Uma ferramenta que está em fase desenvolvimento pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) quer contribuir com o tratamento e diagnóstico de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), com auxílio de Inteligência Artificial (IA).
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Conduzindo o projeto, está o professor Jônata Tyska Carvalho, do Departamento de Informática e Estatística da universidade catarinense. De acordo com ele, o principal objetivo da pesquisa é estimular o desenvolvimento comunicacional de crianças autistas, bem como o desenvolvimento cognitivo.
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Santa Catarina não possui estatística oficial quanto ao número de pessoas com TEA no Estado, de acordo com a Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE). Mesmo assim, alguns dados podem dar um panorama: a Carteira de Identificação do Autista, expedida pela FCEE em fevereiro de 2020, já tinha 22.462 pessoas beneficiadas no Estado até julho de 2024.
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Nas 239 instituições especializadas credenciadas à FCEE, no ano de 2024, são atendidas 23.452 pessoas com TEA, sendo:
- 11.117 educandos com até 5 anos de idade;
- 9.369 entre 6 e 17 anos;
- 2.966 acima de 18 anos.
O Educação na Palma da Mão da Secretaria de Estado da Educação, revela, ainda, o painel do total de matrículas, turmas e escolas da Educação Básica da rede estadual de ensino. Em 2024, dos 541 mil estudantes matriculados em Santa Catarina, 10.127 possuem diagnóstico de TEA.
Ferramenta com auxílio de IA
O projeto tem parceria com o Instituto de Ciências e Tecnologias da Cognição (ISTC), que fica em Roma, capital da Itália. A conexão com a universidade foi estabelecida por Jônata, que fez o doutorado no instituto de pesquisa do Conselho Nacional de Pesquisas Italiano (CNR). Além disso, no Brasil, a pesquisa da UFSC tem apoio do Instituto Farol, que é um Centro de Excelência e Inovação em Autismo que oferece atendimentos clínicos e educacionais em todos os estados do país.
A ferramenta, que ainda está em desenvolvimento, é um “grande guarda-chuva”, segundo Jônata. Isso porque tem a colaboração de diversos pesquisadores, tanto da UFSC — estudantes de graduação, pós-graduação e bolsistas de iniciação científica — quanto do instituto italiano.
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Um exemplo foi um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Engenharia Eletrônica da universidade, que foi integrado à ferramenta. O professor conta que um aluno desenvolveu um conjunto de dados e métodos que buscam detectar o comportamento repetitivo, que costuma ser um dos indicadores no diagnóstico de autismo.
— Balançar a cabeça, mexer os braços de uma forma repetitiva são algumas das características que o método detecta. A ideia se encaixa dentro da ferramenta — explica Jônata.
Já no instituto italiano, onde o professor deve ficar até o fim do primeiro semestre de 2025, um dos dispositivos desenvolvidos é o Plus Me: Companheiros Vestíveis Transitórios. Em formato de pelúcia, ele é um brinquedo inteligente que pode ser utilizado no pescoço da criança e tem a aparência de um panda. De acordo com o site do instituto, a forma e material da pelúcia tem o objetivo de gerar apego emocional, tranquilizando e acalmando quem entra em contato com o brinquedo.
Veja fotos do “Plus Me”
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Segundo o professor, durante a terapia, o Plus Me pode ser configurado pelo terapeuta por meio de um tablet. A ferramenta de suporte busca registrar o desenvolvimento da criança.
— Normalmente, as sessões de terapia são gravadas para que, posteriormente, os terapeutas possam fazer o acompanhamento de quais “eventos de interesse” [para tratamento e diagnóstico] aconteceram, e como está sendo o desenvolvimento daquela criança. Por exemplo, se ela está mais interativa com o terapeuta ou se ela fez contato visual. Sem a ferramenta, o acompanhamento precisa ser manual, com aplicação de técnicas do próprio profissional ao conduzir a terapia. Eles vão analisar os vídeos e anotar o que aconteceu durante a sessão, e isso é um processo muito lento, e torna a capacidade do terapeuta de tratar um grande número de crianças limitada — diz Jônata.
O surgimento da ferramenta se deu, então, pela necessidade de detectar os eventos de interesse para o tratamento e diagnóstico por meio de IA. Ela tem a capacidade de indicar ao terapeuta os trechos do vídeo em que a criança faz contato visual, por exemplo, reduzindo o volume de dados que os profissionais precisam realizar e facilitando o tratamento do paciente, segundo o professor.
Além disso, a ferramenta também tem capacidade de produzir um gráfico acerca do aumento ou não de interações durante as sessões. O brinquedo interativo também monitora o número de interações da criança com o dispositivo.
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— Ela é sempre uma ferramenta de suporte, jamais para substituir o trabalho dos profissionais — pontua o professor.
Rastreamento do olhar
Outra ferramenta para suporte no diagnóstico de autismo que está em desenvolvimento no instituto italiano, de acordo com Jônata, se baseia no rastreamento do olhar.
— A ideia é que a criança assista a um vídeo, como um desenho animado, e a câmera do notebook registre para onde a criança está olhando. A partir desse conjunto de dados, de padrão da direção do olhar, a gente consegue desenvolver pesquisas para entender se existem padrões que diferenciam crianças neuro típicas de crianças neuro divergentes — conta.
Falta de financiamento
A ferramenta está em desenvolvimento há três anos na UFSC, devido à falta de financiamento que impossibilita que ela seja validada, aponta Jônata.
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— Estamos no nível de pesquisa. Hoje, a gente tem a ferramenta que nos permite a coleta do dado, mas a gente ainda depende de financiamento para a ampliação da equipe, para realizar o projeto piloto, que nos permita, depois de estudar, aplicar as técnicas de análise e de estatística. Uma grande questão para o autismo é fazer um diagnóstico precoce para que se possa fazer uma intervenção precoce — afirma.
Para ele, o principal desafio para a condução da pesquisa, em termos de sequência de trabalho, é a questão orçamentária.
— É muito difícil, sem ter qualquer recurso, a gente conseguir avançar numa velocidade adequada — diz.
Para avançar na ferramenta, Jônata diz que há a necessidade de a universidade disponibilizar bolsas de pós-graduação, para que haja alunos colaborando com ela. A dificuldade também está em conseguir voluntários para a pesquisa, ou seja, crianças no espectro autista que possam fazer uso das ferramentas para que ela possa ter avanços em termos de validação.
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Apesar dos desafios, para Jônata, o que o mantém “firme” no projeto é a paixão pelo tema.
— Colocar inteligência artificial para auxiliar nas terapias no diagnóstico de crianças com autismo tem um apelo social muito forte. A IA está na “boca do povo” nos últimos tempos, e como fazer para transformar isso em benefício para a vida das pessoas? — questiona.
Para ele, é importante que o cidadão comum seja e se sinta contemplado nos avanços tecnológicos.
*Sob supervisão de Andréa da Luz
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