue”, define Saul Villeda, professor da UCSF, que conduziu o estudo com suas colegas Alana Horowitz e Xuelai Fan, entre outros.

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Esses benefícios foram resultado da pouca idade dos animais doadores, mas não de seus hábitos de exercício. Os cientistas suspeitavam que o exercício provocaria mudanças adicionais na corrente sanguínea que poderiam ser transferidas, independentemente da idade de um animal.

Por isso, como um primeiro passo no novo estudo, eles fizeram com que ratos jovens e idosos corressem por seis semanas, e depois realizaram transfusões de sangue dos dois grupos em animais idosos e sedentários. Posteriormente, os ratos idosos tiveram melhor desempenho nos testes cognitivos do que os outros igualmente idosos, independentemente de a transfusão ter vindo de jovens corredores ou velhos. Também mostraram picos na criação de novos neurônios no centro de memória de seu cérebro. Era a atividade dos doadores que importava, não sua idade.

Intrigados, os cientistas começaram a descobrir o que diferenciava o sangue dos praticantes de exercícios. Usando espectrometria de massa sofisticada e outras técnicas, eles separaram e enumeraram várias proteínas no sangue dos animais que corriam e que não eram vistas em profusão semelhante no sangue de ratos inativos.

Eles então se concentraram em uma proteína pouco estudada, conhecida como GPLD1 (cujo nome científico é longo e impronunciável). Sabe-se que essa proteína um pouco misteriosa é produzida principalmente no fígado, um órgão que normalmente não se imagina ter muita interação com o cérebro. Mas os níveis da proteína foram elevados o suficiente depois do exercício para justificar novas investigações.

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Assim, os pesquisadores passaram a empregar engenharia genética para amplificar a liberação de GPLD1 a partir do fígado de ratos inativos e velhos. Posteriormente, esses animais tiveram desempenho quase igual ao de ratos jovens em testes de aprendizado e memória, e o cérebro deles fervilhava com muito mais neurônios novos do que o de outros ratos idosos. Na prática, eles obtiveram os benefícios cerebrais do exercício sem o esforço de realmente se exercitar.

Para garantir que essa reação não fosse puramente baseada em roedores, os cientistas também verificaram o sangue coletado de pessoas idosas. Os homens e as mulheres mais velhos que costumavam caminhar para se exercitar apresentaram níveis mais altos de GPLD1 em sua corrente sanguínea do que aqueles que não o faziam.

O resultado combinado das descobertas indica que o exercício melhora a saúde do cérebro, em parte, levando o fígado a bombear quantidades extras de GPLD1, acredita Villeda, embora ainda não esteja claro como a proteína muda o cérebro. Experimentos subsequentes dos cientistas mostraram que a proteína provavelmente não rompe a barreira hematoencefálica e age diretamente no cérebro, diz Villeda. Em vez disso, é provável que promova alterações em outros tecidos e células de outras partes do corpo. Esses tecidos, por sua vez, produzem ainda mais proteínas que têm efeitos em outros tecidos que, finalmente, levam a mudanças diretas nos neurotransmissores, nos genes e nas células no próprio cérebro, que sustentam melhorias cognitivas.

Villeda acredita que, se outras experiências mostrarem que a GPLD1, isoladamente, ajuda a iniciar essa reação molecular em cadeia, então é pelo menos concebível que infusões da substância possam oferecer os benefícios cerebrais do exercício a pessoas muito frágeis ou incapacitadas para atividades físicas regulares.

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O experimento envolveu principalmente ratos, não pessoas, e não oferece uma conclusão sobre os efeitos sistêmicos da GPLD1 extra, que em quantidades elevadas pode até ser indesejável. Mais fundamentalmente, as descobertas destacam os efeitos generalizados, intricados e corporais do exercício com o fígado, alterando, nesse caso, de alguma forma, a mente e o cérebro depois dos treinos. No momento, é impossível saber se todos os mesmos processos sincronizados e interligados ocorreriam em resposta a uma pílula de GPLD1 e, caso contrário, se esta poderia ser considerada mesmo uma “pílula de exercício”.

Villeda concorda rapidamente que a GPLD1 farmacêutica, mesmo que seja eficaz para a saúde do cérebro, “não se igualaria aos benefícios do exercício”. Não haveria queima de gordura habitual, ganho muscular ou melhorias cardiovasculares, ressalta. No entanto, o pesquisador espera que, se futuras experiências em seu laboratório com animais e humanos mostrarem resultados consistentes, a substância possa acabar ajudando as pessoas que acham difícil se exercitar a pensar de outra maneira.

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