O show de Gilberto Gil e Caetano Veloso transformou na noite da última terça-feira na mais tropical deste verão em Israel. Quem esperava por declarações políticas dos artistas, bandeiras palestinas ou cartazes do Movimento BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções) na plateia se decepcionou. Não havia sinal de nada disso nem dentro nem fora do Menorá Mivtachim Arena.
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Um público de cerca de sete mil pessoas enfrentou com alegria o desafio de entrar no clima de um espetáculo acústico em pleno estádio, o maior espaço de eventos de Israel. A dupla se apresentou em um palco negro, emoldurado apenas por bandôs da mesma cor e focos de luz branca sobre ela. Estavam serenos diante da plateia bem dividida entre israelenses e a comunidade brasileira residente no país. A apresentação, contrariando a pontualidade dos shows em Israel, atrasou em mais de meia hora para ter início. Gil e Caetano começaram cantando juntos Back in Bahia e só na segunda música, Coração Vagabundo, conseguiram uma reação mais intensa do público. Em Tropicália, a terceira canção, a plateia bateu palmas ao longo da música e vibrou intensamente no fim.
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Já com Marginália, o show cresceu e ganhou emoção. Só então Gil e Caetano saudaram a plateia com um curto, mas caloroso, “boa noite e obrigado”. Com o resultado obtida, ficou claro que o público estava conquistado.
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Português foi a língua oficial nessa noite tropical de Tel Aviv nas pouquíssimas palavras que disseram, Gil na maioria das vezes. Um show monossilábico. Nos seus dois dias em Israel, eles circularam bastante e emitiram suas opiniões. Visitaram a Cisjordânia, encontraram-se com o presidente Shimon Peres, declararam seu amor ao país que tanto revisitaram – Caetano esteve em Israel outras três vezes e Gil, outras “8 ou 9” (ele declarou já não se lembrar). Também jantaram com artistas brasileiros e locais.
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Já no show, optaram pela música. Nada de declarações polêmicas ou diálogos com o público. Foi uma noite intensa, com uma conversa estritamente musical entre artistas e plateia.
Na imprensa israelense, os dois estiveram no centro dos noticiários nos últimos dois dias. “Djil” e “Caetanô”, como são pronunciados seus nomes na Terra Santa, foram citados repetidamente como “os gigantes da música brasileira”. A MPB é amada em Israel, por onde já passaram vários de seus maiores representantes, de Roberto Carlos a Maria Bethânia, de Tom Jobim a Bebel Gilberto. Os seis mil ingressos disponíveis, inicialmente – e depois complementados com outros 2 mil – esgotaram logo nas primeiras semanas de venda.
Ao longo do show, Caetano dançou algumas vezes na cadeira. Soltou-se para dançar no palco apenas no fim da apresentação, ao som de Andar com Fé. Gil fez o mesmo, rodopiando livre com seu jeito tradicional, meio ginga, meio capoeira. A plateia vibrou. A dupla realizou um espetáculo que somente foi possível graças às muitas décadas de carreiras bem-sucedidas. Sem uma grande banda ou recursos visuais e tocando exclusivamente antigos sucessos. Todo o foco ficou com as vozes e o violão dos astros, fazendo valer o apelido de “gigantes”.
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O repertório foi pouco alterado em relação às apresentações europeias. Somente nas últimas canções, o foco de luz branca se tornou violeta e o palco pareceu menor. “Que Deus deu, que Deus dá, de Toda Menina Baiana, foi repetido a plenos pulmões pelo público, como reação do pedido de Gil, um simpático “Canta, Tel Aviv!”.
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Estavam incluídas músicas em espanhol (Tonada de Luna Ilena e Tres Palabras), em italiano (Come Prima) e em inglês (Nine Out of Ten). Não Tenho Medo da Morte foi cantada por Gil, que a conduziu apenas no vocal, enquanto ‘tamborilava’ a ponta dos dedos no violão. Foi uma das mais aplaudidas da noite.
Filhos de Gandhi foi o som que deveria encerrar o show, mas foram necessários três bis para apaziguar o público, que não queria deixar a noite terminar. Os dois voltaram ao palco para tocar Desde Que o Samba ê Samba, que estava prevista para o primeiro bis. Nessa hora, parte do plateia correu para a boca do palco.
Mas o espetáculo ainda não havia terminado, pelo menos não para a plateia. Gil e Caetano foram obrigados a voltar à cena, dessa vez com Roda Gigante e Tieta. Nesta última música, eles deixaram para os fãs os refrões finais. Aos brados de “eta, eta, eta, eta”, os dois deixaram o palco. Tiveram que voltar ainda uma quarta vez, mas apenas para agradecer e se despedir de mais uma passagem por Tel Aviv. Abraçaram-se e, assim, deixaram o palco.
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* Por Miriam Sanger, especial para Estadão Conteúdo