Com a insistência e uma polêmica manobra de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira a redução da maioridade penal, de 18 para 16 anos, nos casos de crimes hediondos (estupro, sequestro, latrocínio, homicídio qualificado e outros), homicídio doloso e lesão corporal com morte. Foram 323 votos a favor, 155 contra e duas abstenções. Como se trata de proposta de emenda à Constituição (PEC), eram necessários 308 votos. Ainda será preciso votar novamente na Câmara e em outros dois turnos no Senado.

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A emenda aprovada é bastante semelhante à que foi rejeitada 24 horas antes, na madrugada de quarta-feira pelo mesmo conjunto de deputados – é uma versão um pouco mais branda, pois não inclui tráfico de drogas, por exemplo. Na primeira tentativa, a PEC obteve 303 votos favoráveis. O insucesso levou o presidente e seus aliados a prepararem um contragolpe. Parlamentares pró-redução avaliaram que faltou um “plano B” na terça. Diante da análise, Cunha acertou na manhã desta quarta-feira que seriam apresentadas emendas aglutinativas à PEC, capazes de alterar o texto rejeitado e manter o tema em discussão, manobra considerada polêmica.

– Tirou-se algum ponto do texto apenas para dizer que era diferente e tentar aprovar algo que foi rejeitado – criticou José Fogaça (PMDB-RS).

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A nova emenda aliviou a PEC (original, que incluía todos os crimes) ao indicar que retiraria o tráfico de drogas e o roubo qualificado dos crimes pelos quais os jovens de 16 anos responderiam como adultos. Em caso de mais um revés, outra emenda ficou à disposição, de autoria de Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que permitiria a emancipação do menor, mediante decisão judicial.

– É uma ideia equilibrada, na qual o juiz pode avaliar caso a caso. A sociedade cansou de impunidade – afirmou Onyx.

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Cunha recorreu à artimanha já adotada na reforma política. Após ser derrotado na votação que tentou garantir o financiamento empresarial de campanhas, encontrou e aprovou uma proposta similar no dia seguinte. A repetição da manobra irritou muitos parlamentares. Líder do governo, José Guimarães (PT-CE) classificou como “forçação de barra” a decisão.

– Se for derrotado, ele (Cunha) fará uma nova emenda aglutinativa e chamará outra sessão até que sua posição seja imposta ao plenário – protestou Alessandro Molon (PT-RJ).

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Com a nova estratégia definida, o grupo favorável à PEC saiu em busca dos cinco votos que faltaram. Cunha ligou para parlamentares, em especial do PMDB, e contou com o reforço dos líderes de partidos como PSD, DEM e PSDB, que tentaram enquadrar os “infiéis” de suas bancadas. À tarde, o presidente comunicou a decisão de manter a redução em discussão:

– Vamos votar, sim. Os líderes querem votar.

Cardozo afirma que não há vagas para novos presos

Se a coalizão do presidente operou ao longo do dia, a mobilização contrária, decisiva na terça-feira, arrefeceu. Os protestos de estudantes dentro e fora do Congresso não se repetiram, e diminuiu a intensidade das ações do governo. O grupo que reuniu mais de 25 deputados, além de advogados, juízes e promotores, já havia se dispersado, e a alternativa encontrada foi tentar inviabilizar a votação com base no regimento da Câmara.

Na terça, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, concedeu coletiva na qual afirmou que a aprovação da PEC seria “catastrófica” para o sistema prisional. Nesta quarta, teve de reforçar o coro. Disse que o impacto nas cadeias seria ainda maior diante do novo texto, exigindo 60 mil novas vagas por ano.

Ministro dos Direitos Humanos, Pepe Vargas retomou os telefonemas bem-sucedidos na madrugada anterior. Na véspera da primeira votação, repassou a Henrique Fontana (PT-RS) a missão de convencer sete parlamentares que pretendiam votar a favor da redução, por exemplo. Com a manobra de Cunha, o ministro voltou a procurar deputados, em um exercício contrário à redução da maioridade penal. Dessa vez, não foi suficiente.

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*Com agências de notícias