*Por Molly Oswaks

Depois que eu soube que Frances, minha gata preta de treze anos, estava morrendo de uma doença cardíaca – seu coração é muito grande e bate rápido demais –, meu primeiro impulso foi pensar em como homenageá-la quando chegasse a hora.

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Para me distrair de um prognóstico vago, mas grave, levei minha ansiedade para o Google, no qual me deparei com o espaço de luto completamente lotado de todos os tipos de "memento mori" (termo latino para o lembrete artístico ou simbólico da inevitabilidade da morte).

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(Foto: Nancy Andrews / The New York Times)

Será que queria transformá-la em diamante? Fazer uma tatuagem? Não conseguia me decidir. E, depois que chegasse a conta do veterinário, era bem provável que eu nem tivesse condições para um ou outro.

Mas no Etsy há uma alternativa bem mais em conta: uma comunidade de artistas oferecendo uma forma de recordação feita a mão chamada "chiengorá", um jogo com as palavras "chien", ou "cachorro" em francês, e "angorá", nome dado à lã feita a partir do pelo macio da barriguinha do coelho dessa raça. O "gatogorá" é a lã produzida a partir do pelo de gato.

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(Foto: Nancy Andrews / The New York Times)

Para Theresa Furrer, de 45 anos, da Nine Lives Twine, transformar a pelagem de cães e gatos em lã e tecer com ela lembrancinhas se tornou uma ocupação em tempo integral: são, em média, 60 horas por semana que ela passa no estúdio no terceiro andar de sua casa. De quebra, conta com a companhia de seus dois gatos Sphynx (Fergus e Poppy), sua adorada Cleo, uma gata Devon Rex empalhada, e a irmã dela, de vinte anos, Lupe. "Encaro como uma missão. Meu objetivo é ajudar a amenizar a dor das pessoas", explica.

Em 2013, durante o período que passou de cama, depois de ter doado parte do fígado para o pai, Furrer, que a vida toda foi crocheteira e tricoteira, resgatou uma roca de fiar antiga, comprada por impulso. Vegana há décadas, ela não usa lã de carneiro – e tampouco queria fiá-la.

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(Foto: Nancy Andrews / The New York Times)

Por isso, resolveu juntar pelos de gato e de cachorro, tendo consigo que preferia aprender assim. E fez o primeiro novelo de chiengorá com a pelagem de Rose, uma poodle preta, já falecida, de uma cliente. "O pelame do poodle é o pior que existe para fiar. Se conseguir com esse, com certeza vou poder fazer qualquer coisa", conta ela, referindo-se aos cachos enrolados e emaranhados, famosos por serem difíceis.

Seja o dia ou a hora que for, Furrer tem até uma dúzia de peças de trabalho em estágios diferentes no processo de fiação; os preços começam a US$ 23 por pouco menos de trinta gramas.

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(Foto: Nancy Andrews / The New York Times)

Além de fiar a lã, ela lava três vezes o novelo final; às vezes, é preciso misturar o pelo do pet com uma fibra de apoio, que ajuda a "esticar" a matéria-prima em quantidade limitada e permite à peça respirar melhor.

Furrer revela que as melhores pelagens para tecer são a do husky siberiano, do malamute do Alasca e do cão de montanha dos Pirineus. "A estrutura celular cortical e de cutícula é perfeita para o fio", ensina.

Já o do gato aglutina praticamente ao primeiro contato e raramente rende grandes quantidades, mas ela fia mesmo assim, geralmente incrementando com outra fibra, como alpaca ou bambu, para conseguir um novelo macio. "Não gosto de dizer não", justifica.

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(Foto: Nancy Andrews / The New York Times)

Ela também tricota/crocheta para os clientes que não sabem; por uma taxa adicional, faz cachecóis, cobertores, almofadas, luvas sem dedos, faixas de cabeça e até ursinhos.

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Embora a ideia possa parecer estranha, as lembrancinhas de falecimento feitas de pelo/cabelo não são novidade: nos tempos vitorianos e georgianos, era moda usar anéis e medalhões com uma mecha de alguém que já morrera.

Katie Jane Thomas, de 55 anos, de Lynchburg, na Virgínia, descobriu Furrer por acaso, procurando na internet uma fiadeira de chiengorá que pudesse imortalizar Yobee, o mestiço de Labrador com Chow-Chow que era "a alma gêmea" do marido.

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(Foto: Nancy Andrews / The New York Times)

Furrer pediu os restos da escovação – os pelos recolhidos durante o processo quando o cão estava vivo – e uma foto de Yobee, pois gosta de passar algum tempo com o animal com que estiver trabalhando.

"Foi um processo de pura reverência. Abrir a caixa já foi um presente em si. Só vi meu marido chorar duas vezes na vida, e essa foi uma delas", conta Thomas. O pelo de Yobee, mesclado com uma alpaca de cor semelhante para deixá-lo mais longo, foi transformado em um cachecol que o casal pretende colocar em uma caixa de exibição.

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Gina Murphy, de Huntington Beach, na Califórnia, já foi professora de Ciências do ensino médio para adolescentes grávidas. Hoje, porém, é dona da Close By Me Jewelry, colocando as cinzas humanas e de pets em resina, montando a peça em ouro ou prata de lei para transformá-la em joia.

"Cada item é um passo para a superação da dor, do luto. Na verdade, minha motivação é egoísta, pois faço porque me sinto bem, como se tivesse um objetivo", confessa Murphy, de 41 anos, cujos pais morreram quando ela era jovem.

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(Foto: Nancy Andrews / The New York Times)

Mãe solteira de três filhos, Murphy sustenta a família entregando de 150 a 200 pedidos por mês, sendo metade com cinzas de animais de estimação.

E não é só nos EUA que os artesãos se dedicam à prática: da Floresta Negra, na Alemanha, Anke Bawa, de 58 anos, escreveu: "Fico boba de ver o tanto de gente que perdeu o pet que descobre meu serviço. Não sei, será que tem algo a ver com minha aura? (Quer dizer, os sentimentos e os pensamentos que coloco nos objetos que faço.)"

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Kim Hines, de 54, da Simply Handspun Yarns, em Crossville, no Tennessee, começou a fiar chiengorá em 2011, mas conta que o setor realmente decolou nos últimos três anos.

"Quero que a pessoa tenha algo para guardar do bichinho. Fico muito satisfeita com a possibilidade de produzir uma lembrança concreta para ela", define. Há pouco tempo, ela fez um novelo para um cliente que acabara de perder Gryffindor, um cão de montanha dos Pirineus. O homem pretendia usar a lã para tricotar algo para a esposa.

"Escovar o pet é um ritual muito íntimo; o que faço é dar continuidade a esse processo. Se o animalzinho morreu, esse círculo se fecha, mas o novelo se torna parte do ciclo da vida", conclui Furrer.

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